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Direito 4.0: como reinventar a advocacia no Brasil?

em Opinião
terça-feira, 11 de junho de 2019

Marília Cardoso (*)

O Brasil tem cerca de 1,1 milhão de advogados. A profissão, que já foi símbolo de status e autoridade, hoje é colocada à prova.

A morosidade da Justiça e os inúmeros procedimentos burocráticos que envolvem a advocacia estão na iminência de viverem uma grande transformação advinda das tecnologias exponenciais. Recentemente, cunhou-se o termo Lawtech, que define as startups focadas na criação de soluções que atendam ao universo do direito.

egundo a AB2L – Associação Brasileira de LawTechs e LegalTechs, que já reúne 388 associados, esse é um segmento em franca expansão, que reúne soluções para as mais variadas áreas do direito, como tributário, civil, trabalhista e previdenciário.

Muitos escritórios, no Brasil e no mundo, já estão adotando a inteligência artificial para aumentar a produtividade e eliminar o trabalho repetitivo. Esses robôs analisam processos, fazem petições e aceleram contratos com uma velocidade infinitamente superior à de um ser humano. Eles são capazes de fazer milhões de consultas em jurisprudências em questão de segundos.

Entre os destaques brasileiros estão a Dra. Laura, um robô que já leu mais de mil decisões judiciais e gerou novas peças para elas em apenas dois minutos. Outra iniciativa é o robô Tikal Tech, que interage com o advogado e, a partir das respostas, gera a petição inicial para ações trabalhistas, chegando a calcular até o valor a ser pedido na Justiça.

A plataforma cognitiva da IBM, conhecida como Watson, também já está sendo usada por escritórios de advocacia para resumir processos e agilizar o trabalho burocrático de inúmeros advogados. A inteligência artificial traz maior agilidade para os processos e desafoga os profissionais do trabalho repetitivo, permitindo mais tempo para tarefas que exigem maior criatividade e pensamento crítico.

E a adoção dessas tecnologias não deve ficar restrita apenas aos escritórios de advocacia. Na Estônia, o Ministério da Justiça anunciou a criação do primeiro “juiz robô”, uma inteligência artificial que poderá ser usada para mediar pequenas causas, com indenizações inferiores a 7 mil euros. A intenção é liberar os juízes do país para se dedicarem a casos mais complexos.

As análises preditivas, a capacidade cognitiva das máquinas e os algoritmos irão facilitar o trabalho e trazer agilidade para os processos, podendo até reduzir a morosidade do sistema jurídico brasileiro. No entanto, por mais positivo que tudo isso pareça, muitos advogados estão se sentindo ameaçados.

Boa parte desse comportamento repulsivo às inovações é decorrente da falta de preparo desses profissionais para lidar com a tecnologia. O Brasil tem 1.406 faculdades de direito, contra cerca de 1.200 no mundo todo. A estimativa é que até 2032, tenhamos mais de 2 milhões de profissionais formados.

Infelizmente, boa parte dessas universidades não estão se adaptando à velocidade com que esse mercado se transforma. São raras as que já incluem no currículo o desenvolvimento de capacidades numéricas e matemáticas, além das chamadas soft skills, que são as habilidades comportamentais voltadas à criatividade, comunicação e senso crítico.

Dessa forma, caberá aos próprios profissionais repensarem a profissão, buscando alternativas viáveis para a execução de um direito preciso, ágil e realmente eficiente. A busca por conhecimentos em áreas como Big Data e Machine Learning será fundamental para o advogado do futuro. Um novo capítulo começa a ser escrito na história do direito.
Quem não se atentar às transformações, inevitavelmente ficará para trás.

(*) – É jornalista, professora e consultora de inovação na Palas, consultoria de gestão e inovação (www.gestaopalas.com.br).