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Porões do Governo

em Colunistas, Heródoto Barbeiro
quinta-feira, 01 de março de 2018

Porões do Governo

Depois de um ano e meio ele estava esgotado. O ministro da Justiça compareceu na Câmara e fez um relatório de seu trabalho a frente da segurança pública no Brasil.

Não era comum ministro fazer balanço e ler depoimentos da imprensa sobre a sua atuação. Não podia sequer contar com o apoio do exército para combater as rebeliões que pipocavam por todo o país. A força militar não passava de dez mil homens, mal adestrados, pagos e armados. Inspirado na revolução francesa, o ministro da Justiça, Padre Feijó, organizou a guarda nacional, sob o seu comando pessoal. Sua personalidade firme, objetiva e direta incentivava apoio de uns e forte oposição de outros.

O fato é que a guarda organizou os proprietários de terras, que receberam títulos honoríficos de coronéis, que por sua vez juntavam pessoas para formar as suas tropas. Feijo pessoalmente comandou ação contra quarteis, tropas revoltadas e se arriscou a própria vida como um homem que acreditava no que fazia. Acreditava na construção de um país, recém liberto da dominação colonial portuguesa. No mesmo dia que fez um balanço do ministério, Feijó pediu demissão da regência trina provisória que governava o império.

A oposição era galhofa. Contava que um general brasileiro perguntou a um almirante boliviano, porque havia ministério da marinha na Bolivia, se lá não havia mar. Ele respondeu pela mesma razão que o Brasil tinha um ministro da Justiça. De fato o ministro foi o principal ideólogo da nova constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Vargas deu um golpe e implantou um estado ditatorial de inspiração fascista e o ministro Francisco Campos redigiu A Polaca, a constituição de 1937.

Durante seis anos esteve à frente do ministério e em nenhum momento apos resistência ao aparelho repressor que prendeu, torturou e matou pessoas acusadas de ligações com o comunismo. Assistiu a atuação da Delegacia Especial de Segurança Política e Social, sob o comando de Filinto Müller. Este atuava exclusivamente na repressão política e cuidava de receber as denúncias.
O mínino que acontecia aos denunciados era apodrecer nas masmorras da Delegacia. Era pró nazista e trocava informações e métodos de tortura com a Gestapo a policia secreta do estado hitlerista. Campos se afastou em 1943 e como recompensa pelos bons serviços prestados para a ditadura Vargas, foi nomeado para a comissão jurídica interamericana. O Ministério da Justiça foi esvaziado. Mostrou que era impotente para combater, não mais as revoltas militares, ou os comunistas, mas os traficantes de drogas alojados especialmente no Rio de Janeiro.

Ao longo do tempo o tráfico infiltrou-se nas polícias, na política e na alta sociedade carioca. Tornou-se fornecedora de droga para consumo local e nacional com ramificações internacionais. Envolveu o executivo, legislativo e judiciário local. Alista jovens pobres e até mesmo crianças para funcionarem como mulas, aqueles responsáveis para que a droga chegue no varejo até os dependentes. O tráfico substituiu o Estado e conseguiu transformar a população dos morros e favelas em escudos vivos.

Troca de tiros matam inocentes, fecham hospitais, escolas e o comércio. O governo federal impôs uma intervenção e jogou no colo dos militares a recuperação da segurança no Rio. Maceió, Natal e Recife são as mais perigosas cidades brasileiras, mas são menos visíveis do que a ex-Cidade Maravilhosa. Surge o ministério da Segurança Pública gestado nos porões do governo federal e tem como ideólogo marqueteiros contratados a peso de ouro.

(*) – É editor chefe e âncora do Jornal da Record News, emissora aberta de notícias.