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Vacinar-se ou não se vacinar: that is the question

em Artigos
quarta-feira, 30 de junho de 2021

Sérgio Mauro (*)

Esses dilemas hamletianos assumem ares tragicômicos e ensejam uma ópera “buffa”.

Como em toda polarização radical, a polêmica que ainda coloca em campo de batalha os “no vax” contra os entusiastas da ciência parece ter esquecido completamente o ponto de equilíbrio, preferindo destruir ou desmerecer as alegações do adversário, como se fosse uma disputa entre duas torcidas de times de futebol rivais, em vez de apresentar sólidos argumentos para defender um dos dois pontos de vista.

Talvez inconscientemente, os que são contra a vacinação assinam um tratado em que reconhecem a derrota para as forças da natureza destruidoras. Alegam que existem riscos e que muitos já morreram após a aplicação da primeira dose de uma das tantas vacinas contra a covid à disposição no mercado. Preferem desistir da batalha antes mesmo do início do conflito e raramente o fazem com plena consciência dos próprios atos.

Têm razão em apontar os riscos, inerentes a qualquer vacina e a qualquer droga usada como medicação, mas caem na total incoerência quando aconselham a aguardar a multiplicação descontrolada de mortes até que se atinja a almejada e arriscadíssima imunidade de rebanho. Por sua vez, os que defendem incondicionalmente a vacinação em massa seguem os preceitos da ciência que desafia a natureza, desde os primórdios da humanidade e, sobretudo, a partir do início da ciência empírica, em meados do século XVII.

Nunca se lembram, porém, por conveniência própria, de discutir possíveis formas de controle das próximas viroses que certamente vão nos atingir, tampouco refletem sobre os fortes limites da ciência que pretendem defender, totalmente inepta diante do surgimento periódico de epidemias aparentemente incompreensíveis e inexplicáveis.

Além do mais, invocam uma ciência “pura” e idealista, que não mais existe ou raramente se encontra, e se esquecem dos fortes vínculos entre o conhecimento científico e os interesses de determinados grupos industriais. Outro triste espetáculo proporcionado pela enorme diferença de poder e de riqueza material entre os países reside na caótica distribuição das vacinas pelo mundo.

Quem tem mais dinheiro tem mais vacinas à disposição, podendo inclusive dar-se ao luxo de escolher o fabricante e o tipo de vacina. Os países do chamado terceiro mundo limitam-se a esperar doações das sobras dos países ricos, enquanto o Brasil, sujeito atualmente a um governo populista e irresponsável, sofre as consequências de um enorme atraso na vacinação em massa causado por decisões governamentais erradas e por conflitos entre o presidente e os governadores.

Vacinar-se ou não? Pfizer, AstraZeneca ou Moderna e tantas outras? A primeira dose pode ser com um tipo de vacina e a segunda com outro tipo ou marca?

Aos governantes e aos formadores de opinião dotados de boa vontade, ainda dispostos a alcançar o ponto de equilíbrio entre as polarizações radicais mencionadas antes, só restaria a tarefa de apelar para a OMS, exigindo que realmente cumpra a função de vigilante da saúde mundial, deixando de apenas emitir ineficazes pareceres ou de dar inócuos conselhos ou advertências.

No entanto, como se sabe, instituições como a ONU ou a OMS têm sempre pouco poder efetivo, sendo atreladas e condicionadas aos interesses dos países mais ricos. Como se viu, nessa e em outras questões atuais está cada dia mais difícil encontrar um consenso. As radicalizações podem interessar a determinadas facções ou grupos de empresários, mas ao longo da história sempre foram e sempre serão perniciosas para a maioria da população.

(*) – Graduado Bacharelado em Letras Português/Italiano pela USP, pós-doutorados na Universidade de Siena. É Professor aposentado de literatura italiana na UNESP de Araraquara.