De camisa no estádio

em Heródoto Barbeiro, Opinião
quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Heródoto Barbeiro (*)

O presidente, mais uma vez, vai ao estádio de futebol. Ele se declara um torcedor fanático do Flamengo.

Ele e sua assessoria sabem da importância do esporte para a população. E para a aprovação do governo. Os jogadores se tornam ídolos e não custa nada pegar uma caroninha na popularidade deles. Para ter mais efeito político tudo é arranjado para que ele apareça o mais possível ao lado da torcida do clube campeão. É um homem do povo diz um dos assessores mais entusiasmados para aparecer como papagaio de pirata.

Em uma disputa como essa muita gente esquece as amarguras do dia a dia, como o desemprego, os salários baixos, as dificuldades de mobilidade nas grandes cidades e o acesso precário aos postos de saúde. Até as escolas se alegram com feriados decretados nos dias de jogos mais importantes, afinal, as crianças também tem do direito de ver o jogo e torcer pelo time do presidente.

Poucas vozes se arriscam a fazer críticas diante da manifestação do deus futebol e seus devotos. A prática veio para ficar. Mesmo com um ou outro tropeço do time, nenhum político pode ficar afastado dos estádios de futebol. Bem que avisaram ao presidente que há um risco enorme. Não se controla uma massa de torcedores fanáticos.

Pode acontecer o pior, uma vaia, uma faixa contra o governo, ou um coro de palavrão impossível de impedir a propagação nos meios de comunicação eletrônica. Ainda assim, avaliam os assessores presidenciais, vale a pena correr o risco, uma vez que os dividendos políticos são consistentes. As aparições anteriores nos jogos de futebol foram exitosas, e ajudam a consolidar a presença do chefe do poder executivo nas arenas.

De um jogo de futebol a uma abertura de uma competição esportiva internacional é um pulinho, e a imagem certamente vai circular em todo mundo. O presidente já se declarou torcedor fanático e disposto a vestir a camisa do time. A comunicação do Palácio do Planalto, Assessoria Especial de Relações Públicas, encomendou músicas com os mais populares autores e cantores da hora.

Nenhum presidente brasileiro usou tanto o futebol. Ele conseguiu criar uma campanha ufanista, que buscava legitimar e aumentar a popularidade do regime. O general presidente aproveita a copa do mundo para esconder as violações dos direitos humanos, tortura, assassinato e desaparecimento de opositores políticos. Garrastazu Médici, ficou famoso por acompanhar os jogos do clube no Maracanã.

Sempre na tribuna, gostava de aparecer em fotos ao lado dos jogadores. O auge foi a conquista do tricampeonato de futebol no México e estar ao lado do capitão da melhor seleção de todos os tempos, com direito a transmissão em cores pela televisão.

Nem o “pra frente Brasil, salve a seleção …nem “este é um país que vai pra frente..”, nem “moro em um país tropical..,” foram capazes de impedir que a história julgasse o período militar.

(*) – É editor chefe e âncora do Jornal da Record News em multiplataforma (www.herodoto.com.br).