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O departamento jurídico como uma unidade de negócios da sua empresa

em Destaques
quarta-feira, 22 de abril de 2020

Juliana Gonçales (*)

No Brasil, o chamado contencioso, ou seja, tudo o que pode ser alvo de contestação, disputa ou conflito de interesses, tem alternativas para sua resolução e dependerá de cada situação e interesse. Ele pode ser solucionado pela via judicial quando recorre ao Poder Judiciário; arbitral quando é regido por uma câmara arbitral ou ainda pode ser resolvido no âmbito administrativo, quando o trâmite se dá no âmbito da administração pública.

Quando ocorrem as questões litigiosas, elas podem ser desgastantes para a imagem de uma empresa, demorar para alcançar uma decisão final ou ainda onerar muito as atividades comerciais desenvolvidas pelo cliente. Portanto, hoje pode ser importante qualificar o contencioso como uma espécie de ‘unidade de negócios’ da sua empresa, que o auxiliará na eficácia dos recursos, redução de custos e que poderá inclusive facilitar novos investimentos.

Grosso modo, uma unidade de negócios seria, por exemplo, um departamento, um grande setor da empresa ou até mesmo uma empresa completa dentro de outra companhia de maior porte. Essa questão é extremamente pertinente e é hoje um grande desafio tanto para os empreendimentos, quanto para advogados. Para imensa maioria dos advogados, estagiários e demais integrantes do mundo jurídico não é tão simples a análise desta questão. Geralmente, as faculdades de Direito focam no ensino de doutrinas e teses estritamente jurídicas, considerando a atividade jurídica quase exclusivamente como meio de pacificação social.

Contudo, hoje em dia o advogado deve dar um passo além e aprimorar seu conhecimento com uma visão 360° das atividades comerciais desenvolvidas pelo cliente, compreendendo efetivamente quais são as dores que impactam o dia a dia dos empresários.
Essa visão para o advogado é imprescindível e mudará seu ponto de vista de como o setor jurídico se situa dentro da empresa. Hoje há várias técnicas e recursos que auxiliam nessa nova forma de enxergar os processos judiciais e administrativos.

O ‘contencioso estratégico’ apresenta algumas características interessantes. A primeira é que o advogado deve querer entregar mais resultados. Junto com suas petições impecáveis, o advogado deve
conhecer mecanismos que auxiliem na busca constante pela desburocratização e simplificação das empresas, no diálogo com outros setores, na revisão de contratos e na orientação para evitar litígios.

Hoje diante dessa nova ordem mundial o uso de tecnologias é indispensável e por isso o desenvolvimento de inovações para melhorar o trabalho humano é crescente. Essas tecnologias não devem ser vistas como uma ameaça, mas sim como ferramentas que auxiliarão o advogado a direcionar sua energia no que realmente traz resultados para a empresa. O uso de inteligência artificial, como também as lawtechs ou legaltechs (aquelas startups que criam serviços e produtos tecnológicos para o setor jurídico) deve ser uma realidade aos advogados das empresas, para eles incrementarem qualidade e eficiência no trabalho final.

O ‘contencioso estratégico’ deve contar com uma equipe engajada e com conhecimento do negócio e suas principais dificuldades. Assim sendo, o jurídico não pode ficar isolado com a única preocupação de cumprir prazos, fazer petições, participar de audiências e se envolver com protocolos. Ao lado das rotinas tradicionais, todo departamento jurídico deve participar ativamente na vida empresarial, até mesmo para que o advogado aprenda a analisar os resultados obtidos.

Naturalmente algumas práticas legais são permanentes como, por exemplo, o estudo das principais questões jurídicas da empresa. As teses que valem a pena manter na discussão judicial ou administrativa devem ser selecionadas e separadas daquelas que não valem. Uma política jurídica e gerencial que busca a negociação extrajudicial e a composição entre as partes também deve ser bem vista pelos departamentos jurídicos.

Dentro desse novo conceito é indicado não esperar citações para agir. Assim é imprescindível manter uma rotina de pesquisa constante sobre a distribuição de novas ações. Isso vai dar uma margem maior de negociação e oportunidade de redução do número de demandas ativas contra a empresa. Nesse espaço, a análise de riscos e está entre os maiores desafios, pois a insegurança jurídica é uma realidade no Direito brasileiro. Contudo, a vida do empresário é justamente a gestão de riscos.

A grande questão é como conciliar o risco intrínseco da atividade empresarial com a segurança jurídica? Trata-se de um grande desafio, porém, são exatamente nessas situações desafiadoras que as inovações e novas oportunidades de negócios aparecem.
A dúvida por que devo mudar a gestão do contencioso da minha empresa tem uma resposta clara. O ‘contencioso estratégico’ é uma ótima oportunidade de aumentar a eficiência dos recursos da empresa, evitar custos desnecessários com litígios sem chance de êxito, compreender a origem das demandas a fim de evitá-las ou, no mínimo, diminuí-las.

Vale ressaltar que absolutamente toda empresa tem a oportunidade de se valer do ‘contencioso estratégico’, seja por meio de um departamento jurídico interno capacitado ou escritório externo que possua experiência no segmento. A boa notícia é que cada vez mais o cenário jurídico está se familiarizando com a visão estratégica do contencioso, até mesmo porque essa ótica permite ao advogado analisar quais efetivamente são os riscos envolvidos e propor as melhores e mais criativas estratégias ao cliente, independentemente da complexidade envolvida.

(*) – É sócia do Silveira Advogados e especialista em Direito tributário (www.silveiralaw.com.br).