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Cartório paulista produz primeira procuração 100% digital

em Destaques
quarta-feira, 06 de maio de 2020

O 1º Tabelionato de Itapeva, cidade distante cerca de 270 km da capital São Paulo, produziu sua primeira procuração pública 100% digital com o uso de videoconferência e assinaturas ICP-Brasil. Se a cidade, que data do ano de 1769, esteve tão acostumada a ser intersecção da modernidade em tempos remotos e atuais, talvez seu exemplo possa inspirar outros tantos municípios brasileiros que desejam aprimorar suas experiências cartoriais.

A Associação das Autoridades de Registro do Brasil (AARB) foi atrás dessa história e apresenta uma pequena entrevista com o tabelião titular da serventia André Garcia. Para quem não se recorda, Garcia é ex-procurador da Advocacia Geral da União (AGU) e atuou por nove anos no Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), ocupando inclusive o cargo de procurador-federal chefe na autarquia.

AARB – Antes de falarmos sobre a inovação das procurações públicas digitais, conte-nos sobre essa transição profissional. As carreiras de procurador e de tabelião são muito correlatas e, ao mesmo tempo, bastante diferentes.
André Garcia – Sim, é verdade. Tive a felicidade de ser procurador federal por doze anos, dos quais nove foram dedicados exclusivamente ao ITI. Lá, inclusive, tive o primeiro contato com a área notarial, diante do pleito, à época, de os cartórios passarem a também emitir certificados digitais ICP-Brasil. São áreas correlatas, sem dúvida alguma, pois todos somos profissionais do direito, mas díspares principalmente na atuação: conquanto como procurador federal eu era um advogado defensor dos interesses da União, como tabelião sou um terceiro imparcial, que deve garantir a validade das manifestações de vontade entre particulares.

AARB – Agora, falando sobre as procurações púbicas digitais, tema da nossa entrevista, sabemos que ainda há uma considerável parcela de profissionais dos cartórios que resistem ao documento digital. Qual a sua opinião a respeito?
AG – Não podemos negar que o mundo cartorial foi criado e sedimentado em uma época na qual o papel era a base documental. Hoje, não mais. Então é natural que exista alguma resistência para essa mudança tão significativa. Na verdade, a função do tabelião não se alterou: produzir documentos seguros, com vistas a conferir paz social e evitar processos judiciais. Assim, seja em papel, seja em meio digital, a escritura pública continuará sendo uma escritura pública, ou seja, ato dotado de fé, nos expressos termos do art. 215 do Código Civil.

AARB – E como surgiu a ideia de migrar tão importante documento para o mundo digital?
AG – Acredito que a migração dos documentos em geral, e não apenas os notariais e registrais, seja uma tendência universal – e natural. A facilidade do eletrônico é inegável frente ao papel. Antigamente, quando errávamos no documento físico, ou se rasurava (dando a impressão de possível fraude) ou fazíamos um novo, perdendo todo o tempo e trabalho então despendidos. Não podíamos simplesmente apagar e reescrever o correto, algo que o meio digital nos possibilita de maneira infinita. A maior alteração do digital frente ao físico é a facilidade trazida pelos hiperlinks, e de que forma conseguimos alcançar a segurança computacional necessária.

AARB – A experiência por meios digitais pode proporcionar muita conveniência e, simultaneamente, elevar os riscos dos atos jurídicos. Como foram pensadas as etapas de verificação documental, confirmação da ciência dos interessados e assinatura dos atos?
AG – O Provimento nº 12/20, publicado pelo e.TJSP no dia 29 de abril último, foi muito sensível ao ponto, pois conseguiu conjugar, de uma só vez, a praticidade da manifestação eletrônica com a segurança da informação duplamente conferida: tanto pelo Tabelião, quanto pelas próprias partes, que devem utilizar seus certificados digitais ICP-Brasil para assinar, remotamente, o arquivo pdf da escritura ou procuração pública, cujo hash integrará o livro de notas.

AARB – A atual crise imposta pela pandemia do novo coronavírus acelerou bastante a digitalização em inúmeros setores, como a saúde, por exemplo. O Cartório de Itapeva pretende continuar investindo nesta modalidade quando a quarentena acabar? Existe a chance de outros documentos migrarem para o meio eletrônico?

AG – Lembro com muita deferência da minha colega Dra. Ana Amelia Barreto, advogada entusiasta da certificação digital, que costumava falar, em suas divertidas palestras, “quem não é ponto.com é ponto morto”. Certamente temos todos, hoje, que nos adaptar. Hoje, em São Paulo, já podemos fazer todo tipo de escrituras e procurações públicas de forma eletrônica, à exceção, apenas, dos testamentos. Apesar de a autorização para tanto ser de trinta dias, caso se torne em uma experiência exitosa não vejo motivo para não continuarmos com mais essa alternativa a favor do cidadão.

AARB – E por que usar certificados digitais da ICP-Brasil?
AG – O certificado digital ICP-Brasil é o estado da arte em termos de segurança da informação. Apenas com ele se garante, de uma só vez, que aquela pessoa é realmente ela e que a mensagem transmitida eletronicamente não sofreu qualquer alteração no percurso remetente-destinatário. Em singela metáfora, se não faz sentido assinarmos uma escritura pública a lápis, no mundo eletrônico a caneta com tinta indelével é justamente a certificação digital ICP-Brasil.

Fonte: Associação das Autoridades de Registro do Brasil (AARB)
(www.aarb.org.br).