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Que caráter que nada

em Colunistas, Mario Enzio
quarta-feira, 06 de setembro de 2017

Que caráter que nada

O sujeito que parece ser uma pessoa desonesta pode não ser assim considerado se o seu caráter mostrar o contrário? Ou será que tudo foi um tremendo engano?

Será que tudo que vemos ou que nos chega na mídia, com dificuldades de descobrir o falso do verdadeiro, que mais atrapalha do que ajuda, permite avaliar quem é, de fato, o vizinho do apartamento ao lado? Será que esconde um corpo numa mala ou milhões desviados? É um mau sujeito ou estou exagerando?

O termo “caráter” como é empregado é diferente do que a ética de virtudes ou a filosofia clássica o definem. Ter caráter nos dias de hoje pode significar que se parece com um comportamento e se faz de maneira sorrateira o contrário. Pode-se parecer uma pessoa ilibada, toda certinha aos olhos da mídia ou da opinião pública, mas que no seu íntimo está se lixando para o que as regras querem ordenar.

É a pessoa sem vergonha. A que prefere ficar agindo às escondidas ou influenciando com os que têm poder para que seus resultados sejam garantidos. Aquela que age conforme a sua vontade e prazer, sem se preocupar com as convenções sociais. Age pensando só nela e em seus pares ou amigos mais chegados ou naqueles em que os seus interesses estão focados.

Uma pessoa que é capaz de descumprir as leis porque acredita que não será punida. Aquela que diz à boca pequena que fez errado porque quis. Ou se está fora da lei é só por um pequeno delito ou usa a frase solta: – sou desonesto, e daí? Considerando a conjuntura, penso que não se ouve, nem seria imaginável, que alguém possa se expressar com essa transparência ou sinceridade.

O caráter na visão clássica pressupõe uma retidão de comportamentos em todas as áreas da vida de uma pessoa: na pessoal, social ou profissional. Olhar para uma pessoa, ler um comentário ou ouvir uma conversa de alguém que está na mesa ao lado não nos dá a garantia para saber ou avaliar sobre o seu caráter. Para que se possa identificar melhor o caráter de uma pessoa seria necessário conhecê-la profundamente, pois ao julgar pela aparência não se conseguiria enxergar o verdadeiro caráter.

Haveria de se conviver nas miudezas e nos bastidores das revelações antes de qualquer pré-julgamento. Ainda que os indícios possam ser claros de que a pessoa possa ser um sujeito classificado como de mau caráter, uma conversa solta não revelaria todos os lados de uma personalidade. Quando se fala em mostrar ou considerar o que é uma pessoa de caráter numa determinada sociedade, nos leva a outra pergunta: como se pode avaliar o caráter de uma pessoa que vive, no complô, em ações criminosas?

Como numa sociedade de bandidos, em que todos podem ter um comportamento similar: esconder os resultados dos delitos até que sejam descobertos, por serem iguais uns aos outros.

(*) – Escritor, Mestre em Direitos Humanos e Doutorando em Direito e Ciências Sociais. Email: ([email protected]).