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Por conta dos vícios de linguagem…!

em J. B. Oliveira
terça-feira, 29 de março de 2016

Por conta dos vícios de linguagem…!

“Vícios de linguagem são imperfeições – oriundas do descaso, do descuido e do desamor para com a língua – que desvirtuam a linguagem tirando-lhe a graça, a expressividade e a nobreza. ”

 

O texto acima faz parte das apostilas de dois cursos que ministro sistematicamente: Curso de Oratória Moderna e Curso de Redação. Está contido na página que destaca o cuidado que o comunicador – falando ou escrevendo – tem que aplicar à sua mensagem. “Vício de Linguagem” é o “irmão torto” da “Figura de Linguagem”. Ambos são filhos da mesma boa mãe, “Dona Estilística”.

 

Por sua vez, Estilística (do alemão stilistik, que chegou ao nosso idioma pelo francês stylistique) é o ramo da linguística que estuda as variações da língua e sua utilização, incluindo o uso estético da linguagem e suas diferentes aplicações dependendo sempre do contexto ou situação.

 

As Figuras de Linguagem se subdividem em três segmentos: Figuras de sintaxe ou de construção; Figuras de palavras e Figuras de pensamento. No primeiro grupo estão: elipse e zeugma (lembra do famoso “sujeito oculto por elipse”? Evitava a citação desnecessária do termo-sujeito), pleonasmo (virtuoso, para distinguir do vicioso), polissíndeto etc. No segundo, aparecem: metáfora, metonímia e sinédoque, catacrese e antonomásia. Vem, por fim, o terceiro e último bloco – muito usado em oratória – antítese, apóstrofe, eufemismo, disfemismo, ironia, personificação e retificação. (O eufemismo, por exemplo, substitui uma palavra ou expressão desagradável por outra mais suave: “Campo santo” em lugar de cemitério…).

 

Já os Vícios, ah! Os Vícios! À semelhança de vícios outros – como o tabaco, os jogos de azar, as drogas e o desregramento em bebidas – causam prejuízos por vezes irreparáveis à vida da mensagem! Entre os principais, figuram: solecismo (“houveram” problemas; “fazem” dois dias), plebeísmo (gororoba, merreca); estrangeirismo (meeting; boom, crooner); Cacofonia (mande-me já; boca dela; por cada; havia dado) e por aí afora.

 

Em meu livro mais recente “Boas dicas para boas falas”, registro com fotos de jornais, nas páginas 58 e 59, como o uso de um vício – o estrangeirismo “boom” – levou a um vício pior: a Cacofonia “Boom das”!

 

Há, porém, um vício que não está classificado como tal e que eu, particularmente, chamo de MODISMO.

 

De repente, quando menos se espera, entra “na moda” uma expressão que se alastra como epidemia! Houve uma época em que, a qualquer instante, por da cá aquela palha, alguém lascava um terrível “Com certeza!” bem exclamativo. Depois foi a vez do horroroso “A nível de…” imperar por todo o território nacional, empesteando rádio, televisão, palestras e conferências. Com um detalhe: quem o usava fazia questão de aplicá-lo em mais de uma situação: “A nível de município, temos uma realidade, mas a nível de estado e a nível de país as circunstâncias mudam…

 

Depois foi a vez do pedante e desengonçado gerundismo, usado por nove entre dez telefonistas, atendentes e operadores de “telemalho”: “Vou estar transferindo a sua ligação”; “Com quem o senhor quer estar falando?”; Posso estar mandando um representante?”

O modismo atual é POR CONTA! Essa locuçãozinha salafrária passou a ocupar o lugar das singelas, humildes e tranquilas preposições por, porque, com, contra, de e também da locução prepositiva por causa ou por causa de! Agora é tudo POR CONTA DE! “Ele morreu por conta de falência múltipla dos órgãos. ”

“Os estudantes protestaram por conta do aumento da mensalidade. ”

 

 Esta é insuperável: o usurpador “por conta de” assume o espaço do advérbio apesar! “Mesmo por conta da epidemia de dengue, as pessoas continuam deixando recipientes com água no quintal”.

 

Para mim, entretanto, a melhor ocorreu quando um jornal diário de São Paulo, comentando o fato de Neimar ter recusado oferta para jogar no exterior, sapecou esta pérola: “Neimar fica no Brasil por conta de seu filho”. Pensei: “Filho de prodígio é prodiginho! O menino mal nasceu e já vai sustentar o pai! ”

J. B. Oliveira é Consultor de Empresas, Professor Universitário, Advogado e Jornalista. É Autor do livro “Falar Bem é Bem Fácil”, e membro da Academia Cristã de Letras. – www.jboliveira.com.br – [email protected].