Jefferson Kiyohara (*)
Será que estamos fazendo a coisa certa e agindo de forma ética?
Atualmente, vivemos num cenário de turbulências e preocupações com os impactos sociais e econômicos atuais que virão em decorrência da pandemia do vírus Covid-19. Com tudo isso, a questão que nos assombra é: sobreviveremos? Com certeza! Mas, também, não há dúvidas de que, após estes acontecimentos, as coisas não serão como antes. Retomaremos numa nova realidade, um ‘novo normal’.
Enquanto este momento não chega, devemos nos questionar, como indivíduos, organizações e governo: será que estamos fazendo a coisa certa e agindo de forma ética? Entenda por certo como agir de boa-fé, visando o bem comum, a continuidade e a prosperidade da sociedade de forma harmônica e justa, respeitando os direitos individuais. E como as nossas ações e omissões serão descritas e julgadas pela história?
Para responder essas questões, é essencial considerar tanto a coerência como a visão sistêmica, e sempre questionar se a nossa forma de pensar e agir é ética. Por exemplo, testemunhamos as discriminações contra os chineses por conta do Covid-19, e muitas pessoas apoiaram. Este comportamento é eticamente justificável? Já testemunhamos na história perseguições e segregações por motivos raciais e religiosos e a busca por culpados, atitudes que pouco colaboraram para um mundo mais justo e para a resolução do real problema.
Sem contar a injustiça das generalizações. E, ironicamente, muitos dos que atacam dependem de produtos, insumos ou serviços chineses, e não enxergam isto. Num outro panorama, estamos nos lamentando pela falta de uma vacina, remédios ou meios efetivos de prevenção ao vírus, sofrendo com o isolamento. Mas, no caso de outras doenças, que possuem meios efetivos de proteção, não os utilizamos como deveríamos. Então, o que está faltando?
A força destruidora das fake news mostra que não é uma mera questão de educação e informação tradicionais. Que tipo de formação precisamos para que as pessoas tenham pensamento crítico e saibam ser céticas e combatam os seus vieses? Para que as pessoas tenham empatia e pensem coletivamente e de forma ética? Em tempos de crise, a ética das pessoas, organizações e instituições se revelam. E temos uma fartura de maus exemplos, como quando a pessoa tosse próximo de outra que esteja usando máscara ou não mantém distância segura numa fila.
Ou quando compra o estoque de itens de primeira necessidade, como álcool em gel ou botijão de gás e passa a revender por preços abusivos ou para estoque excessivo. Há passividade e indiferença diante da fome, desproteção ou desespero do outro. E o que dizer dos atos de hostilidade contra profissionais da saúde e de serviços essenciais nos transportes públicos e em suas residências? Exemplos de individualismo e falta de ética.
São muitos pontos de interrogação, pois, para a população, são muitos questionamentos que estão sem respostas. Antes de retomar a este novo normal, devemos repensar a educação e formação no Brasil. Afinal, como exigir um comportamento, que não seja individualista e movido pelo medo do cidadão quando ele não tem acesso ou entendimento das informações?
Parte das ações que hoje testemunhamos pode ser explicada pelo baixo nível de instrução, porque não é óbvio para a população em geral entender o que é um inimigo invisível como o vírus, ou qual o significado de termos como disseminação e portador assintomático. E precisamos ir além. Temos que incluir as matérias de cidadania e ética na grade curricular das escolas. E mais, fomentar uma cultura de coletividade, de confiança e de valorização das medidas de prevenção. Como colocar estes desejos em prática?
Alguns exemplos: nas organizações, por meio de um plano de gestão de riscos e de crises; na nação como um todo, fomentando a pesquisa e desenvolvimento em áreas estratégicas; e, como cidadão, adotando novos hábitos, como o uso de máscaras diante de quaisquer sintomas de gripe, como já é feito no Japão há muito tempo. É chegada a hora de aprendermos e evoluirmos para sairmos melhores desta crise, rumo a um ‘novo normal’.
Afinal, o sinal de alerta já foi dado, não há tempo a perder. Vamos juntos?
(*) – É professor em ética e compliance da FIA Business School e diretor de compliance na ICTS Protiviti.