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Contabilidade criativa no balanço da Petrobras

em Artigos
quinta-feira, 24 de março de 2016

Reginaldo Gonçalves (*)

A desvalorização dos ativos continua sendo uma das principais causas dos resultados negativos.

A publicação das demonstrações financeiras da Petrobras apresentou surpresas que devem ser avaliadas, principalmente com a continuidade das perdas ocasionadas pela aplicação do teste de recuperabilidade (Impairment), que atingiu, em 2015, um ajuste de R$ 33,7 bilhões no resultado do período. Ademais, há os reflexos negativos do grande endividamento da companhia. Este gerou perdas cambiais de R$ 10,5 bilhões, além de despesas financeiras de R$ 19,0 bilhões.

O resultado negativo na controladora atingiu R$ 34,8 bilhões, tendo em vista principalmente a parcela relativa à desvalorização dos ativos. No consolidado, o resultado negativo foi de R$ 35,2 bilhões, ocasionado principalmente pela aplicação do teste de recuperabilidade, que atingiu, em 2015, o valor de R$ 47,7 bilhões. Há, ainda, perdas cambiais de R$ 11,4 bilhões e despesas financeiras de R$ 21,6 bilhões.

A desvalorização dos ativos continua sendo uma das principais causas dos resultados negativos. Porém, enquanto o petróleo estiver sendo negociado internacionalmente entre US$ 30,00 e US$ 40,00 o barril, a desvalorização dos ativos deve continuar. Tal questão mercadológica soma-se a todos os desmandos e equívocos na gestão da Petrobras, tornando muito difícil a recuperação.

Seriam necessários investimentos significativos, praticamente inviáveis na atual conjuntura, na busca de custos fixos menores por unidade produzida, aproveitando-se ao máximo a capacidade instalada. Também precisa ser considerada a forma da gestão do hedge cambial, que, igualmente deverá ter reflexos negativos.

Observa-se que o fluxo de caixa da controladora foi de R$ 11,5 bilhões, mas isso é reflexo da queda de investimentos em ativos produtivos, que em 2015 foram de R$ 50,6 bilhões, ante R$ 60,9 bilhões, em 2014. Essa redução tem duas causas: o aumento significativo do endividamento; e a importação de petróleo por valores mais baixos do que o custo de produção.

O que precisa ser avaliado são os valores não apresentados na peça contábil e que poderão gerar desembolsos futuros e prejuízos, já que uma parte do passivo não está refletida nesse documento. Porém, se ocorrerem os desembolsos previstos, estes dilapidarão o patrimônio líquido da empresa. Os valores poderão atingir patamares absurdos: de natureza tributária, R$ 114,3 bilhões; trabalhista, R$ 22,07 bilhões; causas civis gerais, R$ 20 bilhões; causas ambientais, R$ 5,8 bilhões; e R$ 7 bilhões com ações de outra natureza.

Tais montantes estão apontados em notas explicativas. A justificativa da não contabilização é que não há estimativa suficientemente confiável do valor. Não foram apontadas outras provisões, por serem remotas, mas que podem permear novas surpresas. Portanto, dizer que as peças contábeis estão sendo limpas é quase um eufemismo! A Operação Lava Jato ainda deverá evidenciar novidades que poderão gerar ajustes no balanço contábil.

Contudo, o mais importante é tirar o gesso que foi colocado na empresa e reduzir a interferência do governo no Conselho de Administração, pois essa ingerência dificultará muito a recuperação da Petrobras. A contabilidade criativa prejudicou os alicerces da companhia! Agora, a venda de ativos ditos improdutivos seria solução apenas para gerar caixa e tapar o buraco na ineficiência dos gestores.

(*) – É coordenador do curso de Ciências Contábeis da FASM (Faculdade Santa Marcelina).