A presença do presidente brasileiro na capital dos Estados Unidos tem mais um caráter de colocar panos quentes do que a construção de uma aproximação maior entre os dois países.
Há duras críticas ao governo brasileiro na mídia americana republicana. A política externa independente elaborada pelo ministro das relações exteriores brasileiro não é bem digerida por Washington, principalmente por causa das guerras que ainda desestabilizam a paz mundial. Contudo, a declaração conjunta do encontro entre os dois presidentes na Casa Branca mostra temas importantes, como o respeito à democracia, a busca pelo desenvolvimento social e defesa da paz. Isso gera uma aparente ideia de aproximação entre os dois países e também de seus presidentes.
O encontro não trata de temas sensíveis, como a busca de uma pluralidade brasileira no comércio mundial e as disputas geopolíticas em andamento. A troca de sorrisos, imagens e apertos de mão são uma formalidade que acontece em todos os encontros em Washington. O essencial só se vai saber quando os relatórios das diplomacias avaliarem o que aproxima e o que afasta os dois países. Não restam dúvidas que há duas visões diferentes.
No meio do caminho está Cuba. Há uma aproximação clara com setores políticos brasileiros, que têm uma forte adesão nos sindicatos e nos partidos de esquerda que apoiam o governo. O bloqueio econômico imposto pelos americanos é uma violação dos princípios da Organização dos Estados Americanos. O presidente brasileiro faz um esforço para mediar o conflito entre Cuba e os Estados Unidos, sem êxito. Democratas e republicanos pensam da mesma forma: não se aproximar de uma ditadura comunista a menos de 100 quilômetros da costa da Flórida.
Não se conformam com as desapropriações de propriedade de cidadãos americanos realizadas pelo governo comunista. Este, por sua vez, intensifica suas relações econômicas e políticas com países do leste europeu e a China como forma de manter no poder a burocracia estatal do partido único. A proposta do Brasil não é levada em consideração pelo Departamento de Estado americano. O bloqueio vai existir até que uma república democrática seja instalada na ilha do Caribe. E não há evidências de que isso vá acontecer a curto prazo. Uma derrota da diplomacia nacional.
A pressão do presidente democrata sobre o Brasil se faz por meio da economia. Há críticas constantes na imprensa americana sobre a inflação de 5% ao mês, desarranjo das contas públicas, crescimento da dívida externa e a presença de esquerdistas no governo. O presidente João Goulart procura diálogo com John Kennedy, um democrata que prometeu mudar as relações diplomáticas e econômicas com toda a América Latina. O encontro entre os dois em Washington é uma tentativa de, pelo menos aparentemente, mostrar que os dois países caminham juntos.
Contudo, a disposição do governo brasileiro de substituir o dólar por outras moedas ou troca direta das matérias-primas com produtos industrializados de países comunistas não é, de forma alguma, aceita pelos americanos. O descompasso entre o governo de direita americano e de esquerda brasileiro tem muito mais pontos de divergência do que de convergência.
Nem os embaixadores Roberto Campos e Lincoln Gordon conseguem convencer seus respectivos países. Isso culmina com a aliança e apoio para partidos e grupos políticos opositores de João Goulart e dá suporte para a elaboração e execução do golpe civil-militar que derruba o presidente em 1964 e dá início ao período militar.
(*) É jornalista do Record News, R7 e Nova Brasil (89.7), além de autor de vários livros de sucesso, tanto destinados ao ensino de História, como para as áreas de jornalismo, mídia training e budismo.