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Estradas que nasceram a partir de antigas trilhas abertas pelos índios

em Colunistas, Geraldo Nunes
sexta-feira, 04 de janeiro de 2019
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Um assunto sempre interessante diz respeito às estradas que surgiram a partir de antigas trilhas abertas pelos índios, especialmente pelos caminhos que levam ao litoral, entremeando a Serra do Mar

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Calçada de Lorena, pintura de Oscar Pereira da Silva. Reprodução

Geraldo Nunes (*)

Em meio á mata fechada o homem branco, para descobrir esses caminhos, precisou se tornar amigo dos índios, como foi o caso do padre José de Anchieta, que hoje dá nome a uma das rodovias da ligação São Paulo/ Santos em justa homenagem. Outras trilhas da Serra do Mar, conhecidas somente pelos tamoios do litoral norte paulista e do Rio de Janeiro, deram origem a atuais trechos da Estrada Velha Rio/São Paulo (SP-66) e partes da Rodovia dos Tamoios (SP-99).

Mas o grande legado é mesmo a Estrada Real, considerada na atualidade a maior rota turística do país. São mais de 1.630 quilômetros de extensão, passando por Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.

Sua história surge em meados do século XVII, quando a Coroa Portuguesa decide oficializar os caminhos para o trânsito de ouro e diamantes de Minas Gerais até o porto de Parati.

Uma parte de trajeto se fazia pela sinuosa estrada Cunha-Parati (SP-171). Merece destaque também neste levantamento o histórico da primeira via de ligação do Brasil Colônia, entre a cidade de São Paulo e o litoral paulista, a Calçada do Lorena, primeira via de ligação a contar com planejamento técnico e engenharia.

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Com mais de dois mil anos, o Caminho de Peabiru tem três mil quilômetros de extensão e passa pelos estados do Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina. A trilha também está presente no Paraguai, na Bolívia e no Peru. É uma via transcontinental pré-colonial que ligava os oceanos Pacífico e Atlântico, utilizada por diferentes povos indígenas, e depois pelos viajantes e conquistadores europeus. Esta rota servia para percorrer longas distâncias em espaços selecionados que passaram por adaptações para facilitar o trânsito a pé, com ajuda de animais e/ou embarcações, cortando alguns rios. (Fonte: http://www.95fmcuritiba.com.br/ noticias/listar/1398/135/historia-do-parana—sobre-o-caminho-de-peabiru)

Foi por esse trajeto feito apenas no dorso de mulas, que Dom Pedro, em 1822, viajou de Santos para São Paulo para proclamar a independência. Aberta em 1790 por determinação do governador da capitania de São Paulo, Bernardo José Maria de Lorena, as obras de construção ficaram sob a responsabilidade do Brigadeiro João da Costa Ferreira, engenheiro da Real Academia Militar de Lisboa.

Concluída em 1792, a Calçada do Lorena tinha a extensão de 50 quilômetros, reduzindo em cerca de 20% o percurso anterior entre Santos e São Paulo. Esse trajeto utilizou parte da antiga rota dos tupiniquins, conhecida como o Caminho do Padre José, em alusão a Anchieta.
O calçamento foi feito em pedras levadas pelos escravos e nas curvas do trecho de serra, caixas de dissipação desviavam, para fora da via, as águas conduzidas pelos canais pluviais. Foi este o primeiro caminho a possibilitar o trânsito de tropas transportando mercadorias consumindo apenas dois dias de trajeto. O que remanesce da Calçada está tombado e preservado pelo Patrimônio Histórico, ficando aberto à visitação turística em passeios monitorados a partir de um acesso existente na (SP-148), a velha Rodovia Caminho do Mar.

Nessa estrada há um belvedere construído a mando de Washington Luiz, em 1922, chamado Recanto da Maioridade. Muitos pensam que ali morou a Marquesa de Santos, mas isso não é verdade. A Via Anchieta (SP-160), foi inaugurada em 1948 e a primeira perna da Rodovia dos Imigrantes (SP-170), em 1976. A pista de descida da Nova Imigrantes só ficou pronta em 2004.

Há outros “caminhos de índio”, como a Rota do Peabiru, (na língua tupi, “pe” – caminho; “abiru” – gramado amassado), formado por antigas trilhas utilizadas por indígenas sul-americanos muito antes do descobrimento do Brasil. Algumas versões dão conta que esses caminhos teriam sido abertos pelos incas provenientes da Bolívia em busca de uma ligação do continente com o Oceano Atlântico e não o inverso.

Hernâni Donato, que escreveu a biografia do bandeirante Antônio Raposo Tavares, informa que a designação Caminho do Peabiru foi empregada pela primeira vez pelo jesuíta Pedro Lozano em sua obra, “História da Conquista do Paraguai, Rio da Prata e Tucumán”, no início do século XVIII. Relatos obtidos em documentos levantados por outros historiadores dão conta que Martim Afonso de Sousa, fundador da Vila de São Vicente, tinha informações sobre a existência desse caminho dos incas, tendo enviado uma expedição de portugueses em busca dessa rota, em 1° de setembro de 1531.

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Vista aérea da Ponte Presidente Dutra. À esquerda, a antena da, hoje, extinta TV Ajuricaba. Foto: Correia Lima. Acervo: Eduardo Braga.

Só mais tarde, entretanto é que Antônio Raposo Tavares, já no século XVII, completaria o trajeto chegando até Quito, no Equador. Sua rota, serviria de inspiração para a abertura de novos caminhos mais tarde utilizados pelos tropeiros do século XIX, originando a Estrada São Paulo/ Paraná (1922-1954) que hoje leva o nome de Rodovia Raposo Tavares (SP-270) com 652 quilômetros de extensão, cujo início se dá no bairro do Butantã, na capital paulista atravessando o Estado até chegar ao município de Presidente Epitácio, na divisa com Mato Grosso do Sul.

O trajeto dessa estrada, entretanto, não segue a trilha original do Peabiru. Na década de 1970, uma equipe coordenada pelo professor Igor Chmyz, da Universidade Federal do Paraná, identificou cerca de trinta quilômetros remanescentes da trilha original, em território paranaense. Mais recentemente, a mesma universidade passou a desenvolver trabalhos para tornar esse trecho do Caminho do Peabiru em atração turística, na tentativa de seguir o exemplo do Projeto Estrada Real, iniciado em Minas Gerais.

(*) Geraldo Nunes, jornalista e memorialista, integra a Academia Paulista de História. ([email protected]).