Em minhas leituras habituais sobre Compliance, Ética, Governança, Negócios e Desenvolvimento Humano – adoro temas que possam acrescentar nas minhas vidas profissional e pessoal – às vezes, me deparo com conceitos sendo apresentados a mim pela milésima vez. Mesmo assim, não pulo uma linha. Afinal, será que a visão de Compliance quando eu aprendi pela primeira vez é a mesma de hoje, quando inúmeros estudantes e profissionais se deparam com o tema?
Gosto do conceito de Back to Basics, quando nos concentramos na essência de uma ideia, naquilo que é mais importante e, ao menos por ora, descartamos ramificações e aglutinações tão presentes no dia a dia do mundo BANI, mas que podem nos afastar do núcleo.
Na última semana, passei por um momento assim: lendo a introdução do livro Governança Corporativa, dos professores Rubens Mazalli e Carlos Ercolin, da Editora FGV, me deparei com uma bela explicação sobre a origem etimológica da palavra Companhia e como isso impacta na Governança Corporativa. Faço nesta Coluna um breve resumo e teço comentários.
A palavra Companhia tem sua origem em cum panis, expressão em latim que significa “aqueles que dividem o pão”. O termo ganha relevância história, pela primeira vez, por volta do século XVII, com a fundação do grupo de mercadores marítimos Companhia Britânica das Índias Orientais.
Os navegadores cruzavam os sete mares procurando fazer comércio e conquistar territórios. Nas missões, os companheiros dividiam o pão literalmente – pois o mesmo alimento era servido a toda tripulação – e metaforicamente, por dividirem riscos, incertezas, imprevistos, vitórias e derrotas, lucros e prejuízos financeiros. Tanto que, até hoje, um dos sinônimos da tripulação de um navio é companha.
Uma empresa atual – ou companhia – não é muito diferente de um navio mercante nesse sentido. O combustível desse navio – o capital – é injetado pelos sócios e retroalimentado por clientes, em um mecanismo que compreende várias partes interessadas, como funcionários, fornecedores, governos, centros de pesquisa, associações de classe, comunidades ao redor etc. Na missão de competirem no oceano mercadológico, em maior ou menor grau, todos dividem os riscos em traçar estratégias, tomar decisões, fazer a máquina empresarial funcionar. Estão todos no mesmo navio, avançam juntos ou naufragam juntos.
Quanto mais partes interessadas existirem, mais complexa é a divisão do pão figurativo. Surge a necessidade de estabelecer regras para que todos se guiem pela mesma bússola. Um sistema que ordene o processo de tomada de decisão, que deixe claro responsabilidades e autoridades e que dirima conflitos de interesses, sempre visando diminuir os riscos inerentes a essa dinâmica. Esse sistema é o que, modernamente, chamamos de Governança Corporativa.
Assim, o cerne da Governança é o estabelecimento de diretrizes para que as partes interessadas se sintam seguras em continuar no barco e vejam vantagens em remar na mesma direção. Partindo desse âmago, nascem políticas, linhas de defesa, canais de denúncia etc.
Como vimos, é sempre importante, de tempos em tempos, relembrar os conceitos básicos para, inclusive, poder aprimorar seus desdobramentos e aplicações. Retomar o cerne da Governança Corporativa é um exercício de reflexão que todo Chief Compliance Officer deve fazer para melhorar continuamente a Governança Corporativa de sua empresa e aproximar os companheiros para que sigam o mesmo norte.
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Denise Debiasi é CEO da Bi2 Partners, reconhecida pela expertise e reputação de seus profissionais nas áreas de investigações globais e inteligência estratégica, governança e finanças corporativas, conformidade com leis nacionais e internacionais de combate à corrupção, antissuborno e antilavagem de dinheiro, arbitragem e suporte a litígios, entre outros serviços de primeira importância em mercados emergentes.