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Restaurantes e o mercado futuro

em Artigos
sexta-feira, 17 de abril de 2020

Gustavo Cruz (*) e Celson Plácido (**)

“O presente impõe formas. Sair dessa esfera e produzir outras formas constitui a criatividade”.

A frase do escritor austríaco Hugo von Hofmannsthal foi cunhada há mais de 2 séculos. Justamente no ano de sua morte, 1929, ela teria seu melhor contexto para encaixe, por conta do Crash da Bolsa ocorrido. Quase um século após os dois eventos, novamente nos vemos diante de um cenário desafiador, que exige muita criatividade.

No Brasil, o setor de serviços representa mais de 60% do PIB, e deve ser um dos mais afetados com a crise do coronavírus. Associações de bares e restaurantes estimam que, no curto prazo, cerca de 6 milhões de trabalhadores do setor serão duramente atingidos. O governo tem enviado propostas para auxiliar, como os R$40 bilhões destinados para micro e pequenas empresas pagarem o salário de funcionários. Valor seria utilizado pelos próximos 2 meses, desde que não demitam staff por conta da crise.

Para enfrentar as adversidades do presente, diversas iniciativas criativas começam a surgir, o intuito é gerar receita enquanto restaurantes e bares permanecem fechados. Todos sabem o que quanto o brasileiro é criativo. Assim, restaurantes que operam no sistema de rodízio estão oferecendo um voucher para clientes utilizarem até o final do ano. Assim, quando o cliente compra um rodízio ganha o segundo.

Também temos o projeto “gentileza gera gentileza”, vendendo vale presentes (modalidade mais comum nos EUA), ou o “apoie um restaurante”, oferecendo vouchers que custam R$ 50, mas que o cliente poderá trocar por um consumo de R$ 100 até o final do ano.
Essas medidas contribuem para garantir algum reforço no fluxo de caixa desses estabelecimentos no curto prazo, que será duramente afetado. Por mais que eles tenham presença em aplicativos de entregas, o número de pedidos da maioria será bem menor.

Até porque, o serviço de entrega não costuma representar nem 10% do faturamento dos restaurantes. Com esse reforço, conseguem algum respiro e se planejam para o restante do ano. Isso sem contar, que em muitas promoções o cliente realiza a compra individualmente, mas no geral a ida ao restaurante ocorre acompanhado. Quem compra o voucher já poderia gastar mais do que comprou originalmente, e ainda pode influenciar outras pessoas que não compraram a lhe acompanhar na ida ao lugar.

O local pode incrementar um fluxo futuro com mais clientes do que teria naturalmente. Contando pela própria pessoa que compra uma das modalidades e de possíveis companhias. Quem adquire pode estar na categoria que já gostava do estabelecimento, mas agora estabeleceu um contrato futuro com o restaurante, no qual poderá exercer a opção de ir.

Ao realizar esse tipo de ação, restaurantes estão utilizando ferramentas conhecidas do mercado financeiro, nada mais do que o mercado futuro. O investidor aciona esse mercado quando tem interesse em comprar ou vender um ativo em um período de tempo futuro, mas para se proteger de oscilações no meio do caminho fecha um contrato bem antes. A ferramenta é muito bem vinda, e pode ser importante na estratégia de longo prazo desses locais.

Tempos não usuais acabam provocando uma aceleração em novos comportamentos do consumidor e dos empresários. Certamente 2020 acelerará novas formas de conexão entre cliente e restaurantes.
O presente aparenta ser nebuloso, mas para sair dessa esfera, precisaremos de ações como essa.

Criatividade pode contribuir, e muito, na continuidade de nossos restaurantes e bares favoritos que estamos contando os dias para rever.

(*) – É estrategista da RB Investimentos; (**) É VP da Proseek.