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Cidades inteligentes versus Estado obtuso

em Artigos
sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Luiz Augusto Pereira de Almeida (*)

Um dos conteúdos referenciais da 3ª Conferência da ONU sobre Habitação e Desenvolvimento Urbano Sustentável, que se realiza no mês de outubro de 2016, em Quito, no Equador, foi produzido no Brasil.

Trata-se do 2º Compromisso de Curitiba, assinado pelos prefeitos de várias cidades do mundo e diretores executivos de empresas nacionais e internacionais, no Smart City Business Congress & Expo America, realizado recentemente na capital paranaense. Para ser inserido na programação da importante conferência, o documento foi entregue ao ONU-HABITAT (Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos), que desde 2010 realiza campanha sobre a necessidade de que o meio urbano seja sustentável.

Os requisitos para que esse objetivo seja alcançado estão expressos com clareza na definição de “Cidades Inteligentes”, bastante disseminada na Europa. Um dos países nos quais o conceito tem sido estudado e aplicado é Portugal, por meio da INTELI – Inteligência em Inovação, associação privada sem fins lucrativos, que organizou um ranking das “Cidades Inteligentes”. Os itens que compõem o índice são a governança, energia, mobilidade, gestão da água e resíduos, segurança, saúde, cultura, economia e qualidade das edificações. Há, ainda, a tecnologia da informação, integrando cidadãos e sistemas públicos, de modo a facilitar a vida de todos.

Acentuando que o principal objetivo do ranking é produzir recomendações para a melhoria do desempenho urbano, a INTELI ressalta, com muita pertinência, que as cidades são espaços de problemas, desafios e oportunidades. Por um lado, abrigam a maioria da população mundial e contribuem para cerca de 80% do consumo de energia e 75% das emissões de carbono (PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente/2011). Além disso, originam problemas de desigualdade e exclusão social. Tal cenário, caso não se adotem as medidas necessárias, tende a se agravar, se considerarmos que a população mundial aumentará, dos atuais sete bilhões, para nove bilhões em 2040, principalmente nos países em desenvolvimento (ONU/2012).

Por outro lado, as cidades são polos de inovação, conhecimento e criatividade. As previsões indicam que as 600 maiores do mundo gerarão 60% do PIB global em 2025 (Mckinsey/2011). Assim, imperativos demográficos, econômicos, sociais e ambientais tornam premente a aposta em novos modelos de desenvolvimento urbano, observa a INTELI.

Embora o Brasil tenha sido sede da produção do documento sobre o tema a ser incluído na agenda da 3ª Conferência da ONU sobre Habitação e Desenvolvimento Urbano Sustentável, é lamentável reconhecer que nossos municípios terão imensa dificuldade para inserir-se nessa agenda mundial. Contra a sua transformação em Cidades Inteligentes, conspira um Estado obtuso, cujo anacronismo, ineficiência, ônus fiscais para a sociedade, burocracia e falta de foco nas prioridades são espinhosos obstáculos.

Em caráter didático, podemos dividir em duas vertentes a origem dos problemas que dificultam o desenvolvimento de nossas cidades. A primeira refere-se à ausência de planejamento urbano, marca registrada negativa de nossa cultura histórica na gestão municipal. A questão não se limita às prefeituras, estendendo-se, também, aos governos estaduais e ao Federal, que compartilham responsabilidades quanto à gestão integrada das regiões metropolitanas e aos investimentos em transportes, moradia, água, energia e infraestrutura. As três instâncias de poder dificilmente planejam a médio e longo prazo e atuam, na maioria das vezes, sem sinergia.

A segunda vertente dos empecilhos está ligada à legislação ambiental e à do uso e ocupação do solo, bem como às suas aplicações. Essas leis são exageradamente limitantes quanto ao desenvolvimento de projetos inteligentes e sustentáveis, edificações verdes, bairros planejados e urbanização correta dos espaços públicos. Restringe-se o sustentável e, via de regra, omite-se a aplicação das leis no caso de ocupações irregulares, favelização e uso indevido de áreas de mananciais e de risco.

É muito difícil agregar inteligência às cidades, como vem ocorrendo em numerosas nações, quando o populismo do Estado resiste ao planejamento, coíbe projetos urbanísticos adequados e possibilita a multiplicação de bairros que são a mais radical antítese da sustentabilidade.

(*) – É diretor da Fiabci/Brasil e diretor de Marketing da Sobloco Construtora.