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Mas, o agronegócio está bem, não é?

em Artigos
quinta-feira, 11 de agosto de 2016

João Guilherme Sabino Ometto (*)

O título deste artigo é um questionamento, com jeito de afirmação, que aparece nas mais diferentes ocasiões, quando se discute a situação da economia brasileira.

À afirmativa, ou melhor, indagação, costumo responder com outra: de que agronegócio estamos falando? Afinal, são muitos os segmentos e distintas as realidades. Sem dúvida, os indicadores macroeconômicos do setor vão bem, especialmente se comparados à economia como um todo: no comércio exterior, os últimos 12 meses registram superávit de US$ 78 bilhões e, no resultado do PIB brasileiro de 2015, a atividade registrou crescimento de 1,8%, ante uma retração de 3,8% do País como um todo.

Além disso, a valorização do dólar compensou de modo importante, ao menos até a safra passada, a queda nas cotações internacionais das principais commodities produzidas pelo Brasil. Não há dúvida de que dessas informações deriva o senso comum de que, com a agropecuária, tudo vai muito bem, obrigado.

Porém, por que nesse cenário a confiança do agronegócio apresenta uma trajetória clara e muito bem definida de queda, desde que começou a ser medida pela Fiesp e a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) em 2013, apesar de alguns períodos de melhoria no meio do caminho? Em um primeiro momento, isso pode parecer uma grande contradição, mas já adianto: não é.

Os números macro não mostram o que os indicadores de confiança conseguem captar. Trata-se das expectativas, embasadas em fatos concretos ou emocionais, que determinam comportamentos e decisões relativos ao negócio. Observando os dados com atenção, se, por um lado, a avaliação do produtor agropecuário sobre o seu próprio negócio e o setor em que atua permanece em alta, por outro, o receio quanto à economia e à política é grande a ponto de fazê-lo agir como qualquer consumidor assalariado. Sem certeza alguma do que acontecerá, coloca o pé no freio e reavalia suas compras, nesse caso, o custeio e os investimentos.

O resultado disso é uma redução no pacote tecnológico utilizado na lavoura, com reflexos importantes no agronegócio, mais especificamente nas indústrias de insumos. O ano de 2015 foi de resultados ruins para vários segmentos: o de defensivos registrou queda de 22% no faturamento; fertilizantes tiveram retração de 6% nas entregas; e as máquinas e implementos agrícolas sofreram recuo de 30% nas vendas, sobre um percentual negativo de 16% em 2014, sendo que, em 2016, já acumulam um tombo de 40% nos quatro primeiros meses do ano. Voltamos, neste último caso, aos patamares de 2007.

Dessa forma, apesar do enorme cuidado dos produtores na gestão agronômica da propriedade na última safra, a redução no uso dos insumos, aliada aos problemas climáticos enfrentados na condução da lavoura, levou, depois de seis anos consecutivos de alta, a uma redução na safra brasileira de grãos em relação ao ciclo anterior, segundo o relatório divulgado, no início de maio, pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).

Na outra ponta, a indústria de alimentos, apenada recentemente com aumentos de IPI, vê os consumidores mudando suas escolhas para produtos menos elaborados. Apesar disso, mesmo itens básicos, como o óleo de soja e a farinha de trigo, fundamentais para o preparo das refeições, já apresentam retração nas vendas. Os números mais recentes sobre a comercialização de produtos alimentícios em 2015, medida pelo IBGE, registrou recuo de 2,5%, o que representa o pior resultado desde 2003. Fica claro que o agronegócio não está alheio ao que acontece na economia brasileira.

Neste exato momento, por exemplo, a forte volatilidade do dólar frente ao real lança dúvidas e incertezas. Não podemos perder competitividade em nível internacional. Portanto, é preciso cuidado na análise de um setor tão complexo. Misturar, em um mesmo balaio, soja, etanol, laranja, máquinas agrícolas, defensivos e indústria exportadora de alimentos com atividades voltadas ao mercado doméstico é garantia de erro de avaliação.

É possível que o encaminhamento do cenário político e o início da gestão do presidente da República em exercício, Michel Temer, tenham a capacidade de modificar os baixos níveis de confiança. O aumento verificado nas entregas de fertilizantes em 2016 pode ser um bom indicativo nesse sentido.

De qualquer forma, para completar minha resposta à incômoda pergunta, digo sempre: poderia estar melhor, bem melhor.

(*) – Engenheiro (EESC/USP), é vice-presidente do Conselho de Administração do Grupo São Martinho, vice-presidente da FIESP e Membro da Academia Nacional de Agricultura.