Daniella Augusto Montagnolli (*)
Não é novidade que o testamento, em poucas linhas, é a formalização da última vontade do testador para quando falecer e pode prever questões não só patrimoniais e financeiras, como também, estipular ordens e desejos que envolvam questões extrapatrimoniais.
Sobre a divisão de patrimônio, é um instrumento já muito utilizado, mas, o que vem crescendo de forma substancial, é sua utilização para também dispor sobre os direitos da personalidade do testador como, por exemplo, o direito de uso de imagem, a substituição por Inteligência Artificial.
Sem entrarmos numa discussão jurídica e doutrinária sobre o fato de os herdeiros herdarem ou não o direito de personalidade do falecido, já que há quem entenda que tais direitos morrem com a pessoa e outros, que são sim herdados, o foco desse artigo é instigar justamente a sadia reflexão sobre a tão falada, aplicada e explorada IA.
A cantora Madonna, por exemplo, incluiu em seu testamento uma cláusula que impede o uso de hologramas e recriação de sua imagem por meio de Inteligência Artificial após sua morte. Essa decisão coincidiu com a do ator Robin Williams, ainda que não envolvendo precisamente a inteligência artificial, mas o direito à sua imagem, além de vários outros famosos que seguiram a mesma linha.
Isso sem contar que há outras tantas pessoas que já vêm se negando a celebrar contratos onde se utiliza a tecnologia, o que tem acarretado entraves em importantes negociações, como a greve de roteiristas e atores de Hollywood.
E é absolutamente compreensível esse receio já que a preocupação não diz respeito a IA em si, mas na sua falta de regulação, já que a ausência de regras claras e limites claramente estabelecidos no que tange a liberdade de utilização de dados, imagens e sua abrangência, podem gerar transtornos aos titulares de dados, imagens e direitos ou uma utilização diversa daquela pretendida e autorizada pelos titulares.
Mas, também é sabido e esperado que, com a velocidade com que a tecnologia e a IA caminha, é certo que, num curtíssimo espaço de tempo, ousando arriscar em até 2 anos, estas lacunas vão se preenchendo e a utilização se revelará mais segura.
O Brasil ainda está caminhando no tema herança digital, entretanto, não há dúvidas de que, cada vez mais, as pessoas vêm buscando proteger a mercantilização de suas imagens, de modo a restringir ou ver assegurado que o seu desejo de não expor sua imagem e dados ou não os ver se tornando público e comercializado sem o seu consentimento exige a urgente regulação de tal uso.
(*) É Advogada especialista em Direito Civil, Família e Sucessões e Processo Civil. É Coordenadora do Departamento Consultivo Cível e de Família da MABE