
A resistência ao crescimento dos data centers voltados à inteligência artificial é grande entre os ambientalistas e agora está mobilizando o cidadão comum.
Vivaldo José Breternitz (*)
Aqui no Brasil, pessoas movimentam-se contra a instalação de um grande data center do TikTok próximo a Fortaleza, voltado ao processamento de IA e que consumirá energia elétrica suficiente para abastecer uma cidade com 2 milhões de habitantes.
Nos Estados Unidos, onde os ambientalistas são mais articulados, mais de 230 grupos, entre eles Greenpeace e Friends of the Earth estão exigindo uma moratória nacional para novos data centers.
O motivo é simples: enquanto empresas como Meta, Google e OpenAI despejam bilhões em infraestrutura para processar algoritmos cada vez mais complexos, parte da conta chega ao cidadão comum, com tarifas de energia subindo muito e recursos naturais ficando cada vez mais escassos.
O alerta não é apenas ambiental. É político. Em estados como Virgínia, Nova Jersey e Geórgia, há candidatos que prometem frear a expansão dos data centers e reduzir custos de energia caso vençam as próximas eleições. Essa pauta vem ganhando força, atravessando partidos e ideologias – afinal, ninguém quer ver sua conta de luz disparar para sustentar a febre da IA ou das criptomoedas.
Donald Trump enfrenta um paradoxo: prometeu cortar custos pela metade, mas os preços da eletricidade já subiram 13% em sua gestão. Ao minimizar o problema, chamando a narrativa de “fraude”, ignora o fato de que 80 milhões de americanos tem dificuldades para pagar luz e gás. É um número que não se apaga com retórica.
Há detalhes, claro. Linhas de transmissão envelhecidas e eventos climáticos extremos também pressionam o sistema elétrico, nos Estados Unidos e no Brasil. Mas é o crescimento acelerado dos data centers que concentra a ira popular. Projeções indicam que o consumo de energia dessas instalações pode triplicar na próxima década, o equivalente a abastecer 190 milhões de residências, apenas nos Estados Unidos. Emissões adicionais de carbono e uso intensivo de água completam o quadro de insustentabilidade.
O curioso é que o debate não se limita à esquerda ambientalista, que nesse ponto alia-se a políticos de extrema direita, como a congressista Marjorie Taylor Greene na guerra aos grandes data centers. Está se criando um arco político improvável, convergindo na crítica – quando a conta chega ao bolso dos eleitores, ideologia pesa menos do que o bolso.
O movimento conservacionista, que vinha perdendo terreno diante da ofensiva trumpista contra as regras ambientais e energias renováveis, encontrou uma nova arma: o custo de vida. É difícil convencer o eleitor da urgência climática, mas é fácil mobilizá-lo quando a conta da luz cresce.
No fim, a questão é de prioridades. Queremos uma revolução tecnológica que promete mundos e fundos, mas que entrega contas mais caras e riscos ambientais? A inteligência artificial pode ser o futuro, mas se esse futuro vier acompanhado de tarifas impagáveis e água escassa, talvez seja hora de repensar quem realmente se beneficia dessa corrida.
(*) Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor, consultor e diretor do Fórum Brasileiro de Internet das Coisas – [email protected].
