Chamamos de gêmeo digital, ou digital twin, à representação digital de um processo, objeto ou mecanismo que existe no mundo real. Através de ferramentas de computação pode-se analisar, por exemplo, a estrutura de um prédio e construir um gêmeo digital desse prédio
Vivaldo José Breternitz (*)
A partir daí, usando essa representação, pode-se testar computacionalmente como o prédio reagiria a movimentos do solo, infiltrações, aumento de carga em pisos etc., sem acessar o prédio físico.
O uso intensivo das redes sociais pode permitir que se crie um gêmeo digital de uma pessoa. A ferramenta para que isso aconteça vem sendo chamada “sistema de qualificação social” (em inglês, social credit score) e baseia-se no comportamento, hábitos, rastros e dados deixados pela pessoa na internet e nas redes sociais. Um sistema como esse permite traçar um perfil da pessoa e conhecer com detalhes seus hábitos sociais, sexuais, de consumo e de mobilidade, sua ideologia, sua situação financeira e estado de saúde, entre outras coisas.
Não é ficção, não se trata de “1984″ de George Orwell ou de um capítulo da série “Black Mirror”; na China já está em uso, ainda que de forma “experimental”, uma aplicação desse tipo, que pontua os cidadãos e lhes permite ou veda determinadas coisas, como viagens, acesso a empregos e empréstimos. Nos Estados Unidos já é permitido que seguradoras fixem os prêmios dos seguros a partir de dados dos clientes obtidos nas redes sociais.
Evidentemente verificações como essas eram feitas antes mesmo da existência dos computadores, através de consultas a birôs de crédito, por exemplo, mas a tecnologia ora disponível permite que isso seja feito numa escala inconcebível até há pouco tempo.
No momento em que a pessoa fosse contratar um seguro, buscar um emprego ou empréstimo, por exemplo, quem seria analisado seria esse gêmeo, e não a pessoa propriamente dita, que poderia sofrer prejuízos se esse gêmeo não fosse um gêmeo idêntico, por ter sido gerado a partir de dados incorretos ou manipulados.
Um sistema como esse permite traçar um perfil da pessoa e conhecer com detalhes seus hábitos sociais, sexuais, de consumo e de mobilidade, sua ideologia, sua situação financeira e estado de saúde, entre outras coisas.
Casos como a negativa de venda de um seguro a uma pessoa em função de seus hábitos e histórico de saúde ou a negação de um empréstimo a quem procura emprego, são exemplos desses prejuízos.
É claro que o fornecimento de informações falsas às redes sociais pode resultar em um gêmeo com um perfil melhor que o da pessoa real, mas dada a capacidade técnica das corporações que o gerariam ou utilizariam, essa hipótese é remota.
Tudo isso remete-nos à velha recomendação: como não podemos viver em uma caverna, desligados do mundo, pelo menos tomemos cuidado com as redes sociais.
(*) Vivaldo José Breternitz, Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie.