Renato Martinelli (*)
Uma relação de confiança entre líder e equipe é um elemento-chave nos times de alta performance. Autores como Patrick Lencione, Stephen M. Covey e outros já identificaram que confiança é a base de tudo. Ações como delegação de responsabilidades para alguém da equipe, alinhamento de prioridades com todo o time para garantir futuramente que o trabalho será entregue, ou mesmo feedbacks com foco no desenvolvimento funcionam bem melhor se houve um vínculo sólido de confiança estabelecido.
Entretanto, falar sobre o tema no contexto em que todo o time trabalhava no mesmo espaço físico é um cenário pré-pandemia, e que para alguns, é motivo de desejo no atual momento. Depois da experiência do trabalho remoto, que durou entre 1 ano e meio a 2 anos dependendo da empresa, a modalidade do trabalho híbrido, com escalas de 2 a 3 dias no ambiente físico da organização, ou seja no presencial, e 2 ou 3 dias do restante da semana útil com 5 dias passou a ser uma realidade para diversas empresas, no Brasil e no exterior.
Se temos muitos líderes estilo “São Tomé”, tem que ver para crer, como desenvolver relações de confiança no trabalho híbrido, considerando que a liderança não estará com 100% da equipe com a frequência em que estava acostumada?
O buraco é mais embaixo. Vivemos uma cultura de desconfiança, seja nas instituições, nos governos, nas empresas, nas lideranças. Em um mundo repleto de fake news, como acreditar nas pessoas?
A cultura da desconfiança gerou comportamentos e ações que demonstram preocupações dos líderes e receios dos liderados. Afinal de contas, como ter certeza de que a equipe está trabalhando e não enrolando? Por isso, o uso de ferramentas de TI – Tecnologia da Informação para monitoramento dos usuários sobre tempo no e-mail, nos aplicativos e nas redes sociais se intensificou. Ouvi relatos de arrepiar também, de que o gestor pediu para a equipe ligar o computador que usa no home office e deixar a câmera aberta o tempo todo, como forma de conferir se a pessoa estava realmente nas suas funções profissionais. Ora bolas, se houve um mínimo de confiança, práticas como essa seriam raras. Afinal, confiar é acreditar sem precisar verificar.
Quando desenvolvemos uma relação baseada na confiança, conseguimos benefícios como:
- Colaboração e o senso de pertencimento
- Comunicação baseada na honestidade
- Aumento de produtividade do time
- Crescimento da motivação, felicidade e o senso de engajamento de todos
- Maior nível de comprometimento e senso de realização pelo alcance das metas
- Estímulo à criatividade para soluções dos problemas e desafios profissionais
Se queremos construir relações de confiança com nosso time, considerando o modelo híbrido de trabalho como possibilidade concreta de funcionamento, sugiro considerar 4 pilares: Mindset, Gestão, Relacionamento e Comunicação.
Mindset: não conheço pessoas que confiam muito nos outros, mas têm baixa autoconfiança, é preciso refletir sobre seu autoconhecimento e o quanto você tem confiança em si mesmo para lidar com os desafios profissionais, sendo fiel aos seus valores.
Gestão: querer adotar o jeito híbrido de trabalho, mas continuar fazendo a gestão como se todos estivessem no presencial, não vai produzir o resultado desejado. Você está com parte da equipe na empresa e outra parte à distância? Então trate de conectar todos, na mesma reunião, na mesma agenda de prioridades, na mesma equipe.
Relacionamento: o vínculo de confiança virá mais da coerência entre discurso e prática do que desenvolver relações de amizade com a equipe. Só que nesse cenário, muitos líderes confundem os papéis, adotam uma gestão paternalista e pensam que a equipe deve gostar de seu líder para confiar, mas essa relação não funciona assim. De que adianta ser amigo das pessoas do time e ser um hipócrita nas atitudes?
Comunicação: a equipe que conhece a seu próprio líder sabe quando está sendo sincero e falando a verdade, e feedbacks honestos é a melhor forma de promover o desenvolvimento das pessoas que trabalham com você. Mesmo que liderados tenham opinião diferente e divergente da visão da liderança, discordar não significa confrontar. Se houver espaço para o diálogo, a equipe se sente mais segura de compartilhar suas ideias e perspectivas.
E como não tem mais essa de líder super-herói e seus super poderes, gestores infalíveis, demonstrar sua vulnerabilidade, suas angústias, desconfortos e aprendizados pode ser o caminho para que a relação com seu time seja sincera.
Pode ser que esses 4 pilares possam ajudar nas reflexões da sua gestão atual e dos próximos passos para aperfeiçoar seu modelo de gestão. Pode ser também que na sua jornada existam outras oportunidades que não foram mencionadas.
Um fato é claro: a confiança é o elo que conecta líderes e pessoas, seja no ambiente presencial ou no remoto. O que muda é a forma de desenvolver essa relação de confiança à distância.
(*) É membro dos Empreendedores Compulsivos, Trainer de Comunicação, Propósito e Performance, e tem como foco ajudar pessoas a desenvolverem competências de comunicação para potencializar engajamento e resultados com equipes e clientes. Possui mais de 20 anos de carreira, agrega experiências e conhecimentos em empresas nos setores de Agronegócio, Automobilístico, Alimentos e Bebidas, Comércio, Construção, Farmacêutico e Químico, Financeiro e Seguros, Papel e Celulose, TI e Telecom, Varejo. É especialista em temas relacionados à Comunicação, Liderança, Gestão de Equipes de Alto Desempenho e Gestão de Conflitos, Vendas, Negociação e Articulação de Soluções.