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A paciência de Gaia

em Opinião
quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Heródoto Barbeiro (*)

O que está em risco é muito mais do que os ecossistemas. O que está em risco é a sua resiliência.

O que está em risco é a propriedade que alguns corpos apresentam de retomar a forma original, após serem submetidos a deformação. A devastação que o planeta sofre no século 21 ameaça esse mecanismo de recuperação que a Terra pratica desde a sua formação. Em alguns momentos não foi capaz de se recompor, como quando foi atingida por um meteoro que modificou o clima do planeta e pôs fim a era dos dinossauros.

Naquele momento não houve resiliência, as adversidades, os golpes desferidos foram de tal brutalidade que tudo sucumbiu. Desta vez não houve a reversão mais forte. Vários acontecimentos estão na direção de provocar novos desastres semelhantes. A diferença agora é que o protagonista é o ser humano com consequências sobre a sua própria sobrevivência, como a crescente falta de água potável.

Além de escassa, é finita, mas as pessoas não estão conscientes que destroem o que vai faltar no futuro e por causa da água novos conflitos poderão surgir entre povos.

As sete irmãs do petróleo sempre estiveram entre os inimigos dos países produtores. Ao longo do tempo eram a face mais visível do imperialismo das nações desenvolvidas. Com o crescimento mundial do consumo de petróleo, culminando com preços recordes de até US$130,00 o barril . Este número foi comemorado pelos acionistas internacionais da petroleiras e pelos governantes populistas dos países produtores.

Os motores de combustão interna cresceram exponencialmente, ávidos de gasolina, diesel e seus derivados e a maior parte deles montados nas plataformas do objeto de desejo da civilização de consumo de massa: o automóvel. Em algumas cidades como Beijing, São Paulo, Bogotá ou Deli o ar que a população respira pode ser visto. As camadas de gás cobrem essas cidades como verdadeiras calotas com todos os reflexos possíveis sobre a saúde humana.

Com esse quadro devastador e a queda do preço do barril, as sete irmãs entenderam o recado e se juntaram para constituir um fundo de um bilhão de dólares para pesquisar combustíveis alternativos. Benemerência? Filantropia? Nada disso, uma decisão estratégica de direcionar os investimentos em outras atividades.

Romper com a resiliência do ecossistema é comprometer irreversivelmente as florestas, entre elas a Amazônica, o desaparecimento da outra metade dos animais que escaparam a dizimação que se iniciou com as primeiras civilizações de caçadores no continente africano, o derretimento das placas de gelos nos polos e nas suas proximidades, com a aceleração da elevação do nível do mar.

Sem o gelo permanente na Sibéria o estoque da gás metano exalado seria suficiente para turbinar o efeito estufa e o ciclo vicioso se completaria. No passado o ministro do petróleo da Arábia Saudita lembrou que a idade da pedra não acabou por falta de pedra. Houve quebra de paradigma com o advento da metalurgia.

Hoje, mais do que nunca, novos paradigmas precisam ser quebrados, não para salvar empresas, mas a própria humanidade. E isso deve começar pelas nações desenvolvidas que já poluíram o suficiente.

Será que vem aí a vingança de Gaia como escreveu James Lovelock?

(*) É escritor e jornalista da RecordNews e R7.com