Daniel Calderon (*)
Em 1696, os britânicos encontraram uma maneira criativa de um novo imposto e começaram a taxar as janelas. Isso mesmo.
Quanto mais janelas uma casa tivesse, mais impostos o dono do imóvel tinha que pagar. A lógica era que as propriedades dos ricos tinham mais janelas e então a quantidade serviria de base de cálculo para o imposto. O que aconteceu com o passar do tempo? O imposto levou as pessoas a construírem casas com cada vez menos janelas e até as mansões eram pensadas para se pagar menos o tal imposto.
Até hoje, em algumas casas antigas britânicas, podem ser vistos espaços de janelas fechadas com tijolos e casarões da época com poucas janelas. Esse novo imposto causou também um grande problema de saúde pública, causados pela falta de ventilação nas casas e que levaram à extinção do imposto em 1851, mais de 150 anos depois de sua criação. Comparo a CPMF, muitas vezes trazidas à tona pelo atual governo, com o imposto da janela.
Já de imediato, a analogia faz sentido na tentação de que o aumento de carga tributária nos remete a um ambiente medieval, daquele rei que quando vê necessidade manda criar mais um imposto. Por consequente, a criação de uma nova CPMF, faz crer em uma preguiça do governo em pensar uma reforma tributaria ampla, eficiente, formada por um grupo de especialistas no assunto e discutida amplamente com a sociedade.
Isso dá trabalho. A janela também era simples e rápida, sem trabalho intelectual.
A CPMF é um imposto regressivo e distorcido e que onera ainda mais a base da pirâmide. Os ricos tinham condições de esconder suas janelas e pensarem em alternativas de diminuir a base de cálculo. Os pobres não. Na CPMF da mesma forma. Outro ponto, a CPMF é sobretaxa em cima dos impostos sobre o consumo, um caráter cumulativo, prejudicando o giro da economia. O imposto da janela era sobretaxa dos imóveis, já que na época, já existia um imposto sobre a propriedade.
A proposta que vemos tem aumento de carga no sistema financeiro e esse aumento, rigorosamente, provoca aumento do custo do dinheiro. A maneira de fugir da base de cálculo seria o dinheiro em papel circulando cada vez mais, de encontro contra qualquer modernidade tributaria ou tecnológica que existe. As pessoas “construiriam menos janelas” e procurariam pagar as contas cada vez mais em dinheiro.
A CPMF criaria um incentivo para que as pessoas sacassem da conta corrente e andassem com dinheiro no bolso, isso nos tempos atuais! Até a segurança do sistema muda, assim como a janela mudou a questão da saúde. A neutralidade tributária, ou seja, a ideia de que um imposto deve interferir o mínimo possível nas decisões dos agentes econômicos é quebrada com a CPMF e, lembrem no nosso exemplo, assim como a tributação das janelas interferindo na construção das casas e na saúde pública.
Vale citar que nenhum país desenvolvido no mundo usa esse tipo de contribuição. Ele é visto mais como um retrocesso do que avanço na questão tributária. Olhem aí mais um comparativo. Nenhum outro reinado ou império importante da época criou algo parecido nos 150 anos. Até o argumento mais favorável do governo de que a CPMF tem potencial arrecadatório razoável com baixo custo administrativo, uma solução rápida e de fácil fiscalização, pode ser comparada com o imposto medieval.
Era fácil de se calcular e a fiscalização poderia passar de casa em casa para checar a sua arrecadação. Simples e rápido. Por fim, a CPMF cria um poder rápido e seguro do Fisco na estatística das transações financeiras, assim como os britânicos na época queriam ter em mãos um inventario mais preciso de sua principal arrecadação, a propriedade.
Nosso sistema tributário é da década de 1960, defasado, distorcido e antiquado e precisa ser alterado e pensado com eficiência e modernidade e não com um viés de 300 anos atrás.
(*) – É contador, advogado, empresário da área contábil e tributária e sócio da Calderon Contabilidade.