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A busca por um sistema de franquias definitivamente empresarial

em Opinião
segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Luis Fernando Guerrero e Hugo Tubone Yamashita (*)

É típico da atividade humana a associação de esforços entre indivíduos e empresas para a realização de um objetivo comum.

Diversos instrumentos jurídicos prestam-se a trazer à realidade este tipo de abstração empresarial, típico da atividade humana como já tratou Yuval Harari em seu célebre e best seller Sapiens – uma breve história da humanidade. Neste aspecto, as franquias destacam-se pela versatilidade – tanto quanto ao tamanho dos negócios franqueados, como também ao tipo de negócio –, bem como por apresentarem uma agilidade sem igual de pulverização e capilaridade quando tratamos de contratos empresariais.

O sistema não é recente no Brasil, completando o seu jubileu de prata exatamente em 2019. Contudo, apesar dos 165 bilhões de Reais de faturamento em 2018, a visão era a de que o setor poderia muito mais. É nesse sentido que surge a nova regulamentação sobre as franquias no apagar das luzes de 2019. (Lei no 13.966, de 26 de dezembro de 2019 substituindo a Lei no 8.955, de 15 de dezembro de 1994), afastando maiores incertezas, garantindo segurança jurídica.

A legislação buscou conceituar de modo claro o contrato de franquia, destacando o seu caráter empresarial logo de início (art. 1º). Obviamente, poderão existir situações excepcionais em que esta caraterística não estará presente, apesar do contido no documento escrito; mas, sem dúvidas, a regra deve ser a da presunção do caráter empresarial da franquia.

Na sequência, a lei dedica bastante atenção à Circular de Oferta de Franquia, tradicional COF, como um documento fundamental para a atração de franqueados e o detalhamento do projeto empresarial oferecido (Art. 2º). Este aspecto é tão importante que informações falsas neste documento podem ser objeto até mesmo punição criminal.

Há destaque também para as hipóteses em que exista relação locatícia entre franqueador e franqueado, fato que agrega maior complexidade na relação existente entre as partes. De qualquer modo, não há dúvidas de que o legislador buscou retratar em sua completude a equação econômico-financeira de uma operação implementada, por meio de contratos coligados (franquia-locação).
Ademais, a preocupação com a propriedade intelectual e o seu uso neste tipo de relação foi algo digno de nota.

Não se deve perder de vista que graves problemas nesse tipo de relacionamento erigem justamente do mau tratamento de informações confidenciais passadas do franqueador ao franqueado, com a possibilidade de que danos irreversíveis sejam causados por violações nesse tocante não só àquele, como também à rede como um todo. Ainda digna de nota, a indicação expressa da arbitragem como forma de solução de conflitos para o setor (art. 7º, §1º).

Merece destaque, ainda, o veto contido no art. 6º da nova lei, tratando da franquia envolvendo empresas públicas e sociedades de economia mista sob o fundamento de que este sistema como algo em controvérsia com a Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016). Faltou, porém, retirar a referência a este tipo de contratação do art. 1º, § 2º da nova lei, onde se trata de empresa estatal.

Finalmente, o reconhecimento de uma sistemática internacional deste tipo de contrato era há muito de rigor. Afinal, como já é do cotidiano do mercado, o hambúrguer consumido, seja ele o tradicional redondo – na chapa ou grelhado no carvão – ou até mesmo o quadrado muito provavelmente foi comprado em uma rede de franquia internacional atuando no Brasil.

Essa realidade, fato inequívoco do nosso dia a dia, estranhamente não continha qualquer previsão legal, em uma lei editada há não muito tempo (anos 1990), mas que retratava um momento histórico do Brasil, país bastante fechado para transações internacionais.

Até o final do mês de março de 2020, quando a lei entrará em vigor, há muito o que maturar sobre os pontos trazidos pela nova norma, que, certamente, impactará nos contratos existentes e em projeções de investimento no competitivo setor da distribuição de bens e serviços.

(*) – Luis Fernando Guerrero é sócio e Hugo Tubone Yamashita é advogado da área de Solução de Conflitos do Lobo de Rizzo Advogados