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Hora de investir: incerteza e tomada de decisões

em Mercado
segunda-feira, 08 de maio de 2023

Bruno Teixeira*

O cenário atual torna mais complexa a vida de quem precisa tomar decisões. Temos inflação, guerra, extremismo, polarização política, fraudes corporativas, quebra de grandes bancos, entre tantas outras variáveis que ajudam a compor uma narrativa conveniente.

Ela é conveniente porque todas são. Ou seja, criamos histórias para explicar eventos de forma a justificar nossas ações e resultados, presumindo cadeias de causalidade em que, na verdade, não temos informação e nem poder computacional suficiente para tirar conclusões. O volume de variáveis e a forma como elas se relacionam é misterioso, frente à capacidade de qualquer modelo preditivo já desenvolvido. Os economistas usam o ceteris paribus para endereçar esse fenômeno. Porém, manter todas as demais variáveis constantes equivale a jogar futebol de botão: seus adversários ficam parados enquanto você se move livremente.

Isso significa que não devemos desenvolver modelos e que modelos não entregam resultados relevantes para a formação de convicções? Claro que não. Só temos que baixar um pouco o tom quanto à capacidade desses modelos de cuspir verdades absolutas.

Existe uma tendência na indústria de investimentos de enxergar os tomadores de decisão como mais que humanos em sua capacidade de prever movimentos. Isso cria uma série de distorções e, potencialmente, um ciclo vicioso indutor de crises e risco moral. Alguns gestores se sentem incentivados a vender seu diferencial (ou edge, na linguagem de mercado), atribuindo à performance um toque autoral que, na realidade, transcende sua capacidade. Alguns clientes, por outro lado, são induzidos a comprar soluções demasiado sofisticadas que contribuem para a uma maior ineficiência na economia e aumentam o grau de fragilidade do sistema.

Nos mercados ilíquidos encontramos, em geral, uma atitude amigável em relação ao papel da aleatoriedade nos resultados. É conhecimento comum que no private equity precisa-se trabalhar com safras de investimento, computando, com isso, a possibilidade de capturar externalidades positivas das diferentes conjunturas nos seus resultados. No mercado de early stage venture capital, onde atuo, existe uma complexidade adicional. Investimos em empresas cujos mercados, modelos de negócios e equipes estão em pleno desenvolvimento e com muita coisa ainda por definir.

Isso transforma a incerteza em algo a ser abraçado, e não escondido. Falar em tese de investimento sempre soou pretensioso e, quando as incertezas são tão gritantes, ter uma tese passa a ser temerário. Uma forma que parece fazer mais sentido para abraçar a incerteza e extrair bons resultados é criar métodos de tomada de decisão iterativos, capazes de evoluir constantemente com base em seus erros e acertos e que se alimentem de informações novas a todo momento. Existem múltiplas maneiras de se criar algo assim, ao pegar ideias do Lean Startup e do design thinking, por exemplo, e combinar com arquitetura de sistemas de software capazes de pautar as tomadas de decisão na execução de passos pré-determinados, com registro de informações, rastreabilidade, geração de dados e possibilidade de constantes updates.

A partir do momento em que entendemos que nossos resultados estão apenas parcialmente ligados ao nosso talento ou capacidade e que operamos com informações limitadas, passamos a ter uma liberdade para falar livremente sobre tudo aquilo que não controlamos, sem cair na tentação de soar mais científicos do que verdadeiramente somos. Todos estamos apenas tentando acertar e buscar sistemas que possibilitem que eventuais acertos sejam replicáveis. Não temos como, em geral, fugir de fenômenos estatísticos como regressão à média ou cisnes negros. Tampouco temos como escapar completamente dos vieses cognitivos que guiam grande parte de nossa tomada de decisões.

Li recentemente uma matéria da Forein Affais que revelava informações até então inéditas sobre a tomada de decisão de Nikita Khrushchev de enviar mísseis para Cuba, em 1962. Em tese, os mísseis ficariam invisíveis abaixo das copas das palmeiras que cobriam o território. Porém, um general soviético sobrevoou o local e percebeu que as palmeiras não teriam como acobertar os mísseis. Tratou logo de avisar seus superiores, que falharam em informar a Khrushchev. O resto é história.

Os fatores que compõem a performance são múltiplos e podem apenas ser atestados com maior grau de certeza quando mensurados ao longo de extensos períodos de tempo.

Momentos como o que vivemos atualmente causam estresse a qualquer tomador de decisões. Ao mesmo tempo, para aqueles cujo negócio é comprar barato e vender caro, é na baixa que se deve ir às compras.

*Bruno Teixeira é CEO da Raio Capital.