Leandro Franz (*)
Planejar sempre parece fácil, pois o papel aceita tudo. O difícil é planejar direito. Um bom planejamento precisa levar em conta a implementação, precisa entender o mundo real que a organização enfrentará para entregar os resultados e objetivos estratégicos. Você já deve ter passado por diversos exercícios de planejamento. A liderança sai alinhada com objetivos estratégicos engajantes, listas de projetos importantes, mobilizada pelas discussões profundas, sabendo tudo o que precisa fazer no próximo ciclo, certo?
Ao longo dos meses seguintes, os problemas começam a aparecer, os objetivos são esquecidos, novas prioridades surgem, investimentos são cortados, áreas focam em seus feudos, ninguém se ajuda, a implementação se torna mais um problema do que uma solução. No próximo ciclo de planejamento, os mesmos problemas surgem nas discussões. E o grupo fica desmotivado, com a sensação de que o tempo passa e nada muda, as mesmas dificuldades permanecem e os desafios aumentam.
Se esse é seu cenário, é importante voltarmos ao básico, ao propósito de um Mapa de Objetivos Estratégicos. Qualquer que seja a metodologia utilizada para seu desenho, ele deve possuir três camadas essenciais: Objetivos, Metas e Projetos.
Relembrando cada uma das camadas:
- Como uma ferramenta de comunicação e alinhamento da estratégia, os Objetivos do Mapa devem deixar claro “o que” a organização deseja fazer/focar para implementar sua estratégia.
- As metas traduzem resultados intermediários e/ou medidas e possibilitam o controle da evolução dessa implementação. Elas devem ser desafiadoras, mas realistas, sendo suportadas por investimentos e projetos.
- Os projetos inseridos nos objetivos são o “como”. Eles devem viabilizar o alcance dessas metas (seja de modo direto ou indireto), devem ser suficientes e priorizados para que todas as metas sejam atingidas.
Na teoria é tudo muito simples e bonito, certo? Mas então por que a implementação muitas vezes dá errado? O problema pode ter sido em um dos 7 itens abaixo. No seu próximo ciclo de planejamento, fique atendo a esses pontos críticos e garanta que eles sejam endereçados pelos líderes!
- Rituais de Gestão: os fóruns e reports de acompanhamento do andamento dos projetos estão organizados, com cronograma, integrantes, alçadas e agenda definida ao longo de todo o ciclo?
• Sem próximos passos claros, a tendência é cada área ou líder de projeto se fechar em seu “feudo” e a visão integrada se perder, gerando competição por recursos, despriorizações e retrabalhos no caminho.
•Sem esses rituais claros de gestão da implementação, mudanças de contexto de mercado não são enfrentadas. Muitos projetos que poderiam perder prioridade ou serem “paralisados temporariamente”, dando lugar a alguma outra oportunidade, continuam e ocupam a agenda de outros projetos mais importantes.
Sem esses rituais claros de gestão da implementação, mudanças de contexto de mercado não são enfrentadas. Muitos projetos que poderiam perder prioridade ou serem “paralisados temporariamente”, dando lugar a alguma outra oportunidade, continuam e ocupam a agenda de outros projetos mais importantes.
- Cockpit Integrado: todos os projetos estão reunidos em um único plano de ação? Mostram dependências, apoios e detalhamento das etapas necessárias?
• Sem uma ferramenta integrada como guia para a implementação, novamente surge o risco de desalinhamentos e competição por recursos, com cada área olhando apenas sua fatia. Muitas vezes, inclusive, são geradas iniciativas sobrepostas ou conflitantes, não aproveitando sinergias de conhecimentos, pessoas e até recursos terceiros.
- Conexão com Orçamento: estamos tentando fazer tudo ao mesmo tempo? Nossa priorização está correta e temos recursos suficientes?
• É frequente o exercício do planejamento estar desconectado com o orçamento anual, sendo feito em momentos diferentes. Assim, surgem diversas iniciativas estratégicas importantes e priorizadas que não terão recursos (financeiros e de equipe).
• Deixando o cenário mais crítico ainda, só ao longo da implementação, após diversos esforços serem iniciados, as equipes de projeto acabam descobrindo que não terão orçamento suficiente.
• Aqui, o tema menos lembrado é se o tamanho da equipe está adequado à todas as entregas estratégicas. Se as atividades de rotina já consomem todo seu time, em que momento eles se dedicarão às iniciativas estratégicas? Como equilibrar e deixar clara essa alocação para todos?
- Clareza de Conquistas: sabemos exatamente o que vamos comemorar na implementação? Quais as metas e indicadores prioritários? Quais grandes entregáveis em projetos estratégicos?
• Não há como medir a implementação de um objetivo estratégico se ele não estiver conectado a metas claras ou, ao menos, a algumas entregas de projetos-chave.
• Ao final do ciclo, todos devem ter clareza se o objetivo foi cumprido ou não. Um caso comum é construir objetivos genéricos, como “digitalizar operação”, e levar cada um a entender diferente o que isso significa. Ao final do ciclo, a operação pode ter sido “digitalizada” em uma área que não era a prioritária quando o planejamento foi construído. E, pior, pode ter sido digitalizada em uma intensidade muito maior que a necessária, consumindo recursos que poderiam ser direcionados a outros projetos essenciais.
• Quando houver dificuldade na definição de uma meta e indicador (ex: aumento de 30% das vendas pelos canais digitais), deve-se ao menos sinalizar grandes entregas de projetos-chave que poderão ser comemoradas (ex: novo fluxo para e-commerce implementado em até 3 meses, ou MVP de novo produto construído e implementado para um cliente-teste em 6 meses).
- Liderança e colaboração: temos responsáveis definidos para cada projeto? Eles estão cascateados para as equipes? Todos os níveis se sentem parte da implementação do planejamento?
• Nenhuma área consegue implementar objetivos estratégicos sem apoio e mobilização de outras áreas e níveis operacionais. É importante compartilhar as prioridades com toda a organização, tanto para garantir esse apoio quanto para focar nas prioridades.
• Se todos sentem que entregam a estratégia, a implementação é facilitada para os líderes (tanto em termos de agenda quanto em tomadas de decisão ou suporte em análises).
• Essa comunicação ampla também ajuda a evitar o surgimento de novas iniciativas desalinhadas com a estratégia.
- Pacto de comportamentos: sabemos quais comportamentos são essenciais para a implementação? Estamos dispostos a nos policiar e garantir a mesma disposição e foco em todos os fóruns de trabalho?
• Projetos estratégicos geralmente mexem com a zona de conforto e a rotina das áreas. É preciso um acordo formal para evitar resistências e “polêmicas” desnecessárias durante a implementação.
• Todas as discussões difíceis devem ser feitas no momento do planejamento. Após as prioridades serem definidas, o grupo precisa trabalhar junto, deixando as desavenças ou interesses específicos de lado.
- Pessoas: por fim, mas nunca menos importante, estamos com a cultura adequada para os novos desafios de mercado? Temos a estrutura e as equipes com competências necessárias para a implementação?
• É comum o foco do planejamento se dar nas dimensões que envolvem impactos financeiros diretos (portfólio de produtos, processos, marketing, clientes, oportunidades de receita, oportunidades de redução de gastos). Mas quem entrega tudo isso, enquanto os robôs ainda não dominarem o mundo, são as pessoas.
• É essencial uma discussão contínua e profunda sobre os projetos de cultura, recrutamento, desenvolvimento, clima e engajamento dos colaboradores para a busca de resultados. Quando o “orçamento aperta”, geralmente são os primeiros projetos a serem cortados.
• Essa descontinuidade na mobilização das equipes e retenção de talentos, porém, gera impactos significativos no crescimento de longo prazo: talentos insatisfeitos podem migrar para a concorrência e criar descontinuidade nas equipes; clima ruim gera entregas inadequadas, retrabalhos e discussões improdutivas; desalinhamentos culturais levam a crises internas, baixa sinergia e colaboração. Tudo isso, se quantificado, colocado na ponta do lápis, pode ter muito mais impacto financeiro que um projeto de redução de despesas ou de um novo produto.
Com a compreensão desses 7 pontos críticos, vemos que um bom planejamento é insuficiente se não estiver preparado para os desafios da implementação. Podemos criar planos e objetivos perfeitos para o negócio, atendendo a todas as ameaças e oportunidades, mas falhar ao não dar atenção a esses detalhes. Em poucos meses, as discussões importantes caem no esquecimento, novas prioridades desalinhadas surgem e, no próximo ciclo, todos os mesmos problemas reaparecem.
Portanto, a cada exercício, garanta que seus líderes tenham clareza da importância dessas definições e evitem erros comuns que, com certeza, todos já vivenciaram em ciclos anteriores.
Uma última recomendação: se todo esse percurso acima parecer complexo demais, foque no checklist abaixo em um encontro da liderança, ele já servirá como um ótimo primeiro passo!
- Reservamos tempo suficiente para discutir os projetos?
- Priorizamos olhando para os recursos disponíveis e resultados a serem alcançados?
- Temos as competências necessárias instaladas, principalmente quando tratamos de novas soluções ou novos mercados?
- Reservamos tempo e recursos para a inovação, ou citamos a palavra inúmeras vezes como um “aposto ou adjetivo”?
- Definimos as formas de acompanhamento e controle necessárias para revisar e redirecionar o que for necessário?
- Levamos em consideração os projetos que já estão em curso, seja para redirecioná-los ou repriorizá-los diante dos novos?
- Conseguimos engajamento e transformamos as prioridades em uma “agenda única” da organização ou esperamos que aconteça no “paralelo” do nosso dia a dia?
(*) – Leandro Franz, sócio e consultor da People+Strategy. Mestre em Economia com especialização em Teoria dos Jogos pelo Insper e economista pela UFSC (www.peoplestrategy.com.br).