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Neurociência te induz a escolher o que comprar

em Manchete Principal
quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

Você já pensou quantas vezes comprou por impulso?

Redação

Você já entrou em uma loja e comprou determinado produto só pela fragrância? Ou se deixou seduzir pela cor e levou algo que não tinha intenção de comprar até algumas horas atrás? E descartou alguma coisa por estar relacionada à morte, como a inserção de cravos no ponto de venda? Saiba que tudo isto tem relação direta com as modernas relações de consumo, pautadas pela emoção. “O consumidor procura uma relação emocional, via recompensa, pelo fato de que como seres vivos todos somos movidos por emoções e impulsos”, diz André Cruz, expert em neurociência e comportamento.

Não se sinta “vítima” da Inteligência Artificial (IA) hoje, pois há muito tempo as marcas descobriram formas e métodos de levar o consumidor a comprar o que elas querem vender. Ora de forma aberta, ora de modo sutil, mas saiba que muitas vezes a neurociência te ajudou a escolher o que você comprou. Quer ver? Passando por uma prateleira de produtos de limpeza, de repente vem “aquele cheirinho da casa da mãe”… e junto afetivas lembranças. Quando você vê, já tem no carrinho um, dois ou três produtos que nem estavam na lista de compras.

“Ao entrar em uma rede grande, por exemplo, você encontra tecnologia do lado direito, que é para onde a maioria dos homens vai, e à esquerda da loja, cremes e produtos de menor porte, local preferido por mulheres”, comenta Cruz, argumentando que isto não se faz ao acaso. Há estudos comportamentais e pesquisas “quali e quanti” para quase tudo o que consumimos, no intuito de as marcas venderem mais e mais. “Nós mapeamos, decodificamos e transformamos os dados em estratégia de negócio”, diz o fundador e CEO da Neura, explicando que a neurociência vai para o consciente na fase da pesquisa exploratória.

Lembrando que o neurônio é um estímulo elétrico – com ondas alfa, beta e gama – e que as emoções e impulsos nos levam às compras, começa a ser decodificado uma espécie de “mapa do sucesso” nos negócios. O trabalho do neurocientista, neste caso, é levar esta dinâmica para dentro das organizações. Aparentemente simples, a coisa não é bem assim. Requer muito conhecimento e insights porque o cérebro na relação “ganhar x perder”, sempre quer ganhar, ser recompensado, ter vantagens – continua André Cruz. E exemplifica com um pequeno truque que engana o cérebro: você pede um carro por aplicativo e este mostra que vai demorar 12 minutos. Você acha demais, cancela, abre outra chamada, e encontra um outro por 8 minutos. Cancela, porque ainda acha muito tempo, abre outra chamada e encontra um que chegará em 6 minutos. Ainda que na somatória, desde a primeira chamada, você tenha gasto mais que 12 minutos, seu cérebro considera que obteve uma grande vantagem ao acessar o último de apenas 6 minutos…

André Cruz

Em um supermercado – sempre um rico cenário para exemplos de consumo – se você chega e logo pega um pacote de papel higiênico, a leitura que seu cérebro faz é de que “o carrinho está quase cheio”, então pode parar de comprar. Se, ao contrário, começar pelos itens de pequeno volume, o cérebro perceberá que o carrinho está “quase vazio” e, portanto, cabe ainda muita compra. Este é um raciocínio simples, claro, mas que ilustra o tema. “O consumidor não tem um único perfil de compra”, revela o CEO da Neura, começando a sofisticar a explicação.

Uma instituição financeira (multinacional brasileira) decidiu relizar uma bem sucedida ação em um país sulamericano, onde já opera. Ideia era fazer e acontecer “de prima”. Contratou a Neura e a empresa fez, inicialmente, a leitura de códigos comportamentais locais que, embora sulamericanos, tinham premissas diferentes dos brasileiros. E só a partir daí começou a pensar em estratégia.

Em outra ocasião, uma grande rede de lojas de perfumes e produtos de beleza pediu “um help” para o time do André, porque uma determinada campanha não dava o resultado esperado, embora tivesse dinheiro disponível. “Descobrimos que cometeram um erro na montagem das vitrines, colocando na parte alta, e, portanto, mais visível, os tons promocionais, como preços, deixando os produtos na linha inferior…” Agora imagine o quanto esta marca gastou, mudando 13 vezes ao ano (treze mesmo) as ações de marketing/merchandising.

“Neurociência é técnica e todo o processo tem ciência aplicada”, resume André Cruz, lembrando, en passant, que até Barack Obama usou neurociência em sua campanha. Assim, acredite, muito do que você leu até aqui, revisitando umas e aprendendo “otras cositas más”, a neurociência já sabia. E te carregou para fulgurantes lugares e suprimiu tantos desejos que nem você mesmo sabia que tinha.