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A improdutividade é um ciclo vicioso que pode se tornar bola de neve

em Manchete Principal
segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Shirley Fernandes (*)

A improdutividade sempre vem acompanhada de um ciclo vicioso. E como todo ciclo vicioso, ela pode tornar-se uma bola de neve em sua vida. Mas é importante destacar que a improdutividade pode surgir na vida de qualquer pessoa, em qualquer momento e fase da vida. Esse é um sentimento que também faz parte do ser humano, somos tendenciosos a ficar e gostar da zona de conforto.

Trago aqui algumas reflexões de experiências vividas, onde me conectei com estudos e conceitos aprendidos com o objetivo de entender como melhor lidar e mitigar a improdutividade do meu time. Analisar os indicadores de performance do time é uma prática que tenho feito com muita intensidade nos últimos dez anos.
Quando iniciei minha jornada de líder, achei que poderia utilizar os mesmos mecanismos que eu usava para mensurar a minha produtividade e aplicar no meu time.

O resultado? Não deu tão certo como havia imaginado e quebrei a cara muitas e muitas vezes. Com o tempo, descobri uma dura realidade. O contexto é muito mais complexo quando se trata de gerenciar o outro, e os mecanismos precisam ser adaptáveis nos mais variados níveis de exigências e resultados. Fazer com o que o outro realize o necessário, aquilo que foi estabelecido e proposto durante a contratação, é um imenso desafio.

E só entendemos isso na prática, quando muitos sabem o que têm que fazer, mas o agir não acontece na mesma intensidade do saber. Este paradoxo é um movimento cíclico, que traz inércia na geração de resultados. O que no meu conceito era obrigação de um profissional entregar, durante a prática, como líder, se apresentou como um diferencial.

Segundo Caio Arnaes, gerente sênior da Consultoria Robert Half, empresa americana especializada em recrutamento, nomeada na lista da Fortune das “World’s Most Admired Companies”, existem cinco pontos para pessoas serem demitidas, sendo o primeiro deles a baixa produtividade, seguido da falta de adequação à cultura da empresa, mal relacionamento com a equipe, atrasos e faltas constantes e, por último, a falta de um bom relacionamento com o seu superior.

Frente a essa perspectiva, decidi estudar e analisar as caraterísticas de uma pessoa improdutiva para mudar o meu viés na hora da contratação. E, também, com as pessoas que já fazem parte do meu time, buscando sondar se elas querem sair deste ciclo vicioso da improdutividade e vivenciar modelos diferentes de entrega dos resultados. Quando falo em improdutividade como um ciclo vicioso, faço aqui uma associação com a vida como um todo, desde o início de todo o nosso aprendizado de obrigações, entregas e prazos.

E esse é um processo que se inicia lá na infância. Pois, as pessoas crescem e mudam apenas de ambiente, mas o padrão continua o mesmo. Assim, ao vislumbrar esse cenário desafiador de um líder, que é ter um time de alta performance, elenquei duas características fortes de uma pessoa improdutiva, ou seja, aquelas que pouco entregam os resultados.

A primeira característica é a pessoa que sempre precisa de uma supervisão para finalizar as suas tarefas. A segunda é aquela pessoa que consome o seu tempo se ocupando com atividades que não estão alinhadas com a tarefa principal, ou seja, se distrai facilmente.

. Supervisão assídua e distração – É interessante o quanto a nossa qualidade de aprendizados, que começa lá na infância, reflete nos padrões atuais, quando estamos no mundo corporativo. Ao fazer essa regressão para a fase da infância, percebo que as crianças (no quesito comportamental) que precisavam de um reforço escolar e ficavam de recuperação, estudavam apenas no último dia antes da prova.

Elas ficavam brincando em sala de aula, entravam por último na sala de aula e eram as primeiras a saírem quando o sinal tocava. Esse tipo de comportamento tende a se repetir com o passar do tempo, só que de uma forma diferente quando pensamos no cenário empresarial. Essas crianças precisavam sempre de um recall dos pais, dos professores e passavam de ano sempre na navalha.

Mas com o tempo, essas crianças crescem e se tornam adultos e profissionais que levam, mesmo que de forma inconsciente, este padrão vivenciado e aprendido de improdutividade. Isso não é uma regra, aliás, falando de pessoas, nada é geral, tudo são pesquisas e percepções como um todo. Mas, por este movimento de associação que fiz, ousei em intitular este artigo como: Improdutivo cíclico.

Contudo, no ambiente corporativo o contexto muda. Aquele velho padrão repetitivo continua sendo o mesmo. Tudo vira um peso, uma dificuldade e nada é entregue dentro do prazo que foi solicitado. Além disso, essas pessoas não conseguem realizar as tarefas sem consumir o tempo de outra pessoa, pedindo ajuda de um colega ou mesmo do seu superior que termina fazendo o serviço.

Esse tipo de pessoa escolhe alguém de muleta para as entregas, consumindo o tempo dela e do outro. Enquanto na infância essa pessoa era a figura da mãe, na fase adulta e no mundo corporativo é o chefe. Parece ser tão lúdico essa associação feita, não é verdade? Mas o ser humano é assim, ele muda o ambiente, mas a origem, quanto aos valores, permanece e esse comportamento cíclico também se mantém o mesmo, só que outra forma.

A cada dia mais empresas estão com este alerta de olharem o padrão comportamental, o fit cultural do colaborador com a empresa, porque entendem que os softs skills são fundamentais para o profissional performar bem e crescer dentro da organização. Estes pontos não eram nem mencionado antes, o que importava era o currículo, experiências, certificações e diplomas. Isso continua sendo importante, mas não o fundamental.

Liderar pessoas nas mais variadas construções de aprendizados e propósitos de vida é um desafio constante. E requer aprender e desaprender diariamente padrões, mudar o mindset e apreciar a diversidade em vez de guerrear com ela. Líderes inspiram os liderados, mas não impõem. Eles apenas mostram o caminho e validam quem quer seguir e mudar.

A baixa performance, ou seja, lidar com profissionais não produtivos, é um dos cinco grandes desafios dos líderes. Por que isso é tão crescente? Porque um feedback e plano de carreira dentro da empresa não resolvem por completo esse problema, apenas melhoram por um tempo e depois voltam, no mesmo padrão de sempre? Porque a pessoa desde cedo aprendeu a ser assim. Ou seja, ele não faz questão de mudar e coloca a culpa em algo que advém da infância, como eu já disse anteriormente.

Nesse caso, é necessário, é preciso desaprender. Desaprender esse padrão construído e mantido e buscar um novo padrão. Um padrão de uma pessoa com um mindset inovador e disruptivo. Só que nem todos estão dispostos e prontos para esta reprogramação. Este século busca substancialmente por pessoas flexíveis, prontas para experimentar o novo com muita humildade intelectual durante o processo de aprender. E desaprender também.

A nós, líderes, apenas nos resta garimpar tais pessoas, treinar e retê-las. É fácil? Lógico que não. Mas não temos outro caminho e precisamos seguir acreditando que o nosso trabalho tem o poder de transformação no outro por meio desta conscientização, de onde ele está e aonde quer chegar.

(*) – É sócia-diretora Comercial e de Marketing da N1 IT Stefanini.