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O preconceito da arte com as animações

em Economia da Criatividade
quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

A premiação do Oscar 2022 ficou marcada pelo infame tapa de Will Smith em Chris Rock, fato que acabou ofuscando qualquer outro grande momento da cerimônia. Momentos vários que também não desceram muito bem, como a piada feita por uma das apresentadoras que mais pareceu assédio do que alguma coisa engraçada. Ou o fato de terem cortado tantas categorias importantes da parte ao vivo do evento. Mas um ponto baixo do evento que não foi muito falado foi o que aconteceu quando apresentaram o prêmio de melhor longa de animação. Primeiro, introduziram três atrizes conhecidas por interpretarem versões live-action de princesas da Disney (ignorando o quanto além de filmes de princesa são animações, e valorizando mais suas versões não animadas): Halle Bailey, Lily James e Naomi Scott. E então, o discurso delas (que vale a pena mencionar, não deve ter sido escrito pelas mesmas) fala sobre como animação é coisa de criança, e brinca com os pais cansados de ver tais filmes. Até entendo porque alguém veria graça em uma piada dessas, mas a verdade é que essa piada só reforça como a grande Hollywood se sente sobre animações: que são coisas infantis e inferiores a outros tipos de produções.

Outro caso que exemplifica perfeitamente esse sentimento de Hollywood foi uma fala do ex-CEO da Disney, Bob Chapek, ano passado. Em uma entrevista para o New York Times, o polêmico ex-CEO (cujos motivos de ter saído da empresa ainda quero falar mais em um futuro artigo) disse o seguinte:

“Nossos fãs e público colocam seus filhos para dormir à noite depois de assistir Pinóquio, Dumbo ou Pequena Sereia, então eles provavelmente não vão querer assistir outro filme de animação, eles querem algo para eles.”

A fala de Chapek ignora  completamente a história da própria empresa. O próprio Walt Disney uma vez disse: “Eu não faço filmes somente para crianças. Eu os faço para a criança que existe em todos nós, tenhamos seis ou sessenta anos.” Um grande exemplo disso é a Pixar, comprada pela Disney em 2006, cujos filmes ressoam com crianças e adultos a anos. Um dos sucessos mais recentes do estúdio, Soul, tem temas mais maduros como a morte e o sentido da vida como temática principal.

Essa linha de pensamento de Chapek também explica porque filmes da Pixar têm sido colocados em segundo plano pela Disney. Três dos últimos lançamentos do estúdio (Luca, Soul e Turning Red) foram lançados diretamente no Disney+, serviço de streaming da Disney. “Não queremos ser um título apenas no Disney+”, disse um funcionário não identificado da Pixar ao Business Insider. “Esses filmes são criados para a tela grande. Queremos que você assista a esses filmes sem distrações, sem olhar para seus telefones.”

Isso mudou com o último lançamento da Pixar, Lightyear, que conta a história do personagem no qual o brinquedo de Andy em Toy Story é baseado – uma premissa que pode ter se provado confusa para alguns pais e espectadores. Infelizmente, o filme não foi um grande sucesso de bilheteria, conseguindo somente $225 milhões globalmente, pouco acima de seus $200 milhões de orçamento. Mas um dos possíveis motivos dessa dificuldade financeira é a qualidade da história do filme, que apesar de ter 74% no Rotten Tomatoes, não alcança a qualidade de filmes anteriores da Disney.

Chapek não foi o único CEO nos últimos anos a ter uma opinião baixa de filmes animados. David Zaslav, o também polêmico (e, diferente de Chapek, atual) CEO da Warner Bros. Discovery chegou à seu cargo depois da fusão da Warner Bros. com a Discovery Inc. em 2022 e começou uma reestruturação da empresa e do serviço de streaming HBO Max, removendo do streaming mais de 30 animações como Infinity Train, OKKO, e Summer Camp Island e cancelando o lançamento de Scoob: Holiday Haunt, animação prequel do filme recente de Scooby Doo que estava pronta para ser lançada. Até uma aguardada série animada do Batman para a HBO Max foi cancelada, e agora está procurando um novo streaming para ter continuidade.

Se tantos em Hollywood tem a opinião de que animações são coisas infantis e não valem a pena o investimento, fica a dúvida: Será que estão certos? Para isso, volto para meu estúdio de animação favorito, do qual sempre falo por aqui: Sony Pictures Animation, que logo estará lançando um dos filmes mais aguardados do ano: Spider-Man: Across the Spider-Verse. Sequência do filme de sucesso de 2018, muitos esperam ansiosos pelo lançamento da animação. E para os próximos anos, o estúdio já tem vários lançamentos aguardados, incluindo uma comédia animada para adultos do talentosíssimo diretor Genndy Tartakovsky.

Fora da Sony, a DreamWorks animation também tem tido sucesso, particularmente com seu mais recente lançamento: Puss in Boots: The Last Wish. Apesar de o filme ser uma sequência, o primeiro filme tem mais de 12 anos, então é mais fácil relacionar esse sucesso com a qualidade incrível do filme, não só em um roteiro que lida com temas maduros e interessantes, mas na própria animação que, provavelmente se inspirando em Spider-Verse, mistura 3D com 2D de forma deslumbrante.

E com isso, vemos os Oscars de 2023, onde os indicados em Melhor Longa Animado são: Puss in Boots: The Last Wish, Marcel the Shell with Shoes On, Turning Red, Guillermo del Toro’s Pinocchio, e The Sea Beast. Esses dois últimos sendo lançamentos da Netflix, que está investindo bastante em animações, com pelo menos mais quatro vindo para o streaming em 2023.

A favorita para ganhar é a versão de Pinóquio do premiado diretor Guillermo del Toro, um filme com uma linda animação em stop-motion e que, apesar de contar a história do famoso boneco de madeira amado pelas crianças, é também um filme que cativa vários adultos, com temas maduros como guerra e fascismo. Uma pena não terem indicado o filme também em Melhor Filme, ou Roteiro Adaptado, mas quem sabe com um filme desses ganhando, finalmente Hollywood passe a olhar a animação com outros olhos, finalmente vendo a mina de ouro de histórias para todas as idades que é essa mídia.

Formado em cinema na Full Sail University, Lucas Fouyer é o criador do Podcast Terapeuta, o qual apresentou na CCXP17, trabalha na edição e produção de diversos vídeos e é um amante de toda forma de cultura pop