José Carlos Nascimento (*)
O home office já é realidade para alguns profissionais há um bom tempo, mas durante a pandemia ele foi tão difundido que, agora, assistimos ao movimento de consolidação de novos modelos de trabalho. Consequentemente, vemos uma transformação na forma de liderar pessoas. Segundo uma pesquisa do Google Workspace com IDC Brasil, apenas 25% das empresas estão atuando presencialmente. A maior parte está em modelo híbrido (56%) ou remoto (19%).
Isso nos leva a refletir sobre os desafios das organizações, que vão muito além dos estruturais, uma vez que cada vez mais profissionais exercem suas funções remotamente. Pois, em uma empresa, é necessário que exista um senso coletivo. Mas como fazer isso com pessoas que, em alguns casos, nunca se viram pessoalmente?
O mercado está sendo obrigado a repensar a cultura organizacional para despertar o senso de pertencimento nesses trabalhadores. Afinal, nunca é demais lembrar que o homem é um animal social. Segundo o psicólogo americano Abraham Maslow, a demanda pelo social fica abaixo apenas das fisiológicas e de segurança. Para Maslow, quando negligenciamos essas necessidades, sentimos frustração, desinteresse, pessimismo e insegurança, entre outras emoções negativas.
No mundo corporativo, é o senso de pertencimento que faz o colaborador se sentir parte do todo, aceito, útil e valorizado. Ele é capaz de refletir diretamente na melhora da saúde mental do profissional e na qualidade do seu trabalho. Com isso, é inevitável que a organização também se beneficie, usufruindo de um clima melhor. Segundo uma pesquisa da Harvard Business Review, profissionais satisfeitos são 31% mais produtivos, 85% mais eficientes e 300% mais inovadores.
Quem se sente parte, se sente mais feliz e, consequentemente, produz mais e melhor. Os resultados podem ser vistos na qualidade das entregas internas, na queda da taxa de “turnover” e na reputação que a empresa ganha no mercado. Quem não quer trabalhar num lugar onde as pessoas se sentem bem assim?
A importância do senso de pertencimento vai além de ter uma performance superior — ela está ligada também com a retenção de talentos e a motivação. Porém, engajar e despertar esse sentimento, independemente do modelo, é um trabalho que tem começo mas não tem fim. É bom salientar que isso precisa permear toda a organização. A começar pelo CEO, todos têm um papel fundamental nessa cultura.
O colaborador que se sente acolhido e parte de um time, num ambiente saudável, está menos propenso a pedir demissão e mais inspirado a continuar entregando o seu melhor. Mas como fazer ele se sentir verdadeiramente inserido sem a presença física? Como criar esse sentimento em perfis e gerações diferentes? A resposta está na liderança.
A busca por despertar um sentimento positivo de pertencimento começa por dar aos líderes as ferramentas necessárias para que eles aprimorem dois pontos cruciais: a comunicação e a percepção. O primeiro, a comunicação, deve ser analisado sob a perspectiva do gestor. Como ele se relaciona com os seus liderados? Ele consegue criar um espaço aberto ao diálogo dentro das suas equipes?
Tudo isso é determinante para a construção de uma cultura interna saudável, na qual todos se sintam ouvidos e relevantes para a empresa, mesmo estando a quilômetros de distância do escritório. O outro ponto é a percepção. Sempre atento aos detalhes e ao subjetivo, o líder deve ser um eterno observador. Ele observa o ambiente e os colaboradores para perceber comportamentos fora dos padrões, antever situações e intervir o quanto antes.
No home office, uma solução que tem se mostrado eficiente para olhar o entorno é abrir a câmera. Sim, deve haver o estímulo para que, sempre que possível, todos se vejam, mesmo que seja pelo computador. O contato visual no dia a dia atua como um fortalecedor dos laços. A comunicação e a percepção são poderosas aliadas para criar uma relação individualizada com cada colaborador. E o senso de pertencimento está ligado ao fato de se sentir entendido.
O empregado que tem a sua necessidade social atendida enxerga no líder um apoiador, alguém com quem ele pode contar. Vale reforçar que o respeito à privacidade é primordial. Por maior que seja a intimidade com o seu superior, em questões da sua vida pessoal, o colaborador deve ter a iniciativa de pedir ajuda e sinalizar o limite do que deseja expor. Sabe o que é muito instigante e apaixonante no trabalho de recursos humanos? A solução nem sempre passa por ações espalhafatosas.
Apostar em coisas simples e efetivas faz a diferença. Por exemplo, o gerente pode ligar para todos os seus liderados no aniversário de cada um. Pode ser considerado algo até banal, mas toda ação para fazer a pessoa se sentir parte é muito relevante. No caso da ligação, a atitude demonstra que o gestor se preocupa e gastou alguns minutos do seu dia apenas para felicitar o colaborador. Um ato que não custa nada e demanda apenas uma breve organização para salvar lembretes com as datas e alguns minutos por dia ao telefone.
Nesse novo cenário, o caminho para criar uma cultura de pertencimento requer a humanização das relações. A comunicação e a percepção vão fornecer os insumos necessários para o líder estabelecer essas interações mais individualizadas, respeitando a singularidade de cada colaborador, mas pensando sempre no coletivo. O gestor é uma peça-chave nessa construção de um ambiente, remoto ou híbrido, saudável.
Porque, além de orientar e estar sempre aprimorando as suas habilidades de gestão, ele também tem o papel de servir de inspiração. Os ganhos em ter uma empresa em que as pessoas se sentem parte dela, como já mencionado, vão além da produtividade, impactam diretamente na saúde mental.
(*) – É diretor de RH da IOB.