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De quem é o direito autoral – da empresa ou do trabalhador?

em Destaques
domingo, 19 de junho de 2022

Rosa Maria Sborgia (*)

Todo empregador sabe que na relação de trabalho convencional, decorrente de vínculo empregatício, a regra é que o empregador é titular da produção do empregado. A relação empregatícia prevê a ocorrência de pressupostos essenciais, tais como, pessoalidade, subordinação e retribuição dos serviços prestados através do denominado salário.

Porém, na relação de criação de obra autoral submetida a Lei de Direitos Autorais, o vínculo estabelecido entre as Partes (empregador x empregado x obra autoral) exige atenção, pois as regras são outras. Sem desprezar as previsões que reconhecem o vínculo empregatício previstas na CLT, a Lei de Direitos Autorais prevê que o “autor é a pessoa física criadora da obra literária, científica ou artística”.

Isto quer dizer que em atividades empresariais que existe a rotina de criação autoral, como em agências de publicidade, marketing, programas de computador/softwares, gravadoras, editoras, espetáculos artísticos, traduções, dentre várias outras, se o empregado criar qualquer obra desta natureza, será sua a titularidade imediata e não do empregador.

Ao criar uma obra autoral, o autor, isto inclusive se for o empregado, passa a ser titular imediato dos direitos patrimoniais e dos direitos autorais. No âmbito dos direitos patrimoniais, são exclusivamente do autor os direitos de usar, fluir e dispor da obra literária, artística ou científica. Isto quer dizer, somente o autor tem o direito e usar e explorar economicamente a obra que criou.

No âmbito dos direitos morais, pertence ao autor o direito de vincular o seu nome à obra, bem como, o de reivindicar a sua autoria, o de conservar como inédita, o de assegurar a integridade, reclamando contra terceiros sobre qualquer modificação que ocorra, como também, o direito de alterá-la sempre que desejar incluindo o de retirá-la de circulação quando desejar.

Portanto, todo empregador que tiver obras criadas por empregados, precisa preocupar-se em obter as cessões e transferências dos direitos patrimoniais para que a empresa possa explorá-las economicamente, incluindo o poder de transferi-las a terceiros, como por exemplo, a clientes. Nota-se que os direitos morais são intransferíveis e portanto, o autor sempre poderá reivindicar a sua autoria ou no mínimo a indicação do seu nome em qualquer exposição, a não ser que o mesmo, mediante declaração escrita, renuncie a tal direito.

Há uma corrente de profissionais especialistas na legislação de direito autoral que defende que, enquanto durar a relação empregatícia, a cessão das obras autorais é automática em favor da empresa. Entretanto, a própria legislação de direitos autorais prevê que os contratos desta natureza devem ser interpretados de forma restritiva, ou seja, o empregador poderá explorar a obra criada pelo empregado, somente no limite e na finalidade existente na relação empregatícia.

Exemplo seria a relação dentro de uma agência de publicidade. Esta poderá explorar as obras criadas pelo empregado publicitário somente em campanhas de publicidades, vedando as suas explorações (ou seja, das obras criadas pelo empregado) em outras formas – na circulação de um livro.

Porém, numa corrente de doutrinadores conservadores da matéria de direito autoral, mesmo ocorrendo o vínculo empregatício, a cessão dos direitos patrimoniais não é automática ao empregador, mas sim depende, concomitantemente a formalização ao contrato de trabalho, de um contrato escrito e específico de cessão de qualquer obra criada pelo empregado.

Assim, para melhor segurança do empregador, torna-se relevante a sua observação quanto a formalização de contrato de cessão e transferência patrimonial de direito autoral junto ao contrato de emprego, observando que o contrato de cessão autoral, justamente em razão do seu alcance restritivo, deve ter redação ampla e precisa, particularmente quanto às regras do prazo, do preço, do território e da exclusividade sobre a exploração da obra.

Também deve ser observado pelo empregador que, caso haja acordo de preço a ser pago por este ao empregador a título de criação autoral, este preço não pode se misturar ou confundir-se com o salário, visando evitar mascarar um pelo outro.
A relação de emprego prevê o pagamento de salário sobre os serviços prestados pelo empregado. Este direito é irrenunciável.

Já a relação de criação autoral prevê a possibilidade do empregado ceder e transferir os seus direitos autorais ao empregador, a título oneroso ou gratuito, a depender do negócio formalizado entre estas Partes. A legislação de direitos autorais não possui qualquer impedimento ou restrição de que a cessão patrimonial seja formalizada de forma gratuita. O que não pode ocorrer é o uso do pagamento de qualquer honorário sobre o uso de obra autoral como se fosse o de salário e vice-versa.

Certo é que, empresas cujas atividades contemplem criações autorais, precisam ficar atentas quanto às formalizações dos contratos adequados, já que o contrato de vinculo de trabalho, por si só e isoladamente, não contempla as regras gerais de cessões e transferências de direitos autorais.

A ausência de formalização deste, poderá acarretar problemas sérios ao empregador no dia de amanhã, pois o autor se manterá com o vínculo de criação com a obra autoral e somente este poderá explorá-la comercialmente cumulando com o direito de reivindicar a autoria da citada obra.

(*) – Advogada especializada em marcas e patentes, é sócia da Bicudo & Sborgia Propriedade Intelectual (https://www.bicudo.com.br).