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Como sua cultura molda seu bolso: uma perspectiva global sobre hábitos financeiros

em Destaques
sexta-feira, 02 de agosto de 2024

Angelina Bejgrowicz (*)

Você já parou para pensar em como a cultura de seu país influencia suas decisões financeiras? A relação entre a inteligência cultural e o manejo do dinheiro é um tema fascinante e revelador, mostrando que nossos hábitos financeiros são muito mais do que simples escolhas pessoais; eles refletem profundamente as crenças e valores de onde viemos.

Como polonesa, minha jornada para compreender o impacto da cultura no manejo do dinheiro foi uma revelação surpreendente, especialmente após minha mudança para o Brasil. Na Polônia, nossa história é profundamente marcada por conflitos e incertezas econômicas. Isso moldou uma cultura de cautela financeira, onde poupar e gastar com moderação são mais do que hábitos – são quase uma questão de sobrevivência nacional.

Crescemos aprendendo a valorizar cada złoty, a moeda polonesa, e a considerar o futuro financeiro com um olhar de prudência. Essa bagagem cultural me acompanhou ao chegar no Brasil, um país com um panorama econômico e cultural distinto. Fiquei inicialmente surpresa ao testemunhar a cultura de consumo nos centros comerciais brasileiros.

“Como podem gastar tanto?”, eu me perguntava, trazendo comigo a perspectiva polonesa de frugalidade e economia. No entanto, com o tempo, comecei a compreender que essa tendência ao consumo era mais do que um mero hábito; era uma resposta cultural a um passado de instabilidades econômicas, como a inflação elevada e o impacto do Confisco da Poupança.

Esse contraste entre as práticas financeiras polonesas e brasileiras é um exemplo fascinante de como a cultura influencia nossa relação com o dinheiro. Enquanto na Polônia a ênfase está em poupar e preparar-se para o incerto, no Brasil, o histórico de desvalorização monetária pode levar a uma preferência pelo consumo imediato, refletindo uma abordagem diferente em relação à estabilidade financeira.

Olhando para além desses dois países, vemos que essas diferenças culturais se estendem globalmente. Cada nação, com sua história única e contexto socioeconômico, desenvolveu práticas financeiras distintas que refletem suas experiências coletivas.

Nas Filipinas, a tradição do “alkansya”(cofrinho) ensina as crianças a valorizar a poupança desde cedo. Muitos filipinos crescem com a crença de que é importante poupar agora para ter dinheiro suficiente para necessidades futuras.

As crianças são encorajadas a poupar uma parte de seus presentes em dinheiro durante o Natal ou aniversários. Com o tempo, o dinheiro poupado nos cofrinhos é frequentemente depositado em uma conta bancária, representando a primeira poupança da criança.

Em Cingapura, conhecido por ter uma das maiores taxas de poupança do mundo, os cidadãos economizam, em média, 55% de sua renda familiar. Geralmente, as economias são destinadas a despesas com transporte, alimentação e moradia.

No Japão,”Kakeibo”, que significa “livro de finanças domésticas” em japonês, é uma prática centenária que ajuda os japoneses a definir e alcançar seus objetivos de poupança através de um consumo consciente. Eles dividem as despesas em quatro categorias: sobrevivência, opcional, cultura e extras, planejando no início de cada mês como alcançar seus objetivos financeiros.

Na China, antes da popularização dos métodos de pagamento digital e cartões de crédito, a maioria dos chineses preferia pagar em dinheiro, uma forma de gastar dentro de suas possibilidades. Isso reflete a alta taxa de poupança do país.

Na Alemanha, a palavra “Schuld”, que significa dívida, carrega também o significado de culpa, indicando uma relação cultural complexa com o dinheiro.

Nos Estados Unidos, a prática de dar mesada às crianças ensina lições sobre dinheiro e trabalho desde uma idade precoce. As abordagens variam entre as famílias, sendo a mesada usada para despesas diárias ou como recompensa por tarefas domésticas.

Esses hábitos distintos são janelas para compreender como a cultura molda nossas atitudes financeiras. Afinal, enquanto o dinheiro pode ser uma linguagem universal, as atitudes e práticas a seu respeito são profundamente pessoais e culturalmente enraizadas.

Este é um convite para explorar como a inteligência cultural e financeira pode não apenas nos ajudar a entender melhor os outros, mas também a refletir sobre nossas próprias práticas financeiras. Afinal, você já pensou em como sua cultura molda seu bolso?

(*) – Especialista em Negócios Internacionais e Trade Financia e diretora da AB – Global Connections (https://abglobalconnections.com/).