Ricardo Klein Schweder (*)
Os setores da economia demandam cada vez mais da área tecnológica, criando uma carência por engenheiros no mercado.
Lá em 2012, quando o Brasil se preparava para receber a Copa do Mundo e uma série de acontecimentos acelerava o desenvolvimento do país, o Sistema Confea/Crea já apontava que os cerca de 40 mil profissionais formados anualmente nas diferentes modalidades das Engenharias, Agronomia e Geociências não eram suficientes para acompanhar e propiciar devidamente tamanho crescimento.
Desde então, a necessidade só ampliou. Hoje, se discute ainda mais a missão da Engenharia na criação de soluções para problemas sociais, populacionais e globais, como habitação, insegurança alimentar e emergências climáticas, ao mesmo tempo em que o mercado busca por tecnologias emergentes. As oportunidades de atuação seguem diversas pela infinidade de possibilidades dessa evolução constante. Por outro lado, a requisição por mão de obra qualificada foi refinada, ficando ainda mais exigente.
A própria área de Recursos Humanos (RH) precisou acompanhar a digitalização para otimizar processos. Atualmente, uma ferramenta de people analytics pode fazer a análise de dados do público interno, para a tomada de decisões, identificando perfis e comportamentos, além de indicar melhores formatos de comunicação, benefícios mais interessantes e formas de cuidar do bem-estar dos colaboradores.
Há também o uso da inteligência artificial para seleção de candidatos com base em indicadores e palavras-chaves pré-estabelecidas, como o modelo utilizado pelo LinkedIn para indicação de oportunidades para usuários e de profissionais para recrutadores, por exemplo. Fora o processo seletivo informatizado, que não depende mais de um ambiente corporativo físico – e sim virtual – para etapas de testes, entrevistas e contratação.
Se o RH, que sempre foi mais dependente de interferência humana em tarefas menos automatizadas, está demandando tais soluções, imagine as outras áreas. O setor tecnológico se faz essencial, afinal é ele que provê dados e soluções para a tomada de decisão e de ação.
Tanto é que esses avanços têm sido considerados moldadores de uma nova configuração de trabalho que prioriza a produtividade a partir da automação, da aquisição de talentos, da colaboração e do cuidado com a saúde mental e física dos envolvidos, conforme publicação do Instituto de Previsão da Malásia.
Então, nada mais natural que essa transformação levasse também ao surgimento de mais exigências por novas habilidades e capacitações de um engenheiro, agrônomo ou geocientista. O profissional precisa estar adequado a essa realidade. Com isso, a formação por si só não é mais o principal fator competitivo. Habilidades extras passam a ser o verdadeiro diferencial.
No lado das universidades, o grande desafio é a educação, uma vez que o espaço acadêmico tem papel fundamental na construção do pensamento técnico e inovador, mas dificilmente poderá preparar o profissional integralmente. O que significa que a responsabilidade de sair à frente e preparado para o mercado é desse profissional.
Como fazer isso? Investindo em competências não-palpáveis relacionadas à visão de mundo e ao perfil comportamental e interpessoal do indivíduo, conhecidas como soft skills. De forma simplista, o entendimento sobre soft skills parte de duas questões centrais: “O que eu preciso para chegar aonde desejo? O que vai me diferenciar?”.
Isso vale tanto para pessoas quanto para empresas: um líder visa a contratação do melhor candidato para o melhor desempenho da corporação diante da concorrência; enquanto o ingressante precisa atrair para si mesmo o olhar do recrutador, de modo a se destacar entre outros que possuem a mesma formação e se destinam a mesma área de atuação, para conquistar sua posição na empresa.
Da mesma forma, com carência de mão de obra na área tecnológica, o profissional busca empresas que oferecem uma cultura e benefícios que mais o atraem.
Contudo, não se deixe enganar pela denominação suave (do inglês soft). Essas aptidões resultam de adaptações a longo prazo. O espírito de protagonismo e liderança, a curiosidade e a capacidade de resiliência ditam o sucesso desse processo, inspirando iniciativas de mudança.
A transformação geracional pode ser vista ainda na flexibilidade almejada pelos profissionais e um exemplo claro disso é o formato remoto ou híbrido de trabalho. Sem a obrigatoriedade de deslocamento cinco ou seis vezes por semana, a viabilidade de dedicação para os valores da vida pessoal é ampliada, tornando-se mais atraente.
Para o futuro, muitas novidades devem surgir. A tendência que se projeta é que o número de pessoas que buscam desenvolver outros projetos em paralelo a um trabalho efetivo ou atuar com prestação de serviços para mais de um contratante aumente. Isso porque o vínculo entre empresa e empregado tem sido reduzido gradativamente.
A descentralização tem se mostrado financeiramente viável para ambos, ainda que mais presente no setor privado do que no público, que tem regulações um pouco mais limitantes para a aquisição de produtos e serviços por terceiros. O que se espera nesse caminho é a adoção da Engenharia como ideal de desenvolvimento pessoal, não apenas técnico, mas cultural também.
Ou seja, a evolução dos próprios profissionais em verdadeiros agentes de toda essa transformação.
(*) – É Engenheiro Mecânico e gerente da área de Gestão de Pessoas do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de São Paulo (Crea-SP).