Flávio Hernandez (*)
Desde 1981 é comemorado em 29 de maio o Dia Mundial da Energia, uma data para celebrar a importância da energia elétrica para as nossas vidas, que é imprescindível para o nosso desenvolvimento como sociedade.
Segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, só no Brasil no mês de abril de 2024, houve um crescimento de 10,4% no consumo de energia em relação ao mesmo período do ano passado, proporcionado pelo calor atípico que provocou uma demanda maior em todos os estados.
Para atender à crescente demanda, podemos dizer que o Brasil possui uma fonte renovável na geração de energia, permeada pelas matrizes energéticas de biomassa de cana, hidráulica, lenha e carvão vegetal e outras renováveis, como solar e eólica.
Apesar do ecossistema positivo e de grande importância para o nosso desenvolvimento, a geração de energia brasileira possui um desafio pouco comentado e que necessita atenção, devido à sua possibilidade de geração de receita e desenvolvimento. Isso porque, hoje, a oferta de energia cresce mais que o consumo e o Brasil joga fora o excesso produzido.
Conforme aponta o estudo do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), até 2028, o Brasil terá uma demanda de 110,98 gigawatts de energia, em relação à uma oferta disponível que poderá chegar a 281,56 gigawatts até o final de 2027. Esse resultado significa que a oferta ficará 2,5 vezes acima da demanda.
Essa oferta elevada se deve, principalmente, à implementação e incentivo mundial ao modelo de Geração Distribuída (GD) de energia que tem colaborado para aliviar a rede e reduzir a dependência da geração de energia centralizada que estava sobrecarregada. Vale saber que a GD é feita de forma descentralizada nas proximidades ou no próprio local em que essa energia é utilizada, geralmente em condomínios, propriedades rurais, shoppings ou indústrias.
A escassez de demanda por energia no país ocorre porque o planejamento da rede energética, referente às projeções sobre o crescimento econômico e, consequentemente, sobre a demanda energética foi otimista demais. Ou seja, essas projeções ficaram aquém e o resultado, atualmente, é que o nosso sistema produz uma quantidade de energia que supera o que o nosso mercado realmente precisa.
Com diversas opções de fornecimento, os clientes passam a optar pelas fontes mais baratas de energia, deixando outros geradores. Estima-se que somente a Eletrobrás possua cerca de 7,5 GW de energia descontratada, vindas das usinas hidroelétricas. Para ter uma ideia, 1 gigawatt de capacidade pode iluminar mais de 1 milhão de residências por ano, dependendo da fonte geradora.
Com a energia sendo gerada em excesso no Brasil, como é possível aproveitá-la? Uma vez que não é possível armazenar energia com eficiência, como fazer para a geração excedente de energia não se tornar um simples desperdício? Como monetizar essa energia para que possa contribuir para o desenvolvimento da nação?
A resposta pode estar onde menos se espera, que é na mineração de bitcoin, uma atividade que vem ocupando cada vez mais espaço no noticiário relacionado à produção de energia. Antes, o foco dos investidores estava principalmente em seu impacto ambiental negativo, porém, agora estão reconhecendo as oportunidades que esse mercado oferece e começam a compreender como a atividade está alinhada aos princípios ESG (ambientais, sociais e de governança).
A mudança de visão ocorreu porque os investidores começaram a entender o potencial que esta atividade industrial possui para incentivar o crescimento econômico ao destravar oportunidades no mercado de energia. Estudo realizado no início de 2024 pela Genial Investimentos e Arthur Inc indica que um caminho para destravar esse potencial energético ocioso realizado pela mineração de bitcoin, conseguiria gerar uma receita de R$ 165 milhões no país, em 2023.
O estudo também aponta que a atividade geraria uma receita de até R$ 300 milhões, em 2026, por meio da GD. O cálculo tem como base as projeções da ONS (Operador Nacional no Sistema Elétrico) do crescimento de minigeradores alimentados por energia solar na GD, com capacidade a partir de 500 kW.
Ainda, o modelo de operação de bitcoin também pode colaborar com a redução das emissões de gases poluentes na atmosfera, já que é possível monetizar por meio da queima de metano, que é liberado por empresas de energia e petróleo. Atividade essa que é avaliada por grandes consultorias, como a KMPG, como prática ESG.
Em resumo, a transformação da energia ociosa é um modelo de negócio que colabora com o socioambiental, porque consegue gerar receita nas áreas onde ocorre a geração de energia, contribuindo assim para o desenvolvimento seja ele local, regional ou federal. As corporações no mundo estão atentas à importância da mineração de bitcoin por meio da energia ociosa.
Empresas de energia dos Estados Unidos, como a Exxon Mobil, Shell e Duke Energy, além da Tepco, maior companhia de Energia do Japão, já utilizam o excedente energético para minerar bitcoin. Isso aponta uma tendência internacional à vista em que o Brasil pode ocupar um papel de destaque devido ao seu ecossistema de geração energética.
A energia elétrica é o insumo básico nos processos de produção industrial assim como no setor de prestação de serviços e comércio em geral, além do conforto que proporciona aos domicílios. O excedente gerado pode se converter em receita para as regiões do Brasil, que é um país rico em fonte de energia renovável.
Ou seja, o uso da mineração de bitcoin com a energia ociosa pode apoiar a nação brasileira a se tornar uma referência no uso consciente da energia e promover o desenvolvimento socioambiental, gerando riqueza para o país.
(*) – É Chief Business Officer da Arthur Inc (https://arthur.inc/).