Quem Legisla
Nem todo parlamentar pode ser considerado interesseiro, mas uma banda é voltada para cuidar mais dos seus do que dos nossos. Dá para acompanhar pelas notícias.
Quando acompanhamos a criação de uma lei, de como e porque ela é motivada, podemos saber o quanto têm de corporativismo degenerativo ou civismo preocupado em resolver e crescer. Vamos a uns ensaios de verificação, como a Lei Kandir: de setembro de 1996, que isentava do tributo ICMS os produtos e serviços destinados à exportação.
Está dito, promove a isenção de imposto, o Estado deixa de arrecadar mais e o exportador pode se beneficiar. A Lei de Responsabilidade Fiscal, que define gastos na gestão da administração pública, a Lei Maria da Penha, que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Nessa última a motivação e homenagem a Maria da Penha Maia Fernandes, se baseou em sua história de perseguição e violência doméstica, de que foi vítima durante 23 anos. Em 1983 o marido por duas vezes tentou assassiná-la. Conta-se que a primeira vez, com arma de fogo, deixando-a paraplégica, e, na segunda, por eletrocussão e afogamento.
Nessa linha de leis que têm alguma manifestação popular, em 1994 foi alterada a Lei dos Crimes Hediondos, criada quatro anos antes, em 1990, no governo Collor, que foi uma tentativa de resposta à violência. Sabemos que com o assassinato de sua filha, a atriz Daniella Perez, dois anos antes, a novelista Glória Perez, conseguiu incluir o homicídio qualificado na Lei dos Crimes Hediondos.
Por essa lei ter tido grande repercussão na mídia, alguns acreditam que teria sido criada por iniciativa popular, mas não foi. Ocorre que, não obstante a colheita de um milhão e trezentas mil assinaturas esse projeto de Lei foi encaminhado pelo Presidente da Comissão Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente do Estado do Rio de Janeiro. Portanto, em sua origem, essa lei não é de iniciativa popular.
O nascimento de uma lei sempre tem uma origem social, tem sua história, e a sua manutenção pode ser um avanço ou um atraso. Algumas têm um emaranhado de caminhos que precisam ser percorridos até que se aplicadas como é o instituto da delação premiada, que na legislação é um benefício concedido a um réu que aceite colaborar na investigação ou entregar seus companheiros.
Esse benefício legal é previsto em diversas leis: no Código Penal, na Lei dos Crimes Hediondos, na Lei das Organizações Criminosas, na Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, na Lei dos Crimes Contra a Ordem Tributária, Econômica, na Lei de Lavagem de Dinheiro, na Lei de Proteção a Testemunhas, na Lei de Infrações Contra a Ordem Econômica e na Lei de Drogas.
Ou seja, quando se fala em modificar uma Lei há muito que se considerar, o que nem sempre passa pela cabeça do Legislador, que, não raro, pensa na que não venha lhe prejudicar. Por isso, devemos ficar atentos em quem legisla para quem.
(*) – Escritor, Mestre em Direitos Humanos e Doutorando em Direito e Ciências Sociais. Site: (www.marioenzio.com.br).