Lucro nas duas pontas
Levar vantagem em tudo. Dar um jeitinho. Quebra essa! Sabe com quem está falando? Por favor me chame de excelência!
Leia a minha carteirinha. Olhe o meu crachá. Aos amigos tudo, aos inimigos a letra fria da lei. Vou provar na justiça que sou inocente. Esse aí não sou eu. Eu não sou eu. Ainda tenho uma infinidade de recursos judiciais. Complexo de vira lata. Sou eu quem manda aqui. Prendo e arrebento. Demito e contrato. Dou a última palavra. Aí que preguiça!
Brasileiros e brasileiras. Todas essas frases poderiam ter sido ditas pelo herói sem caráter, o Macunaíma.
Um personagem que, felizmente, só existe na literatura, graças ao gênio de Mário de Andrade. Nada tem a ver com o caráter e e com a auto imagem que os brasileiros têm de si mesmo. Por isso Macunaíma se tornou tão popular, é porque só existiu na imaginação do escritor. Permeou livros, filme, peças de teatro e lembranças de um ou outro quando querem um traço marcante de personalidade: caráter. Portando é uma ficção, nada tem a ver com a realidade do Brasil.
O CEO da corporação tinha o espírito do Macunaíma. Ao assumir imediatamente baixou ordens estabelecendo normas, procedimentos e protocolo de como obter resultado para os acionistas. E como garantir a sua parte, é claro. Valia tudo para a obtenção dos mais rentáveis contratos ainda que para isso fosse necessário uma conduta antiética e ilegal. Condutas impróprias eram admissíveis desde que impactasse favoravelmente o resultado. Segundo o Banco Mundial a corrupção impacta de 25 a 30% do PIB onde a corrupção corre à rédeas soltas.
Para o recém nomeado CEO isto era um indicativo que havia um amplo espaço para crescimento da corporação e para sua expansão em diversas áreas. Da fabricação de cervejas, a navios sonda, hidrelétricas, estradas, pontes, caminhões pesados, mineração… Enfim um mundo de oportunidades apenas esperando um líder corporativo que tivesse a audácia suficiente para peitar os desafios. Obviamente com grande respaldo dos setores influentes da nação, inclusive e principalmente os políticos.
Os exemplos do passado não servem para o presente. Nem pensar em seguir algumas empresas transnacionais que tinham adotado regras de complience e assumido publicamente os erros cometidos nos negócios. Era coisa de gringo arrependido. Isto não cabia em um país com grandes oportunidades de negócios, com financiamentos de pai para filho, e juros baixos bancados pela população. Ética e complience tem que ser uma ação de marketing e não uma prática real, repetia o CEO.
Em uma economia de capitalismo de compadrio o que vale não é o preço nem o custo-benefício, mas os amigos, os quebradores de galho, os amigos do homem, que são decisivos na hora de se obter o contrato de empréstimo no banco público e na compra de bens e serviços com preços superfaturados. Macunaíma descobriu, graças a sua astúcia, que essa era a melhor forma de se dirigir uma organização, com juros baixos e preços acima do mercado era possível elevar os ganhos à estratosfera. Ser um campeão nacional.
Para que todos ficassem tranquilos quanto ao volume de ganhos, o CEO mandou retirar da ata de reunião que, pelas novas legislações no mundo, a empresa é responsável pelos atos ilícitos cometidos pelos gestores que a dirigem.
(*) – É editor chefe e âncora do Jornal da Record News em multiplataforma.