Heródoto Barbeiro (*)
O presidente da república faz mais um discurso diretamente do palácio do governo, na capital da república.
A fala presidencial se propaga por todo o país através da mídia oficial. Ele, propositadamente, deixa os anúncios de seu governo para ocasiões de festa, de orgulho nacional para movimentar a seu favor a opinião da população. Desta vez, o foco é o interior do Brasil, que, na opinião dele, esconde tesouros imensos, especialmente na área coberta pela floresta amazônica.
O chefe do executivo lembra que foi graças à conquista do imenso território que se encontrou ouro em Minas Gerais e foi levado para a Europa pelos colonizadores portugueses e que ajudaram a financiar a revolução industrial inglesa. Mas agora é diferente, é preciso novos desbravamentos no sertão, nas beiradas dos rios e o ouro deve ficar aqui para financiar o desenvolvimento do país.
Ele está convicto que imensas riquezas se encontram nessas regiões. É preciso avançar e buscá-las. No meio do caminho do ouro tem uma tribo indígena. Muitas tribos indígenas que ocupam imensas áreas do território nacional. Ninguém sabe exatamente onde estão, quem são e como podem reagir a essa invasão dos homens brancos em suas áreas.
Não se cogita impedir que o progresso, a civilização ocidental, a religião europeia chegue até as tribos isoladas e espalhadas na imensidão da Amazônia. É um avanço em direção ao Oeste, uma promessa desde o primeiro reinado. Mas para isso é necessário desbravar o sertão, percorrer os rios, contatar as tribos que forem encontradas no meio do caminho e implantar postos avançados da civilização brasileira.
Já se estenderam milhares de quilômetros de telégrafo interligando pequenas cidades e vilas. O anúncio da marcha pelo sertão é feito em 1937, primeiro ano do Estado Novo, comandado pelo ditador Getúlio Vargas. A Voz do Brasil se incumbe de informar a todos a decisão do governo. A polêmica se instala entre partidos políticos, antropólogos e indigenistas. Deve-se ou não delimitar uma área como território indígena?
Há pelo menos 25 anos se debate essa proposta no Congresso Nacional. Os irmãos Villa Boas lideram o contato com as tribos indígenas, estudam o seu comportamento, meio de vida, crenças e forma de ver o mundo. Há uma forte opinião contrária à criação de uma terra indígena.
São faiscadores de ouro, seringueiros, contrabandistas, exploradores de mão de obra escrava em fazendas de criação de gado e ultranacionalistas que temem que um dia esses territórios possam se proclamar autônomos e ter o reconhecimento internacional.
Finalmente, em 1961, o presidente Jânio Quadros, movido por forte pressão política, assina a criação do Parque Nacional do Xingu, a primeira grande terra indígena demarcada no Brasil e a mais importante reserva indígena das Américas. A polêmica continua.
Novas áreas habitadas pelos povos originais também podem ser delimitadas especialmente após a Constituição de 1988. A maior vitória é a criação da Reserva Raposa do Sol, no extremo norte do país.
(*) – É jornalista do R7, Record News e Nova Brasil. Palestras e Midia Training (www.herodoto.com.br).