Em tempos de redes sociais fervilhando, percebe-se que as pessoas não entendem verdadeiramente o conceito de transparência. Você já reparou nisso? Muitas vezes, esse princípio é confundido com a exposição ilimitada de informações, fatos, imagens e situações. Fulano é transparente porque não tem vergonha de apresentar cada aspecto de sua vida na Internet. Já ciclano é fechadão porque não gosta de se exibir publicamente. Quem nunca ouviu esse tipo de comentário, hein? Aí eu questiono: será mesmo que podemos classificar a transparência de alguém (ou de uma organização empresarial) somente pelo seu nível de exposição pública?
Para ilustrar esse debate, preciso recordar o que aconteceu em uma reunião empresarial em que participei há alguns bons anos. A alta administração do meu cliente estava discutindo como passar uma informação estratégica e delicada do negócio para os funcionários, que exigiam os dados de qualquer maneira e o quanto antes. O bate-boca ia ficando mais feio e tenso dentro da sala. Ninguém conseguia chegar ao consenso sobre como expor os dados extremamente sensíveis sem causar ainda mais ruídos internos.
De repente, entrou na sala o consultor externo, que estava em outra reunião na companhia e não conseguiu pegar o começo daquele encontro. Ao ouvir o debate dos diretores, ele se posicionou contrário à divulgação de uma informação tão delicada. Onde já se viu atirar para os quatro ventos dados sigilosos e estratégicos da corporação! O presidente precisou interceder. Disse que um dos valores da empresa era justamente a transparência. E uma vez sendo uma organização transparente, eles precisavam apresentar todas as informações sem titubear, mesmo sabendo que aquilo não era correto e que iria causar sérios problemas no futuro próximo.
Não concordando com aquele ponto de vista, o consultor explicou que ser transparente não era ficar exposto integralmente aos outros. E para ilustrar suas palavras, ele pediu para alguém na mesa perguntar quanto ele recebia mensalmente na empresa de consultoria. Um diretor do meu cliente perguntou. E a resposta veio: não te interessa! A gargalhada foi geral. Aí o consultor questionou os presentes: estou sendo transparente ou não? Alguém logo disse: não está. E ele esclareceu: estou sendo sim. Disse com muita transparência que esse tipo de informação só interessa a mim, à minha família, à Receita Federal e ao meu empregador. Sou tão transparente, complementou, que faço direitinho meu Imposto de Renda todos os anos.
Qual a lição que aprendi naquele dia? Que é possível ser transparente sem ser exibicionista, inconsequente e leviana. Há muitas empresas (e pessoas) muito ativas nas redes sociais que não são efetivamente transparentes. E há muitas empresas (e pessoas) pouquíssimo ativas nas redes sociais que são profundamente transparentes. Além disso, ser extrovertido e falante não é pré-requisito para quem busca a transparência. Uma coisa não tem nada a ver com outra. Se você tem como valor a transparência, seja transparente. Mas não se sinta na obrigação de expor suas informações estratégicas, particulares e sensíveis para todos o tempo inteiro. Isso não é transparência (é falta de prudência).
Compreendido o conceito apresentado pelo consultor externo, o presidente da empresa saiu da sala e se reuniu com os colaboradores naquele mesmo dia. Confesso que não participei do novo encontro no meu cliente. Porém, fiquei sabendo depois o que rolou lá. Utilizando-se de um valor sagrado de sua instituição, o presidente explicou para os membros mais ansiosos (e xeretas) da sua equipe que aquela informação que eles tanto solicitavam não seria (re)transmitida. Ela era estratégica para o negócio e sensível para o trabalho da organização. Por isso, era classificada de confidencial pela diretoria.
E você, é um profissional transparente? Sua empresa é mesmo transparente? Pense um pouco antes de responder. Talvez as aparências (e o uso incorreto dos conceitos) enganem.
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Denise Debiasi é CEO da Bi2 Partners, reconhecida pela expertise e reputação de seus profissionais nas áreas de investigações globais e inteligência estratégica, governança e finanças corporativas, conformidade com leis nacionais e internacionais de combate à corrupção, antissuborno e antilavagem de dinheiro, arbitragem e suporte a litígios, entre outros serviços de primeira importância em mercados emergentes.