A corrupção no setor da saúde pode fazer a diferença entre a vida e a morte. Trata-se de um problema global, que ameaça um direito constitucional dos cidadãos, trazendo graves consequências ao acesso com equidade, eficiência e qualidade aos serviços de saúde.
Segundo estudos de inteligência anti-corrupção americanos, ao redor do globo, chegam a 500 bilhões de dólares anuais os gastos perdidos para a corrupção no setor da saúde, todos os anos. Também é estimado que mais de 140 mil crianças morram no mundo, anualmente, em decorrência de práticas ilícitas que deterioram a qualidade e diminuem a acessibilidade aos sistemas de saúde.
Imagine que nos 13 anos de governo do Partido dos Trabalhadores, a Lava Jato identificou R$ 6.4 bilhões pagos em propinas, isto significa R$ 1.4 milhões que deixaram de serem investidos ao dia no sistema de saúde brasileiro, já tão precário e carente de recursos. Quantas pessoas morreram ou deixaram de ser devidamente atendidas em função da corrupção identificada neste período?
Esses sistemas são particularmente suscetíveis à corrupção devido à grande complexidade de processos e volume de recursos, à natureza fragmentada de informações, agentes, prestadores de serviços, compradores e fornecedores do ramo. Some-se a isso, a globalização da cadeia de suprimentos, medicamentos e dispositivos médicos, bem como os processos pelos quais são aprovados, negociados e distribuídos nos países de origem e destino.
No Brasil, por exemplo, onde a corrupção sistêmica é profundamente enraizada, o direcionamento de maiores recursos para a área da saúde não se traduz na melhoria da assistência e do atendimento médico, laboratorial e hospitalar para os cidadãos, pois quanto maiores as verbas sem controle adequado, governança, fiscalização, transparência e rastreamento de recursos, maior é a incidência de práticas ilícitas e improbidades.
Ilegalidades que, na prática, acontecem em todas as esferas de relacionamento, envolvendo pacientes, médicos, funcionários do sistema de saúde público e privado, planos de saúde, fornecedores, prestadores de serviços e assim por diante. Todos contribuindo, em maior ou menor grau, para a deterioração dos sistemas coletivos de prestação dos serviços e para o aumento de custos no sistema, inviabilizando a ampliação de atendimento médico a um maior número de pessoas.
É duplamente cruel termos que acompanhar diariamente, a trágica curva de contágio e mortes pela Covid-19 e as notícias sobre a CPI que investiga o compromisso e a conduta das nossas lideranças quanto ao combate à pandemia. São suspeitas de favorecimento e desvios financeiros, de recursos, pagamentos de propina, omissão de responsabililidade por parte de gestores e tantos outros deveres constitucionais ignorados. Tudo isso, em um momento no qual vivenciamos uma situação de semi-calamidade pública, que já soma mais de 550 mil vidas perdidas em nosso país, além da crise econômica sem precedentes.
A falta de governança, integridade, ética e transparência na gestão da saúde agrava o problema da desigualdade e da injustiça social, já que, no Brasil, mais de 70% da população depende exclusivamente do SUS (Sistema ùnico de Sáude) para o acesso a leitos e UTIs, enquanto a taxa de recuperação da COVID-19 é 50% maior entre os pacientes hospitalizados no setor privado.
Portanto, o combate à corrupção na saúde é essencial para que possamos reagir com eficácia a ameaças futuras, oferecendo informações e acesso à prevenção e tratamento de doenças crônicas, contagiosas e de outra sorte.
Sem investimento em políticas públicas que promovam a garantia dos direitos constitucionais quanto ao bem estar e à saúde da população, e sem instrumentos efetivos de controle e fiscalização dos recursos públicos, todos nós, cidadãos de bem e direito, pagaremos o alto preço da corrupção desenfreada e escancarada na saúde, que pode chegar a patamares inestimáveis, como a perda de um ente querido ou da nossa própria vida.
Denise Debiasi é Country Manager e Líder de Investigações Globais e Inteligência Estratégica da BRG Brasil, braço local da consultoria americana Berkeley Research Group (BRG), presente em 5 continentes e mundialmente reconhecido pelo expertise e reputação de seus profissionais nas áreas de investigações globais e inteligência estratégica, governança e finanças corporativa, conformidade com leis nacionais e internacionais de combate à corrupção, antissuborno e antilavagem de dinheiro, arbitragem e suporte à litígios, entre outros serviços de importância primeira em mercados emergentes.
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