Caio Augusto Silva dos Santos (*)
Um dos alicerces da democracia brasileira consta no artigo 5º da Constituição Federal, que determina que todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza.
É sobre esta base que construímos o Estado Democrático de Direito, garantindo aos cidadãos a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Promovendo o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, a Carta Magna traça as diretrizes do país que almejamos alcançar.
Ciente da missão de guardiã da Lei Maior, a OAB trabalha cotidianamente para transformar em realidade as determinações contidas no texto constitucional. O dever de defender direitos e garantias fundamentais da cidadania é parte da essência da Ordem, que historicamente está ao lado da sociedade, desempenhando o importante papel de assegurar o respeito às leis. Diante desta tarefa, a OAB-SP encampa mudanças relevantes na sua política institucional, como a maior participação feminina e a especial atenção à questão racial. Dois pontos já postos em prática no primeiro ano da gestão 2019/2021.
Além de mais mulheres na estrutura, o Conselho Secional aumentou a representatividade das pessoas pretas e pardas, que contribuem com os debates e definição de rumos no âmbito da entidade, certificando que as mais diversas realidades da Advocacia paulista estejam contempladas em nossas decisões. Uma inserção que tende a aumentar nos próximos anos, graças ao trabalho de base realizado pelas Comissões que se dedicam à tarefa, trazendo profissionais da classe para dentro da Ordem, com efetiva participação por meio das mais de cem Comissões da casa, bem como das Audiências Públicas, abertas à sociedade, os seminários e debates, assim como atividades desenvolvidas tanto pela Secional quanto pelas Subseções.
Mais inclusiva, a OAB-SP passa por momento de mudanças evidentes, visando retratar a realidade nacional e a Advocacia paulista em toda a sua complexidade. Entre os passos empreendidos para alcançarmos a igualdade social está a consciência das profundas desigualdades que afetam a população negra no Brasil em comparação à população branca. Assim, a Ordem paulista dá espaço e franqueia o amplo debate em torno de proposições que busquem melhorias para todos.
Nesta edição, o nosso Jornal da Advocacia debruça-se sobre o tema, trazendo perspectivas, dados e informações para auxiliar a melhor compreensão das distorções históricas que acompanham parcela dos cidadãos e cidadãs na rotina da Nação. É fato que as pessoas pretas e pardas no país estão aquém da real representatividade política, social e econômica, se observarmos que correspondem a 55,8% da população, mas proporcionalmente não ocupam posições que equilibrem esse contingente, conforme demonstrado no estudo do IBGE sobre Desigualdades Sociais por Cor ou Raça, divulgado em novembro de 2019.
Há um longo caminho a percorrer para corrigir estas distorções e fazer com que a maior parcela da população brasileira alcance os espaços de decisão, participação política, acesso à saúde e educação, inserção no mercado de trabalho e efetiva segurança pública. Nesse contexto, a Advocacia se mantém vigilante e atenta para atuar em prol de maior equidade para a população preta e parda. A resolução desta problemática passa pela união das instituições públicas, da sociedade civil organizada e do setor privado em esforço conjunto principalmente por meio de políticas públicas.
Na citada pesquisa do IBGE, registrou-se avanço na área da educação, com pretos e pardos somando 50,3% dos alunos regularmente matriculados no ensino superior público. A notícia foi comemorada em larga escala pelas redes sociais, contudo, um olhar mais apurado sobre os mesmos dados revela outro lado desta realidade: 28,8% desses estudantes não chegarão à graduação, devido à alta evasão dos cursos. É aí que devemos voltar a concentrar os nossos esforços, afinal, não basta que pretos e pardos cheguem às universidades públicas, é necessário que concluam seus estudos. E, para isso, todas as esferas da vida em sociedade precisam avançar na mesma direção. A busca por uma sociedade mais harmônica e justa está no âmago da atuação da OAB-SP.
É preciso compreender que apenas assegurando igualdade de condições a todos — notadamente às pessoas que historicamente ocupam parcelas da comunidade constituídas por grupos discriminados e marginalizados de forma indevida pelo Estado e pela própria sociedade — poderemos construir uma nação mais justa e no caminho da paz social que queremos. Assim, abriremos espaço para uma vida efetivamente digna à totalidade dos importantes e indispensáveis grupos heterogêneos que dão origem a um verdadeiro Estado Constitucional Democrático de Direito.
(*) – É presidente da OAB São Paulo.