Gilson Alberto Novaes (*)
Não está fácil para o Presidente Bolsonaro colocar em prática uma de suas promessas de campanha: acabar com a “velha política” do “toma lá dá cá”!
O povo, em sua maioria, acreditou na promessa, apoiou, votou e agora espera que realmente ela possa ser cumprida. Não dá mais! No governo passado assistimos Brasília se transformar num verdadeiro balcão de negócios quando, para se livrar de duas acusações e ser investigado no STF, o então presidente Temer teve que “vender a alma” para os deputados. E pagou com dinheiro público. Uma vergonha!
Bolsonaro prometeu acabar com isso, mas não está fácil. O uso do cachimbo deixou a boca torta e os deputados continuam do mesmo jeito. Hoje não está explícito o “toma lá dá cá”, até porque os deputados já viram que essa política acabou na era bolsonarista, mas a verdade é que nos últimos dias azedou o relacionamento entre o governo e o Congresso.
No último dia 26, os líderes partidários resolveram desengavetar e colocar em votação uma proposta que estava parada desde 2015. Resultado em segunda votação: 453 votos a favor e 6 contra. Por mais que aliados do presidente digam que não foi uma derrota, foi sim! Embora ainda tenha que passar pelo Senado, engessar o orçamento é tudo que um administrador público não precisa. Com essa atitude o Congresso resolveu afirmar as suas atribuições, uma delas o orçamento, que no dizer do Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, “o Legislativo aprova e o governo executa”. É evidente que deve ser assim em qualquer democracia.
Fica claro também que ao desengavetar uma proposta de quatro anos atrás e que mexe com o “calcanhar de Aquiles” do Executivo, os deputados querem mandar o recado e mostrar “quem manda” no Legislativo, quer dizer, quem vai aprovar as reformas pretendidas, quando e como. Com a proposta aprovada de repente, o governo fica obrigado a cumprir todo o gasto de investimento, ficando a parte do custeio para o governo, deixando pouquíssima margem de manobra para remanejamentos, que até então eram realizados e são necessários.
A relação Executivo X Legislativo precisa melhorar. Urgentemente. Os deputados já perceberam que sem a reforma da Previdência o país não anda e agora a bola está com eles. Com uma reforma da Previdência razoável, o país teria condições de uma retomada de seu crescimento, com investimentos privados e um consequente aumento da arrecadação. O presidente está endurecendo o diálogo com os deputados e isso não é bom! Quem é do ramo sabe que sem diálogo não se tem êxito na vida pública. Ulysses Guimarães já dizia que “a saliva é o combustível do político”.
Convenhamos que o próprio Presidente não se ajuda. Experiente que é, deveria saber que uma coisa é o período eleitoral e outra é governar.
As falas e ações estabanadas de alguns poucos ministros tem “ajudado” a oposição. O Ministro da Economia Paulo Guedes não foi à CCJ para prestar esclarecimentos aos deputados sobre a reforma da Previdência e isso pegou mal também. Alegou que ainda não fora nomeado o relator da Comissão, como se isso fosse de sua alçada! Falta traquejo.
Os filhos do presidente, em que pese terem sido eleitos pelo povo, deveriam deixar o pai governar. Seus aliados do PSL não precisavam colocar as “laranjas” no caminho do presidente, a ponto de derrubar um ministro e deixar outro num total ostracismo. Fragilizou o governo. O uso das redes sociais pelo próprio Presidente tem ajudado pouco. Na CCJ, os deputados revoltados com a ausência de Guedes levantaram placas chamando Bolsonaro e Guedes de fujões. Uma outra placa dizia: “Vai debater reforma no Twitter?”, em clara alusão ao uso das redes sociais.
Mas não é difícil entender o presidente. Convicto de que quer acabar com a “velha política”, no que está corretíssimo, não se dispõe a dialogar com os deputados, achando que agora “é com eles”. Está errado. O projeto é do Executivo e quem vai aprovar são os deputados. Precisa conversar, usando o “combustível”. Seus articuladores políticos, por mais experientes que sejam, não têm conseguido avançar um milímetro nessa direção. As prisões do ex-presidente Temer e do ex-Ministro Moreira Franco atrapalharam o andamento da reforma da Previdência, por laços familiares.
Não há tempo para errar. A situação econômica do país não suporta mais uma nova recessão. Os empresários, muitos que acreditaram no novo governo, começam a dar mostras de desânimo. Afinal, são quase três meses, nos quais quase dois com os deputados na ativa, e a “velha política” parece que não foi embora. Falta um rumo para implantar a proposta do Ministro da Economia, já referendada pelos empresários, além de faltar rumos para outras áreas.
É certo que existem deputados que estão debutando nos cargos. Querem “mudar o mundo”, vislumbrados com o poder, mas possuem pouco traquejo para lidar com as raposas que ainda permaneceram. A faxina eleitoral foi grande, mas incompleta. Está passando da hora do Presidente estabelecer sua base confiável no Legislativo, constituindo uma articulação política com os parlamentares, sem os quais não teremos a reforma da Previdência. E sem ela o país não anda, o dólar vai disparar, os juros vão subir e a economia vai sucumbir.
A oposição começa a entrar em campo. Até agora essa tarefa esteve a cargo dos seus correligionários, dos filhos, de assessores dos filhos, de alguns ministros, e mesmo com algumas ações do próprio Presidente, que não se contém nas redes sociais. Sem tempo para errar e sem o “toma lá dá cá”, vamos assistir um jogo de braço. Que Deus dê sabedoria ao Presidente e aos deputados. O Brasil está esperando.
(*) – Professor de Direito Eleitoral no Curso de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie campus Campinas, onde é Diretor do Centro de Ciências e Tecnologia.