225 views 6 mins

Práticas abusivas na indústria de eventos pós-pandemia

em Artigos
segunda-feira, 08 de agosto de 2022

Bruno Boris (*)

Em período de pós-pandemia, é claramente perceptível o aumento dos eventos, após o forte impacto da Covid-19 nesse segmento.

Contudo, embora a retomada das atividades seja um bom sinal para a economia, não se pode esquecer de que as regras legais aplicadas estão vigentes e devem ser respeitadas pelos fornecedores. Surpreendentemente tomamos conhecimento de situações por canais de comunicação e até por pessoas próximas de problemas existentes no pós-pandemia, especialmente no segmento de festas, sejam elas de casamento, aniversário, etc.

Diversos prestadores de serviços procuram alterar as bases contratuais celebradas, muitas vezes antes da pandemia, poucos dias antes do evento ou até poucas horas a sua realização, numa prática claramente abusiva ao prevalecer-se sobre a fragilidade do consumidor naquele momento, a fim de obrigá-lo a contratar novos serviços ou arcar com custos adicionais que supostamente teriam surgido momentos antes do evento contratado.

Por exemplo, um serviço de bar contratado para uma festa de casamento com quantidade de público determinada há meses ou até anos, pratica conduta abusiva ao informar dias antes da celebração a necessidade de mais pontos de distribuição de bebidas, ou seja, a contratação adicional de profissionais, sob a justificativa de atender adequadamente o público, sob pena de não garantir a qualidade do atendimento.

Ora, é claro que o fornecedor ao ofertar o serviço já deve garantir condições mínimas de qualidade, caso contrário sequer poderia ofertá-lo, mas opta em fazer tal afirmação de não garantir o atendimento de qualidade como argumento de pressão para que os noivos sejam persuadidos a contratar esse adicional. Numa hipótese do casal assumir a não contratação de uma equipe adicional, certamente o fornecedor não assinaria um termo declarando que não se comprometeria com a qualidade do serviço.

E o mais incrível é que essa prática tem sido comum com grandes prestadores, felizmente não todos, aproveitando-se da situação, especialmente de casais que esperaram mais de dois anos para a realização da celebração. Além do fornecedor não poder afirmar a impossibilidade de garantir a qualidade do serviço se o pacote adicional não for contratado, o consumidor pode exigir a obrigação contratualmente firmada, sob pena de rescindir o contrato, bem como obter a devolução dos valores pagos, isso sem contar outros prejuízos que poderão ser apurados.

Logo, não basta contratar um bom fornecedor, que seja recomendado e reconhecido no mercado, é necessário analisar as cláusulas contratuais com atenção, especialmente a parte das obrigações do prestador, a fim de evitar contradições e alguma mudança brusca do contratado às vésperas da festa.

Não se nega a possibilidade de alterações no decorrer do contrato, seja por problemas com fornecedores dos prestadores, dificuldades observadas quando dada vistoria da locação do espaço etc., mas é incomum para prestadores com experiência em festas, como de casamento, a alteração de aspectos essenciais do contrato pouco antes da celebração.

Assim, ao prevalecer-se da fragilidade do consumidor neste momento e exigir vantagem econômica e manifestamente excessiva, caracteriza-se prática abusiva, podendo o consumidor reclamar nos órgão de proteção e defesa do consumidor, bem como pleitear uma indenização pelo prejuízo material causado pela alteração contratual, além do eventual prejuízo moral, pelo dano psicológico em ter que alterar as bases contratuais e arcar com um custo adicional repentinamente e sem justo motivo.

E aos prestadores, estes devem cumprir as regras do Código de Defesa do Consumidor e sempre que houver a necessidade de alteração contratual, situação plenamente possível, nada veda a tratativa com seu cliente numa possibilidade de adaptação contratual, porém, após celebrado o contrato, um eventual erro do fornecedor não pode gerar ônus ao consumidor.

O consumidor contrata prestadores de serviços na certeza de que tais profissionais são conhecedores do mercado e especialistas em prever uma boa e adequada celebração. Alguns consumidores contratam até assessores, para que o evento seja devidamente organizado e não surjam problemas como os narrados, mas a responsabilidade dos organizadores de festas é outro tema que ainda será abordado.

(*) – É professor de Direito do Consumidor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Campinas.