Dirceu Rodrigues Alves (*)
Estamos longe de encontrarmos soluções para redução dos acidentes nas rodovias do País, que causam mortes, sequelas, perdas patrimoniais e deixam famílias no desalento e desprotegidas. O prejuízo social, material e financeiro é grande!
Não podemos pensar que o motorista, ao assumir a direção de seu veículo, está a passeio; que sentado, vendo paisagens diferentes, está fazendo higiene mental e, por esta razão, pode tolerar até 13 horas consecutivas de jornada de trabalho. Mais ainda, que pode continuar transitando pelas rodovias até que encontre um local seguro para seu repouso. A lei 13.103 e a Portaria 116 do MTPS que vieram para diminuir jornadas, reduzir acidentes e dar melhor qualidade de vida no trabalho de nada serviu. Atende apenas e tão somente aos interesses do empresariado.
Não podemos ignorar que a cada 4 horas na direção veicular o homem tem lapsos de atenção; que com 8 horas tem déficit de atenção; e que acima disso o risco de acidente aumenta em duas vezes. Ignora-se, no entanto, que a vibração de corpo, o ruído uniforme e contínuo, o movimento pendular do tronco e da cabeça, as imagens que passam no seu campo visual durante toda a jornada são fatores indutores da fadiga e do sono. Fora isso, deve-se incorporar aos distúrbios do sono, principalmente da privação do sono – comum entre os caminhoneiros – os fatores decorrentes do repouso em locais inadequados, como dentro da boleia, por exemplo, contrariando o que é recomendado pela higiene do sono.
Não se pode permitir que um trabalhador submetido à agressão física, caracterizada pela vibração e o ruído já citados, a variações térmicas e climáticas, a risco químico em decorrência de exposição a gases, vapores, poeiras, fuligem além dos produtos químicos que possa estar transportando, não tenha limite restrito a tal exposição. Não se pode entender que submetido a tantos agentes agressivos e nocivos ele possa ser visto e percebido pelos legisladores como um trabalhador comum. Não, ele não o é.
O Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) não pode estar ausente e tão pouco furtar-se a criticar a Lei 13.103 e a Portaria 116 do MTPS sancionada sem ouvir Conselho Federal de Medicina, associações médicas, toxicologia, farmacologia, Ministério da Saúde e outras especialidades por ser uma lei avessa às necessidades da classe trabalhadora. Este trabalho é para todos nós, que estudamos, pesquisamos e temos nossa atenção voltada para a máquina, o homem e o meio, é de extrema penosidade e acreditamos que deve haver uma revisão desta matéria com objetivo maior de reduzir os custos para o país, mitigar o número de óbitos que todos os dias estão em nossas manchetes e que é o principal fator da nossa luta pela vida.
As causas primordiais de acidentes em nossas rodovias são fadiga 18% e sono 42% perfazendo uma estatística alarmante de 60% de todos os nossos acidentes. Vale a pena lembrar que 93% dos acidentes acontecem por falha humana. Costumamos dizer que hoje, em todo acidente rodoviário que tem um motorista profissional envolvido, o motivo principal é o excesso de jornada de trabalho. É este o motivo pelo qual nossos caminhoneiros evoluem para as drogas.
O exame toxicológico, da forma como foi proposto, é uma afronta ao trabalhador, é achincalho discriminatório e humilhante. Lembro que o exame é de larga janela, janela essa que tem noventa dias. A lei recomenda a realização no momento da concessão da CNH e a repetição cinco anos após. Não há lógica. O usuário de álcool e droga não são vistos pela lei da mesma forma. O usuário do álcool é um dependente químico, não pode ser mandado embora, necessita tratamento. Já o dependente da droga não é considerado doente neste caso, podendo ser mandado embora do trabalho por causa da sua dependência. As leis conflitam!
As drogas na direção veicular precisam ser combatidas diariamente. É necessário entendimento e compreensão de todos, para não gerarmos o sacrifício físico, social, financeiro, além da crucificação do nosso caminhoneiro.
(*) – É médico, Diretor de Comunicação e do Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego.