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Imposto de Renda vai ser ajustado na primeira faixa, mas não será de graça

em Artigos
terça-feira, 29 de agosto de 2023

Murillo Torelli (*)

No dia 24 de agosto, o Senado Federal aprovou, por meio de votação simbólica, uma Medida Provisória (MP) que traz mudanças ao cenário tributário do país. Além de estabelecer uma política de valorização do salário, a MP também faz pequenas modificações na faixa de alíquota zero do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), criando a necessidade do governo em incluir uma nova taxação.

A medida traz como destaque o aumento da faixa de isenção do IRPF. O valor passa de R$ 1.903,98 para R$ 2.112,00, sempre com a justificativa de beneficiar os brasileiros de menor renda. Além disso, uma regra específica foi introduzida: aqueles que optarem pela declaração simplificada e possuírem rendimentos de até R$ 2,6 mil ficarão isentos do pagamento do imposto.

Essa medida visa beneficiar cerca de 13 milhões de brasileiros, que são aqueles que compõem uma parcela dos 41,5 milhões de pessoas que fazem a declaração do IRPF (nos dados do governo). A intenção é direcionar a ajuda aos estratos mais vulneráveis da população, proporcionando um alívio financeiro, mas é estranho o fato de que só a primeira faixa da tabela do IRPF foi corrigida.

No entanto, como qualquer ajuste fiscal, essa medida não é isenta de contrapartidas. Para compensar a diminuição na arrecadação resultante da isenção do IRPF, o governo editou uma MP que prevê a taxação dos fundos exclusivos compostos por um único participante. Esses fundos passarão a sofrer a incidência do “come-cotas” semestral, uma forma de tributação já presente em outras modalidades de investimento para aqueles com patrimônio inferior.

Essa proposta, considerada justa pelo governo diante das cobranças de impostos em outras áreas de investimento, tem como objetivo recuperar os cofres públicos. Espera-se que o governo arrecade mais de R$ 3 bilhões ainda neste ano, R$ 10 bilhões em 2024 e, a partir de 2025, um montante pouco superior a R$ 4 bilhões anuais. A previsão de arrecadação, alardeada pelo governo, é otimista, mas parece ignorar os impactos reais que essas mudanças trarão ao cenário dos investimentos.

A opção será dada aos investidores: pagar o IR a uma alíquota de 10%, distribuída em cinco parcelas de dezembro a maio, ou optar por uma alíquota de 15% pelo período de até dois anos, já a partir de maio de 2024. Essa regra de transição busca acomodar os investidores nesse novo cenário fiscal. A introdução da incidência do “come-cotas” semestral em fundos exclusivos é um lembrete de que o governo está mais interessado em tapar buracos financeiros do que em criar um ambiente estável e favorável aos investidores.

Além disso, visando a eficiência (aumento) na arrecadação, a Fazenda adiantou a possível taxação dos fundos offshore para um projeto de lei que deverá sair em 2024, mas não vai parar por aí, pois o governo que gasta muito precisa arrecadar muito.

É inegável a necessidade de reajustar a tabela do IRPF no Brasil. A ausência de atualização ao longo dos anos resultou em uma tributação desproporcional sobre os cidadãos, especialmente aos que possuem renda mais baixa e média. Esse reajuste é crucial para garantir uma distribuição mais equitativa da carga tributária, aliviando a pressão financeira sobre os contribuintes e proporcionando um maior poder de compra. Contudo, o governo não pode focar apenas nesse aspecto. Para atingir uma abordagem fiscal mais equilibrada e sustentável, é imperativo que se considere também a eficiência do Estado como um todo.

A máquina estatal padece de inchaço, excesso de burocracia e desperdício de recursos, o que acaba impactando negativamente as finanças públicas e, consequentemente, a capacidade do governo de prover serviços essenciais à população. Portanto, uma abordagem equilibrada requer a revisão e o aprimoramento das estruturas governamentais, eliminando redundâncias, simplificando processos e promovendo a transparência na alocação de recursos. Essa otimização não apenas evita a necessidade de aumentar ainda mais os tributos para os cidadãos, mas também cria um ambiente propício ao crescimento econômico, atraindo investimentos e impulsionando a produtividade.

(*) É professor de Contabilidade Financeira e Tributária no Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).