João Guilherme Sabino Ometto (*)
Neste Dia do Trabalho, 1º de maio, é importante refletir sobre a Lei de Cotas, que estabelece o provimento, por pessoas reabilitadas ou portadoras de necessidades especiais, de 2% a 5% das vagas do quadro de pessoal de empresas com mais de 100 funcionários.
Essa norma histórica de nosso marco legal possibilita a inclusão socioeconômica de trabalhadores competentes e capazes de contribuir de maneira expressiva para os bons resultados de centenas de organizações.
É preciso, contudo, entender as cotas como algo não assistencialista ou meramente uma concessão de cunho social e humanitário.
Muito longe dessa visão menor, a reserva de vagas rompeu paradigmas ultrapassados, ajudou a diminuir o preconceito e possibilitou que numerosos profissionais ingressassem no mercado de trabalho e demonstrassem toda a sua capacidade técnica e intelectual. Por isso, transcorridos 26 anos desde a promulgação da Lei 8.213, é pertinente que façamos uma reflexão sobre seus efeitos na sociedade brasileira.
Acredito muito nas normas que, além de cumprirem seu papel específico de instituir novas práticas, promovem, ao longo do tempo, mudanças culturais positivas no âmbito da sociedade. Nesse sentido, há bons exemplos em nosso país, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, o do Idoso e todo o arcabouço de leis, ratificado e aperfeiçoado na Constituição de 1988, que estabeleceu a igualdade de gêneros e de direitos e deveres entre todos os cidadãos. Incluo nessa relação a Lei Brasileira de Inclusão (Lei Federal 13.146, de 06 de julho de 2015) e a Lei de Cotas para os trabalhadores reabilitados ou portadores de necessidades especiais.
É importante que aprofundemos, no contexto das empresas, as mudanças e os efeitos positivos que essa legislação nos propicia, entendendo, de modo amplo, que ela estabelece cotas, mas não impõe qualquer limite à contratação de pessoas portadoras de necessidades especiais. Isso significa que esses brasileiros podem e devem ingressar em qualquer empresa, e não apenas nas que têm mais de 100 colaboradores, muito além da imposição legal, mas principalmente por seu talento e capacidade.
Cumprir leis é importante. Fazer justiça ao mérito profissional transcende em muito à atitude de acatar a legislação! No primeiro caso, estamos respeitando um dever institucional; no segundo, estamos sendo coerentes e, mais do que isso, gestores responsáveis, que desejam contar com os melhores profissionais em cada função. Porém, para que o processo de inclusão ocorra de maneira efetiva e perene, um longo caminho há de ser trilhado, passando obrigatoriamente pela qualificação profissional. Não basta buscar no mercado profissionais portadores de necessidades especiais com o currículo almejado pelos setores de recursos humanos.
É necessário, muitas vezes, abrir a primeira porta para que saiam de uma realidade de total exclusão social e laboral. Nesse sentido, são muitas as possibilidades das quais as empresas podem valer-se. O Senai-SP, como entidade que forma mão de obra para a indústria paulista, atua sob uma perspectiva educacional inclusiva e tem apoiado as empresas nas demandas voltadas à formação profissional de pessoas portadoras de necessidades especiais, bem como no mapeamento dos postos de trabalho para inclusão e na sensibilização de equipes, dentre outros serviços.
Acredito que a disseminação desse conceito de inclusão produtiva, buscando-se profissionais que realmente agreguem valor às organizações, seja o próximo e importante passo para consolidarmos o caráter transformador da Lei 8.213, convertendo-a num efetivo divisor de águas entre o paternalismo e o reconhecimento efetivo da eficiência profissional de milhares de brasileiros, por parte da sociedade e do universo corporativo.
Independentemente de sua condição física, merecem oportunidades os indivíduos preparados, focados, responsáveis, dedicados e capazes em suas profissões ou na execução de tarefas específicas. Tais virtudes, com certeza, estão muito acima do marco legal!
(*) – Engenheiro (Escola de Engenharia de São Carlos – EESC/USP), é presidente do Conselho de Administração do Grupo São Martinho, vice-presidente da FIESP e Membro da Academia Nacional de Agricultura (ANA).