Fernando Silva (*)
Medidas restritivas necessárias para conter a disseminação do coronavírus afetaram regiões centrais de cadeias de suprimentos globais e impactaram profundamente a logística mundial.
Organizações – umas com mais e outras com menos sucesso – precisaram se mobilizar rapidamente para cumprir obrigações contratuais e manter a produção e a distribuição de produtos. Para se ter uma ideia, 94% das 1.000 maiores empresas dos EUA, classificadas por receita pela revista de negócios Fortune, tiveram ao menos um fornecedor de primeira ou segunda categoria afetado pelo vírus.
Em meio a falta de perspectivas sobre um fim da pandemia, estar atento às principais tendências e tecnologias em supply chain é fundamental para a sobrevivência das empresas. Uma análise da consultoria e auditoria global PwC identificou que, para assegurar as operações e a distribuição no curto prazo, estoques foram transportados para áreas que não estavam em quarentena.
Produtos foram redesenhados, o transporte aéreo se tornou a alternativa mais rápida para garantir entregas e o relacionamento com os clientes teve de ser estreitado – seja para ganhar a confiança de que a capacidade e o estado de entrega seriam mantidos ou para negociar novos prazos. Obteve mais sucesso nessa reorganização uma pequena minoria das empresas, que havia investido em mapeamento de rede de suprimentos antes da pandemia.
Hoje, é fundamental entender quais tendências se desenham na logística no pós-pandemia e que as ações futuras estão condicionadas à adoção de medidas de mitigação de riscos no curto prazo. Se antes o mais importante era obter insumos pelo custo mais baixo, agora, por questão de segurança, as empresas começam a olhar para produções em regiões mais próximas.
Não significa, no entanto, a interrupção do processo de globalização e de integração das cadeias de suprimentos. Mas, sim, uma desaceleração, que inclusive já estava em curso. Dados do Banco Mundial mostram que o índice de participação das cadeias globais de valor no comércio internacional é de cerca de 50% do comércio mundial, mas isso não muda desde a crise financeira de 2008, o que demonstra uma tendência para esta distribuição de fornecedores.
A diversificação do local de produção também é tendência – uma espécie de resposta à desaceleração da globalização da cadeia de suprimentos e também uma forma de reduzir a dependência exclusiva de um país ou fornecedor. A ideia de fundo desta tendência, assim como da primeira, é dividir grandes cadeias de suprimentos em estruturas menores e mais ágeis, que se adaptam melhor a cenários mais complexos. A principal fornecedora da Apple, por exemplo – a Foxconn, localizada na China, iniciou atividades na Índia no começo de abril.
As organizações também precisam entender onde elas têm problemas. Ter boa visibilidade das estruturas da cadeia logística ajudou a minimizar a correria quando a pandemia estourou. É um mapeamento que igualmente vai ajudar depois. A tarefa não é das mais simples: chegar a fornecedores de nível 2 ou 3 tem seus desafios e fatores como custos, tempo e trabalho acabam tornando o processo inviável.
Thomas Y. Choi e Dale Rogers, dois professores de uma das maiores escolas de negócios dos EUA, vinculada à Universidade do Estado do Arizona, sugerem a criação de uma cláusula no contrato de fornecimento que leve o fornecedor a contribuir com esse mapeamento. Para isso, contar com a ajuda dos fornecedores é fundamental. O que leva a uma quarta tendência em logística no pós-pandemia: mais colaboração com os fornecedores.
Quando a organização tem visibilidade de suas cadeias de suprimentos, criam-se as condições para essa parceria. Com ela estabelecida, todo o ecossistema de suprimento será reforçado, facilitando o gerenciamento em momentos de expansão e maior resiliência em momentos de crise. Sobretudo, a pandemia acelerou conversas e decisões sobre automação, digitalização e informatização das operações que, muito provavelmente, ainda perdurariam anos.
As empresas vão precisar ser cada vez mais capitaneadas por profissionais e processos de automação e tecnologia que ajudem nesse cotidiano mais desafiador, onde há menos previsibilidade para planejar e maior necessidade de agir rapidamente. O que remete à necessidade de digitalização da cadeia logística. Bo Zhou, CEO da multinacional chinesa FuturMaster, acredita que muitos problemas foram agravados em seu país porque as empresas não possuíam tecnologia para suportar simulações.
Logo, elas não conseguiam antecipar a demanda e a oferta observando vários cenários. Algo que pode ser resolvido com inteligência artificial e machine learning. Duas tecnologias capazes de predizer riscos e oportunidades com base em dados geográficos, macroeconômicos e políticos. Por isso, colocar nas mãos dos gestores de logística tecnologias que gerem inteligência será valioso no pós-pandemia.
(*) – É executivo de Operações e Negócios da Supero Tecnologia (www.supero.com.br).