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Ativos alternativos e a teoria do mais tolo

em Artigos
terça-feira, 19 de julho de 2022

João Teodoro (*)

Entre os jogadores de pôquer (eu não sou) há um jargão que diz: “se você participa de uma rodada e não sabe quem é o burro da mesa, levante-se e saia, porque o burro é você”.

Como no pôquer, segundo os especialistas, no jogo do mercado de ativos financeiros, os ganhos são assimétricos. Poucos jogadores lucram generosamente; os demais suportam as perdas. É a crença na teoria do mais tolo, amplamente corrente nas bolsas de valores. O objetivo deste artigo é provocar reflexão sobre o uso de criptomoedas para aquisição imobiliária.

A teoria acima citada, por óbvio, não é oficial. Não há quem a subscreva. Mas é reflexo da realidade. Segundo ela, é possível comprar-se um ativo supervalorizado porque sempre haverá alguém mais tolo disposto a pagar mais por ele. Quase sempre é verdade. O problema aparece quando não se consegue encontrar quem o compre antes que o preço caia.

Ou seja, não há ninguém mais tolo que o comprador. Se alguém tem algum ativo e não encontra quem o compre, o prejuízo está garantido, alerta a professora Vicki Bogan, da Universidade Cornell, NY, USA. Ativos supervalorizados evidenciam bolhas financeiras, conhecidas como “explosões de irracionalidade”.

A primeira grande bolha especulativa da história mundial ficou conhecida como “mania das tulipas”, na Holanda do século 17, onde houve euforia coletiva para compra de tulipas exóticas. Os bulbos dessas flores atingiram preços tão elevados que muitos venderam até seus imóveis residenciais para comprá-los.

Criou-se até um mercado futuro de bulbos não colhidos. A escalada dos preços chegou ao fim, em 1637. O preço despencou, e a economia holandesa foi ao caos.
Outros exemplos se seguiram, como o crash da bolsa de valores de Nova York, em 1929, e a mais recente, de todos nós conhecida: a crise financeira mundial de 2008.

Nesta, os imóveis, nos EUA, eram refinanciados duas ou mais vezes sucessivas, sempre por valor maior que o anterior, que cobria a dívida do mutuário e ainda lhe sobrava algum dinheiro. O crédito era cedido com base em “avaliações” irreais. As prestações, óbvio, eram cada vez maiores. Os últimos tolos, sem ter a quem repassar os imóveis cujas prestações não podiam pagar, os devolviam ao banco. A quebradeira foi geral!

Pois bem! As primeiras moedas na história mundial eram metálicas e valiam de acordo com o seu peso, mas traziam intrínsecas dificuldades, como a portabilidade e a divisibilidade. A solução foi a transformação da moeda em papel lastreada em ouro. Esse modelo prevaleceu até os anos 1970. No entanto, Charles de Gaulle, presidente francês, requisitou a troca dos dólares em poder da França por ouro dos cofres americanos, causando grande crise nos EUA naqueles anos.

Foi então que o presidente Nixon/EUA, em 1971, decidiu descartar o padrão ouro como garantia do dólar. As atuais moedas têm seu lastro na riqueza de cada país. A emissão de moedas sem a equivalente produção de riquezas somente causa inflação. Satoshi Nakamoto, considerando o resgate aos bancos falidos em 2008, nos EUA, que desvalorizou a moeda americana, decidiu, com base na tecnologia Blockchain, criar a primeira moeda digital criptografada do mundo, “à prova de inflação”, a Bitcoin.

Entretanto a “infalível” moeda virtual desvalorizou-se em mais de 50%, em 2022. Outra moeda, a Ethereum, caiu 69%. Não foram encontrados mais tolos para comprá-las!

(*) – Graduado em Direito e Ciências Matemáticas, é empresário no mercado da construção civil em Curitiba e presidente do Sistema Cofeci-Creci.