Mario Bernardini (*)
Os números do IBGE confirmam, com algum atraso, a recessão brasileira.
Na realidade, a velocidade com que a atividade está despencando faz com que os dados de dois meses atrás, relativos ao desempenho da economia e do emprego, já estejam velhos e não espelhem corretamente a atual realidade. A indústria de transformação que mantem o papel de puxar a produtividade e de transferi-la, junto com os ganhos tecnológicos, para toda a economia, está reduzida a menos de 10% do PIB, de um PIB que, segundo um consenso crescente, vai cair nada menos do que 2% e o investimento, que, normalmente é a primeira vítima de qualquer crise, deve despencar cerca de 10%.
Neste cenário, o ajuste fiscal proposto é mais um elemento a agravar a recessão sem a mínima garantia que o sacrifício imposto à quem trabalha e quem produz, que são aqueles que vão pagar a conta, possa ao menos sinalizar uma retomada do crescimento, com geração de emprego e renda, como recompensa futura. Tal como o ditado popular, quando diz que “não há mal que sempre dure..”, é claro, que antes ou depois, vai haver uma retomada. Ela acabaria ocorrendo, com ou sem ajuste, mas o crescimento do PIB muito provavelmente será insignificante, visto que os problemas de fundo não estão sendo sequer enfrentados e, muito menos, resolvidos.
Não tem, portanto, a menor consistência econômica, a insistência do Banco Central em continuar a subir juros quando a demanda está claramente em queda, não somente na indústria, mas também nos serviços, como mostram os últimos dados disponíveis. Querer a convergência da inflação à meta em 2016 é um ato de vontade que vai custar caro ao país. Esta demanda fraca, confirmada inclusive pela forte queda nas importações, vai acrescentar, ainda este ano, dois a três milhões de desempregados adicionais a nosso atual desemprego e esta recessão, envergonhadamente desejada por nossas autoridades econômicas, irá, antes ou depois, inevitavelmente, levar a inflação à meta.
Assim, ao contrário do desejo do “mercado”, agora é necessário afrouxar a política monetária com uma consistente redução da SELIC, concomitante com um aumento programado do ajuste fiscal feito em cima de redução de despesas a serem obtidas de forma permanente e com a melhoria contínua da eficiência na gestão da “res publica”. Neste aprofundamento do ajuste fiscal o governo tem que atacar as causas do problema, ou seja, do excesso de gastos, negociando com a sociedade de forma transparente os cortes a serem feitos e oferecendo em troca uma absoluta austeridade nos gastos de custeio junto com um programa de acompanhamento destes gastos de modo a eliminar desperdícios e otimizar sua eficácia.
A sociedade tem que saber e, na medida do possível, concordar com este sacrifício, que está apenas começando e que ainda irá aumentar antes de melhorar e que, a fase de “sangue, suor e lagrimas” que está sendo imposta ao povo brasileiro, será seguido, num arco relativamente breve de tempo, por uma retomada do crescimento sustentado com distribuição de renda, se este ajuste estrutural for feito. A conjuntura atual, com o elevado custo que vai cobrar de quem trabalha e quem produz, não pode, portanto, ser desperdiçada com meias medidas que vão apenas adiar os problemas até a próxima crise mas, ao contrário, tem que ser aproveitada para arrumar o mais possível o país tanto em termos institucionais como econômicos.
Já demoramos muito no enfrentamento dos problemas que impedem o crescimento do Brasil há mais de três décadas. Nos poucos anos nos quais crescemos, neste período, não foi por méritos próprios, mas sim puxados por circunstâncias externas. Tanto nosso arcabouço institucional quanto o econômico tem que ser revistos se quisermos deixar de ser apenas o país de um futuro que nunca chega. A reforma política tem que resolver, além do excesso de legendas e de partidos de aluguel, o financiamento das campanhas e, principalmente, evitar que interesses privados se apropriem do estado.
Ao mesmo tempo é necessário estabelecer regras claras que simplifiquem as relações públicas-privadas, reduzam os custos de transação e a excessiva judicialização, inclusive nas relações capital-trabalho onde o negociado tem que prevalecer sobre o legislado. No campo macroeconômico, o Brasil tem que desmontar a indexação existente, limitar os gastos públicos de modo a crescerem abaixo do PIB, tirar o câmbio do Banco Central, que, por sua vez, deve criar uma taxa de curto prazo neutra ou negativa para remunerar o capital ocioso e promover maior concorrência no setor financeiro para trazer os juros de mercado a patamares compatíveis com a inflação.
Ainda nesta área, além da simplificação da estrutura tributária que redistribua de forma mais equilibrada tanto receita quanto encargos, desonere exportações e investimentos, o país tem que dar sustentabilidade, a longo prazo, às contas da previdência levando em conta a mudança na estrutura etária da população, e aproveitar a diminuição prevista da população em idade escolar, o que vai demandar menos estrutura física, para investir basicamente na qualidade da educação.
No espaço deste artigo não dá para elencar todos os nossos problemas, mas é fundamental eliminar as causas que tornaram o Brasil um país muito caro para se produzir, complicado para se trabalhar, inseguro para se viver e que sacrifica a esperança de seus jovens no futuro ao não oferecer oportunidades iguais para todos.
(*) – É engenheiro e diretor de competitividade do Departamento de Economia e Estatística da ABIMAQ – Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos.