Renata Domingues Balbino Munhoz Soares (*)
Para Hanayrá Negreiros, pesquisadora de moda e colunista da Elle Brasil, as roupas são como dispositivo de memória, história e cultura.
As vestimentas carregam narrativas, sejam elas religiosas, políticas, culturais. A roupa conta uma história, seja de quem a faz, seja de quem a usa. Os consumidores procuram uma identidade e compram valores simbólicos. Hoje, a moda passou a ser um consumo de objetos com valores por trás da roupa, um produto cultural, criativo e manufatureiro.
No entanto, já foi historicamente palco de muitas proibições, como a proibição de usar calças para mulheres (proibições em razão do sexo) ou de proibições políticas, quando, por exemplo, as forças de ocupação britânicas proibiram os escoceses de usar kilts. A partir de 1800, a produção e o consumo em massa cresceram e estes adquiriram gradualmente um caráter simbólico estável.
A famosa “túnica Mao”, abotoada até a gola, com versões mais atuais estreladas por personagens do filme 007, foi usada, em 1949, por Mao-Tsé-Tung, ao proclamar a República Popular da China, para projetar uma China moderna. Para a museólogo britânica Amy Barnes, o significado dessa túnica representava: “eu rejeito a burguesia e o padrão ocidental de beleza e moda; estou transmitindo uma mensagem de uniformidade e conformidade”.
Quanto mais bolsos existissem na túnica, mais status. O tecido também indicava poder, do mais simples (cinza e áspero), ao mais caro (trajes de lã). Na década de 1990, Galliano ressignificou o traje para Dior, usando seda verde e cetim vermelho; e Vivienne Westwood o tornou mais sexy.
A indumentária conta também a história de quem a confecciona. Em 2015, um projeto em Milão, Itália, capacitou refugiados que trabalhavam com costura em seus países de origem (Afeganistão, Irã, Somália, Gâmbia e Senegal) para tornarem-se alfaiates de grifes famosas na capital italiana da moda.
No Brasil, durante o período de pandemia do novo coronavírus, em grave violação de direitos humanos, imigrantes bolivianos e paraguaios, em São Paulo, recebiam R$ 0,05 centavos para confeccionar máscaras para intermediários.
De forma singela e poética, Carla Cristina Garcia define um sentido à cor lilás, como “a cor do feminismo, em honra às 129 mulheres mortas dentro de uma tecelagem norte-americana em 8 de março de 1857, cujo incêndio fora provocado pelo dono da fábrica após a greve realizada pelas funcionárias, que reivindicavam melhores condições de trabalho.
A história conta que os tecidos em que as vítimas estavam trabalhando neste dia eram da cor lilás, sendo esta data considerada, atualmente, o Dia Internacional da Mulher”. Assim, as diferentes dimensões da moda não estão no ponto de chegada, nem na reta final, mas sim em ascendente ressignificação.
(*) – Doutora em Direito Econômico pela Mackenzie, especialista em Fashion Law pelo Milano Fashion Institute, é advogada, professora e coordenadora acadêmica do e-LLM em Fashion Law Mackenzie.