Allan Augusto Gallo Antonio (*)
Contrariamente ao que algumas pessoas podem pensar, a política existe desde o momento em que os seres humanos se depararam pela primeira vez com o desafio da escassez. Na percepção de que possuíam crenças e preferências distintas, tornou-se imperativo resolver essas diferenças enquanto geriam a alocação de recursos escassos.
Dessa forma, a política continuará a ser uma realidade enquanto essas condições humanas persistirem, ou seja, indefinidamente. Nesse contexto, podemos dizer que a política é intrínseca à natureza humana. No século XIX, Carl von Clausewitz, general do Reino da Prússia e renomado estrategista militar, famoso por sua obra “Vom Kriege” (Da Guerra), formalizou o conceito de que “a guerra não é mais que a continuação da política por outros meios”.
Mais de um século depois, Harold Lasswell, considerado um dos fundadores da psicologia política, complementou a definição de Clausewitz ao afirmar que a política é o processo pelo qual se define: “Quem ganha o que, quando, como”. Ambas as definições são importantes para compreender por que é necessário encarar a política com seriedade em uma sociedade tão diversa quanto a brasileira.
Desde a fundação do Brasil enquanto Estado, a sátira e o escárnio sempre estiveram presentes na atividade política – observados nos debates parlamentares do tempo imperial e no grande número de caricaturas veiculadas nos jornais da época. Esse elemento, embora natural das democracias saudáveis, atingiu níveis inimagináveis ao longo das últimas décadas.
Isso pode ser facilmente verificado pelos rocambolescos debates eleitorais televisionados e, mais recentemente, pela proliferação de memes e piadas propagadas até mesmo nos perfis das redes sociais de altos dignitários do Estado brasileiro, independentemente do espectro político.
Uma rápida olhada nos comentários dessas mesmas postagens inusitadas também evidencia a disposição figadal de uma parcela considerável da população em encarar as realizações e fracassos dos governos da mesma forma que encaram uma partida de futebol ou a participação de famosos em reality shows.
Os dados e o impacto das decisões políticas e econômicas são deixados de lado, e uma polarização vazia cresce à medida que tudo é discutido por uma ótica eminentemente personalista.
Esse fenômeno não é positivo, pois deixa de lado o fato de que, em última análise, a política é uma alternativa à guerra, principalmente em uma sociedade com grupos de interesses diversos e muitas vezes conflitantes. Além disso, as ações políticas têm implicações diretas na qualidade de vida das pessoas.
Ninguém em perfeito juízo encara decisões envolvendo o próprio orçamento doméstico de forma displicente. Da mesma forma, em uma conversa civilizada entre indivíduos com preferências e valores diametralmente opostos, mas dispostos a chegar a um consenso mínimo para cooperação, a chacota e o escárnio pouco colaboram para a criação de soluções viáveis.
O Brasil enfrenta vários desafios institucionais, muitos dos quais possuem uma solução que passa, invariavelmente, pela maturidade não apenas dos que ocupam postos de decisão, mas também pela seriedade com que os membros da sociedade encaram ações que impactam a vida de todos. Mais do que nunca, é preciso desfulanizar a política e despersonalizar o debate.
(*) – É professor de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie e Pesquisador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica.