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A desvalorização da ação trabalhista e a fragilidade de recebimento

em Artigos
sexta-feira, 23 de julho de 2021

Rodrigo Valverde (*)

Processos judiciais levam tempo para serem finalizados.

Têm início com o ajuizamento da ação, passam por audiência, sentença dada pelo juiz, incluindo até mesmo os longos e intermináveis recursos. Por fim, chega a fase de execução, onde após a apresentação e homologação dos cálculos dos valores envolvidos, o autor espera finalmente receber o que lhe é de direito.

Agora imagine o seguinte: quando você, autor do processo, iniciou sua ação trabalhista, ela envolvia um determinado valor monetário a receber. Daqui a possivelmente seis anos, se tudo correr bem, sem instabilidades da justiça, sem falência da empresa processada, o valor que lhe é devido deveria conferir a você o mesmo poder de compra à época em que sua ação iniciou.

Por que é importante pensar nisso? Porque após esses anos em que seu processo tramitará na justiça, o arroz pode ficar mais caro, o aluguel aumentar, o convênio médico sofrer reajustes, uma série de itens de consumo sofrerão alterações de preço, a famosa “inflação”. Portanto, para manter o seu real valor, o crédito judicial precisa ser reajustado.

Acontece que, especialmente falando da correção monetária em processos trabalhistas, há alguns anos iniciou-se uma discussão sobre a validade e a coerência do índice até então utilizado, que há tempos deixou de acompanhar a variação da inflação.

Foi em 18 de dezembro de 2020, em importante – e polêmico – voto, o ministro Gilmar Mendes declarou ser inconstitucional a aplicação da TR-D para correção de débitos monetários trabalhistas. Esse cenário traz um ponto de alerta! A fragilização do comprometimento da empresa em saldar sua dívida trabalhista se a ela ocorrer esses dois tipos de pensamentos.

Já que não haverá mais os juros de mora (o que significaria o aumento da dívida em cerca de 12,7% ao ano, além do reajuste), por que então usar um recurso para saldar uma dívida reajustada a 2,75% ao ano se (i) a empresa pode aplicar esse mesmo recurso em investimentos com rendimento superior a isso, ou (ii) se ela pode direcioná-lo à sua operação, sem precisar recorrer a empréstimos – que possuem altas taxas de juros?

Essa decisão poderá, assim, desincentivar o compromisso das empresas em honrar seus débitos trabalhistas. Iniciar uma ação judicial junto com todo seu desgaste, tempo e burocracia não é algo que sonhamos fazer todos os dias. Se as coisas chegam a esse ponto, é realmente porque, aos olhos da lei, existe o descumprimento de leis trabalhistas.

Então, além de ressarci-lo pelo dano sofrido, a empresa devedora precisa ter um incentivo para não alongar o processo de forma proposital e que gera graves prejuízos àqueles que não tem emprego e renda, em especial em tempos de pandemia.

A decisão é passível ainda de recursos, mas o fato é que, uma vez aplicada apenas a Selic, sem os juros de mora, o crédito trabalhista será muito menor do que ele vale hoje, vez que a inflação irá se encarregar seu poder de compra ao longo dos anos. Bem da verdade, o STF até incentiva o devedor a promover este tipo de situação.

A justiça, que deveria ser social, garantindo o acesso aos direitos previstos em lei, corrigindo qualquer desigualdade, ilegalidade ou desrespeito, foi duramente atacada. Os recursos a esta decisão, com fé em Deus, devem ser acolhidos e esta injustiça corrigida.

(*) – É sócio da Pro Solutti Capital, gestora de ativos judiciais.